A organização da 19ª edição do Caldas Late Night, que se realizou a 29 e 30 de Maio, faz um balanço muito positivo da iniciativa e vai deixar para o futuro uma “pasta” com todas as dicas necessárias a quem quiser organizá-lo. Afinal, vão ser os 20 anos do CLN, mas em 2015, a fasquia foi ainda mais elevada, com mais de 130 participações, com eventos ligados a várias áreas, do teatro e dança às artes plásticas.
Durante dois dias Caldas da Rainha transformou-se num centro criativo muito vivo, com iniciativas a decorrerem em espaços abertos da cidade e com vários edifícios (e algumas residências) a receberem instalações artísticas.
O CLN mexe com a cidade e é nestes dias que mais gente (mesmo caldenses) sai à rua durante a noite, para além de que, durante o dia, também são várias as iniciativas que proporcionam um ambiente cultural único.
Os milhares de pessoas que participam, muitos vindos de outras localidades do país, percorrem as ruas das Caldas entre espaços, como os Silos da Ceres, a praça 5 de Outubro, o Parque D. Carlos I, a praça da República e a praça de Touros.
A provocação da organização – que divulgou um manifesto em que falava da hipotética morte do Caldas Late Night – acabou por funcionar da melhor forma, despertando o interesse dos actuais alunos da ESAD para participarem.
Mesmo que alguns tenham reagido mal, porque só depois foi explicado que a ideia era de que o Caldas morria no final de cada edição e renascia no ano seguinte (“O Caldas morreu, Viva o Caldas”), a verdade é que este ano, segundo a organização, até houve mais participações de estudantes do 1º ano, o que não era habitual.
Ricardo Paulino e João Fialho, da organização, consideram que será imprescindível que os novos alunos sejam motivados a participar com projectos, ao contrário do que acontecia até agora.
Ambos gostaram muito de estar a organizar este evento e Ricardo Paulino, a frequentar o primeiro ano de Mestrado de Design de Produto, está interessado em voltar a fazer parte da organização, até para poder transmitir alguns dos conhecimentos que adquiriu. “Assim podem-se evitar alguns erros que cometemos”, referiu. De qualquer forma, estão já a preparar vários documentos sobre a experiência que tiveram, que irão depois entregar aos que vierem em 2016.
Para quem organiza é sempre mais ingrato, porque estão tão empenhados em conseguir que tudo corra bem, que acabam por não poder participar ou visitar as várias instalações artísticas.
Ainda a assimilar tudo o que aconteceu, os dois alunos destacaram, não só a participação dos estudantes da ESAD (a grande maioria das intervenções), mas também a de várias entidades caldenses e da região, jovens da escola secundária Raul Proença e até de estabelecimentos comerciais.
Manuel João Vieira na praça dos bares
Antes do arranque oficial na sexta-feira, houve espectáculo na noite de 28 de Maio, na praça 5 de Outubro, depois de um cortejo “fúnebre” com a banda Comércio e Indústria, que partiu do largo da Rainha, com Manuel João Vieira (dos Ena Pá 2000). Durante quase duas horas, e perante uma plateia entusiasmada que encheu parte do tabuleiro da praça, o músico cantou alguns dos seus êxitos, com muita crítica social pelo meio.
Na sexta-feira as várias instalações começaram principalmente a meio da tarde, com a tradicional “Pillow Fight” (guerra de almofadas) a juntar cerca de 200 pessoas na praça da República. Os eventos foram-se depois sucedendo até ao arraial na praça de Touros.
No dia seguinte, sábado, houve muitos que se ressentiram de uma noite longa, mas a meio da tarde já se viam muitos interessados em visitar instalações. Na praça da Fruta, por exemplo, estiveram Salomé Marques e Mariana Justino, do curso de Teatro, a fazer uma performance em que quiseram levar para a cidade a forma de estar na praia.
“Nós tivemos uma aula na praia e nessa altura, como estávamos todos vestidos enquanto as outras pessoas estavam de fato de banho, sentimo-nos desconfortáveis”, contaram. A instalação acabou por se fazer exactamente ao contrário: estarem em fatos de banho no meio da praça da Fruta, perante os olhares curiosos de quem passava.
No Céu de Vidro havia uma exposição da Associação Nazarena de Artes Plásticas, intitulada “fruta madura apanha-se do chão”, na qual estiveram patentes trabalhos de artistas nazarenos. Segundo Steve Delgado, presidente da Anazart, o objectivo da presença no CLN foi a de divulgar a associação e conseguir angariar mais sócios. O dirigente, que é um artista autodidacta, também apresentou alguns trabalhos, um deles uma peça feita a partir de parte de um destroço de um carro de um suicídio, que caiu do Sítio da Nazaré. Esse destroço deu posteriormente à costa empurrado pelas ondas.
Silos repetem exposição este sábado
Amanhã, 6 de Junho, das 21h00 à meia-noite, vai voltar a estar patente a primeira edição do projecto Zero Zeugma nos Silos, que já tinham aberto ao público durante o Caldas Late Night.
A exposição, vivamente recomendada, ocupa cinco pisos com a participação de 18 criativos, e partiu “de novas pesquisas artísticas que nos estimulam enquanto jovens criativos na procura de novos valores que questionam diferentes áreas criativas como o design, as artes plásticas e as artes performativas”, explicam os organizadores.
Este é um projecto multidisciplinar que tem como objectivo apelar às instituições sobre a falta de apoio aos jovens criativos portugueses para uma investigação artística.
“Somos jovens, mas precisamos de ganhar tempo e espaço. Tempo para materializar, dar vida, fazer acontecer. Espaço livre e criativo onde existe um núcleo de artistas que trabalha em conjunto para tornar o trabalho real”, adiantam ainda.
A Gazeta das Caldas falou com um dos colectivos participantes, os Yuuts Ruoy, composto por três ex-alunos do curso de Teatro (Ri, Pedro Castella e Inês Carincur), que apresentaram o projecto Opera. “Começámos nas Caldas com um grupo de nove elementos porque queríamos fugir dos estereótipos do curso”, referiu Inês Carincur.
Inaugurado Grémio Caldense de Cultura e Recreio
No sábado, dia 29, foi a inauguração, num espaço da antiga Ceres, do Grémio Caldense de Cultura e Recreio, um projecto da associação DAR.
O novo espaço nasce de uma proposta de José Torres à associação, que quis criar um local de convívio e ao mesmo tempo de trabalho. No Grémio vai ser possível estar num momento de descontracção ou então a trabalhar, uma vez que o espaço de “coworking” da DAR passa a funcionar ali.
“Será aquilo que o café do CCC das Caldas não nos oferece”, referiu André Rocha, presidente da DAR. “Podemos vir aqui para trabalhar ou apenas para ir à Internet ou estar à conversa, enquanto bebemos uma imperial ou um café”, concluiu José Torres.
Está prevista ainda a realização de eventos, tal como aconteceu durante o Caldas Late Night.
O regresso de “Tony Chaleira e as Suas Pombinhas”
O arraial na praça de Touros contou com o regresso de “Tony Chaleira e as Suas Pombinhas”, um conjunto mítico na ESAD, criado em 2001 e que há 13 anos não actuava.
O Tony Chaleira é uma personagem de Jorge Muchagato, que se torna num cantor romântico e popular, cujo alter-ego é o Elvis Presley. “É também uma parte do que eu sou, aquela parte que não é marcada por uma melancolia sem razão, mas bem disposta, e que gosta muito de cantar e actuar”, contou à Gazeta das Caldas.
Segundo o artista, tudo começou com uma brincadeira no Carnaval de 2001, quando se juntou a Cilene Conceição e Vanda Madureira para se mascararam de Serafim Saudade (um personagem de Herman José) e suas bailarinas. Em Outubro desse ano foram convidados a participar, enquanto grupo musical, na festa de recepção dos novos alunos da ESAD, que se realizou na praça de Touros.
Jorge Muchagato, que foi professor de História de Arte na ESAD, decidiu criar uma personagem. “O nome apareceu numa ‘brainstorming’ que fizemos no quartel-general das nossas reuniões, o bar Charrua”, contou o músico.
Foi o próprio que pegou em êxitos da música nacional e internacional, adaptando-as, com letras que escreveu. “Amor e Rotundas”, “Sempre que brilha o sol na praça da Fruta”, “Couve Queimada” e “Agarrados pelo pescoço” foram alguns dos temas que fizeram sucesso. “As letras tinham a ver com o ambiente que se vivia nas Caldas, na ESAD e no país nessa altura”, contou.
Depois desse primeiro concerto fizeram várias actuações e chegaram a fazer a primeira parte do concerto de 15 de Maio, em 2002. “Nessa altura achei que deveria arranjar um guarda-roupa em condições”, contou Jorge Muchagato. Conheceu então Maria José Jacinto, designer de moda que tinha a marca Espiral. A estilista acabaria por ser a mãe do filho do cantor, que tem nove anos, e que no concerto de 29 de Maio também subiu ao palco vestido a rigor, tal como o pai.
A formação original da banda que acompanhou sempre Tony Chaleira, para além de Jorge Muchagato, são Zorba Pinheiro (Pedro Pinheiro), Luís Brito, Ricardo Ferreira, Nuno Favinha Rodrigues e Gonçalo Tavares (que tinham a sua banda própria, os “Zebu3Pide”). O vocalista faz questão de agradecer a estes músicos a sua paciência, empenho e qualidade.
Actualmente Jorge Muchagato está a fazer um doutoramento em História de Arte, como bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia, mas voltou às Caldas. “Gostava de voltar a leccionar na ESAD pois o que vivi na escola marcou-me em termos pessoais e artísticos e aprendi muito com os alunos de artes que tive”, referiu. Em termos musicais prefere cantar fado, o que já faz desde os 17 anos.