Conversas com escritores encheram os espaços, numa edição do Festival de Literatura e Viagens que fica também marcada pela programação no Convento de S. Miguel, numa aposta na descentralização. Regressa para o ano com a curadoria de José Luís Peixoto.
A conversa com o escritor Gonçalo M. Tavares, moderada por José Mário Silva, lotou a biblioteca de A-dos-Negros, na tarde de domingo, o último dia do Festival Latitudes. Mas já antes, também os auditórios da Junta de Freguesia do Olho Marinho, e da Casa dos Seixos, na Amoreira, tinham enchido para as conversas com Joana Bértholo e Bruno Vieira do Amaral. Esta descentralização das atividades com autores nas freguesias foram uma novidade desta edição do Latitudes e uma “aposta ganha”, reconhece o seu curador, José Luís Peixoto. O também escritor considera que, pelas “características especiais” do concelho, que é bastante disperso e concentra muitas pessoas nas suas freguesias, “faz todo o sentido” dinamizar atividades culturais e mostrar a quem vem de fora outros espaços, numa “viagem” por este território, que acredita que terá continuidade nas próximas edições.
Ainda na tarde de domingo, e já dentro da vila, no Museu Abílio, para onde foi convidada para uma conversa sobre “Os Outros e Eu”, Anabela Mota Ribeiro partilhou a alegria de estar em Óbidos e a “sensação de voltar a casa”. A jornalista e escritora foi uma das curadoras do FOLIO em 2016 e lembrou o festival que “revolucionava a vila durante duas semanas”. Também falou sobre o seu romance “O Quarto do Bebé” e da importância de Machado de Assis na sua obra.
No dia antes, Dulce Maria Cardoso falou sobre os seus livros e de como estes também refletem a sua experiência pessoal e coletiva. “A literatura é transformar o ordinário em algo extraordinário”, disse a autora numa conversa com o crítico literário José Mário Silva, onde não deixou de falar da política nacional e internacional e como acredita que, “todos juntos somos imensos e temos muito poder”. A presença de autores de relevo a nível nacional, que “se somam à qualidade de outros que já passaram por cá” foi outro dos objetivos deste Latitudes. José Luís Peixoto acrescenta que não é difícil convidar autores para irem a Óbidos porque este é um “lugar que atrai e porque sabem que vão encontrar público, boas condições nos espaços e bom ambiente”. Garante mesmo que nos dois anos em que já fez a curadoria do evento nenhum autor recusou o convite para estar presente.
Num festival que une a literatura à viagem, José Luís Peixoto fala das múltiplas dimensões da viagem, exemplificando com a conversa com David Machado, sob o tema “Os Caminhos das Redes”, onde o escritor falou sobre as viagens nas redes sociais, na Internet, “também espaços que habitamos e sobre os quais é importante que pensemos”. Depois há também as viagens no tempo e nos espaços que são mais habituais e nem olhamos, acrescentou, fazendo notar que todas elas cabem neste festival, de “quatro dias mas bem condensados”.
Isabel Werneck, secretária executiva do projeto Rio de Janeiro, Capital Mundial do Livro 2025, veio do Brasil para falar em Óbidos, “pela primeira vez” em Portugal, desta candidatura ao galardão da UNESCO.
Autores nas escolas
Esta edição, que decorreu entre 13 e 16 de fevereiro, teve também a particularidade de contar com a presença dos escritores nas quatro escolas do concelho, onde dinamizaram atividades com os alunos, desde o primeiro ciclo ao ensino secundário. Os escritores David Machado, José Luís Peixoto e Judite Canha Fernandes foram aos diversos estabelecimentos de ensino, onde também foram dinamizadas oficinas e workshops. Atividades que também deverão ter continuidade nas edições seguintes, acredita José Luís Peixoto, destacando que é nestas idades que é “muito importante desmistificar a literatura, torná-la acessível e criar ligações”.
A vereadora Margarida Reis destacou a aposta que houve na programação no Convento de São Miguel, nas Gaeiras, onde para além da exposição sobre a vida e obra de Ruy de Carvalho, também contou com vários workshops, peças de teatros, juntando atividades intergeracionais. “Foi muito bom dar uma identidade aquele espaço que temos há pouco tempo e vamos agora potenciar”, explicou à Gazeta das Caldas.
Também o “Candlelight”, o concerto intimista iluminado com a luz de milhares de velas que decorreu na Igreja de Misericórdia, mereceu o realce da autarca, pelo afluência que motivou, assim como a apresentação, em Óbidos, do Clube Literário Visit Portugal, um projeto do Turismo de Portugal que pretende colocar o país no mapa dos destinos literários. Foi ainda apresentada a “Rota Literatura em Viagem”, desenvolvida no contexto da entrada de Óbidos para a Rede das Cidades Criativas da UNESCO.
Margarida Reis destacou ainda o trabalho de José Luís Peixoto enquanto curador do festival, que pretende que tenha continuidade. “Marcou a diferença em termos de autores, é uma pessoa que se preocupa em levar Óbidos e o Latitudes para fora de portas”, destacou.
Primeira residência criativa do festival
O Festival Latitudes encerrou com o concerto “Do Outro Lado do Espelho”, no final da tarde de domingo. O espetáculo, que juntou em palco a Banda Papercutz e a União Filarmónica de A-da-Gorda, proporcionando uma viagem entre a música clássica e a música eletrónica, resultou de uma residência criativa, a primeira que se realizou em Óbidos para um festival.
De acordo com a vereadora Margarida Reis, esta residência foi original em três aspetos: “o facto de ser uma residência criativa, a parceria com uma banda filarmónica local e o terem trabalhado uma letra de José Luís Peixoto, o curador do festival”. Depois desta primeira experiência bem sucedida, a autarca avança que estão a preparar um desafio semelhante para a 10ª edição do FOLIO, a decorrer em outubro. ■


