O CALDAS SAIU DA TAÇA DE PORTUGAL PELA PORTA GRANDE
O Caldas venceu nos 90 minutos o Aves e fez acreditar milhares de adeptos dentro e fora do estádio que o sonho do Jamor podia ser uma realidade. Sonho que só morreu no prolongamento. No final da partida houve desilusão nos jogadores, mas um grande orgulho nos caldenses pelo que a equipa conseguiu. “Campeões” foi a palavra que mais se ouviu.
Caldas da Rainha, 18 de Abril de 2018. A cidade acordou vestida de preto e branco. Nas escolas, a “farda” de muitas crianças e jovens é uma camisola, um cachecol ou outro adereço alusivo ao Caldas SC. Nas ruas, é fácil cruzar-se com alguém com a mesma indumentária.
No comércio há cachecóis a decorar as montras e até os pescoços de quem está a atender. Até nos carros há referência ao clube da terra. Um fenómeno que só tem comparação aos dia de jogo da selecção nacional no Euro 2004. Mas se nessa altura foi o discurso do treinador Luiz Felipe Scolari que gerou tal movimento, neste dia, nas Caldas da Rainha, tudo se gerou de forma espontânea.
Há dezenas de pessoas à procura de um bilhete “perdido” que ainda permita ir ver o jogo ao vivo, quando os ingressos estão há muito esgotados. Na rua, nos empregos, nos cafés, as conversas giram à volta do jogo que cujo pontapé de saída só é dado ao final da tarde, mas que, na verdade, já começou há muito tempo.
Não se trata de um jogo de profissionais contra amadores. De uma equipa com um dos orçamentos mais baixos do terceiro escalão contra outra com um dos orçamentos mais elevados da I Liga. Trata-se de 27 homens com uma vontade infindável de fazer o que nunca antes alguém fez, cuja vontade contagiou toda uma cidade, toda uma região, o que faz com que o que está do outro lado do campo seja o menos importante.
A Mata vestiu-se de gala para acolher a disputa. Bancadas pintadas e arranjadas, apesar da chuva das semanas anteriores ter feito todos os possíveis para dificultar a tarefa, testando a outros níveis a resiliência dos caldenses. O palco principal, onde os 14 escolhidos iriam lutar pelos sonhos dos seis mil caldenses sentados (ou em pé) à sua volta, era um tapete verde imaculado, digno da disputa que se iria seguir.
O ambiente começou a criar-se muito cedo. Muitos adeptos escolheram a Mata para passar quase todo o dia, num são convívio entre adeptos das duas equipas regado a cerveja a acompanhar o porco no espeto. O primeiro grande momento aconteceu por volta das 17h00, com a chegada da equipa ao estádio.
Ninguém quis perder pitada. As portas abriram e as bancadas encheram rapidamente. Gargantas afinadas no apoio aos jogadores. O sol era o menor responsável pelo calor que lhes aquecia a alma.
A alegria do golo marcado aos 55 minutos e que permitiu a igualdade na eliminatória no final do tempo regulamentar a contrastar com a tristeza que tomou conta da equipa no final da partida, com o afastamento da tão ansiada final da Taça | Joel Ribeiro
À hora marcada a bola começou a rolar. E foram 90 minutos, 120 minutos, de uma dedicação inexcedível, dentro e fora daquele rectângulo verde, para que o tal sonho se concretizasse.
Aos cerca de seis mil caldenses, juntavam-se outros 850 de vermelho e branco com esperança e empenho idêntico, o que só contribuiu para enobrecer a festa.
E foi um jogo de paciência. José Vala e José Mota não esconderam a estratégia, nenhum deles iria atirar os seus jogadores deliberadamente para o ataque. Mas se faltava alguma beleza estética ao jogo, sobrava vontade e entrega. O Caldas conseguia ter bola, talvez mais do que o Aves pretenderia, mas tinha dificuldade em chegar perto da baliza de Quim, ao passo que os avenses tiveram na cabeça de Guedes e num livre de Nildo, travado por Luís Paulo, os melhores lances do primeiro tempo.
Só que uma vez poderia chegar para o Caldas. E chegou ao minuto 55. Livre cobrado por Clemente à esquerda, as cabeças de Vítor Gomes e Jorge Fellipe combinaram involuntariamente para meter a bola dentro da baliza.
Foi a explosão de alegria. Aquele fantasia remota que há dois meses se tinha tornado num sonho possível, era agora tão palpável como a euforia que tomou conta dos caldenses – por naturalidade ou afinidade – que estavam no estádio e por esse mundo fora.
José Vala e José Mota pediam calma aos seus jogadores. A estratégia do Caldas estava a resultar e não havia motivo para carregar à procura do segundo. E o Aves também não se podia expor a esse risco. Mas a equipa da I Liga foi crescendo e valeu ao Caldas, por duas vezes, a segurança das mãos de Luís Paulo a forçar o prolongamento.
Agora recomeçava tudo do zero, tudo podia acontecer. Mas as forças começaram a faltar aos caldenses. O Aves intensificou o seu ataque e foi bafejado pela sorte que antes tinha assistido ao Caldas. Num canto, Jorge Fellipe cabeceou contra as costas de Marcelo, a bola sobrou para Vítor Gomes que teve uma baliza grande demais para falhar o golo. E se o Caldas ainda tinha esperanças de chegar aos penáltis – se conseguisse o empate – o génio de Vítor Gomes acabou com elas quando bisou, aproveitando uma bola que sobrou da defensiva caldense.
Foi um enorme balde de água fria que fez os alvinegros despertarem daquele sonho lindo.
O jogo acabou e jogadores, técnicos e dirigentes não conseguiram conter as lágrimas. Mas os caldenses nas bancadas depressa os fizeram perceber que não foi um sonho. Foi uma realidade. Uma história escrita com talento, com crença, com trabalho, com muita magia e encanto. Uma história inspiradora, que vai ficar escrita como que uma lenda real nos anais do clube e do futebol português.
Ninguém arredou pé, todos quiseram cumprimentar e confortar os seus heróis, e no fim gritaram em uníssono “Campeões”, porque seja quem for que vença a final do Jamor, a 20 de Maio, o vencedor desta edição da Taça de Portugal é o Caldas Sport Clube.
MELHOR DO CALDAS
João Tarzan 4
Os caldenses contavam com o génio do camisola 32 para resolver o jogo com golos, mas foi noutras funções que se destacou. Acabou muitas vezes por ser o meio da bola chegar à frente e não o destino desta. E nunca se negou a dar uma ajuda defensiva, o que lhe valeu vários roubos de bola na zona intermédia.
Rui Almeida e José Vala descerraram placa onde consta os nomes de todos os elementos do grupo semifinalista da Taça de Portugal | Joel Ribeiro
“A frustração passa rápido, o orgulho vai ficar”
José Vala assumiu alguma frustração do grupo caldense no final da partida, mas preferiu sublinhar o orgulho que fica da caminhada do Caldas na prova. “Sinto orgulho enorme pelos jogadores que estão a chorar no balneário, são grandes e por isso ambicionavam mais. Provámos que podíamos estar no Jamor, o que parecia impossível era uma grande possibilidade. A frustração passa rápido, o orgulho vai ficar”.
O técnico realça que o aquilo que o grupo de trabalho conquistou vai ser um marco para todos, para o clube e para a cidade, e espera que seja um contributo para fazer o Caldas crescer. “Que chegue a um nível do Aves, mostrámos que temos adeptos para isto, cidade para isto, gostava sinceramente que daqui a uns anos se olhasse para isto como um ponto de partida”.
Quanto ao jogo, o treinador alvinegro salientou o bom comportamento na primeira parte, em que os caldenses conseguiram dividir ou mesmo superiorizar-se em termos de posse de bola. Depois, afirmou que tinha preferido marcar perto dos 90. “Baixámos o bloco com o golo e depois começámos a pensar nas grandes penalidades. Houve alguma falha de concentração no primeiro golo, o que fez com que o domínio do Aves fosse maior, e depois a quebra física tornou-se mais evidente”.
No entanto, realça que a equipa se bateu “muito bem com o Aves, conseguimos ganhar nos 90 minutos a uma equipa que tem um dos maiores orçamentos da I Liga”.
ELOGIOS DE JOSÉ MOTA
José Mota disse que estar no Jamor era para ele o concretizar de um sonho de menino e salientou que o seu clube também fez história. “É a primeira vez que um clube de uma freguesia, de uma vila, está na final do Jamor, é um feito histórico e digno de realce”.
O técnico avense deu mérito à sua equipa na vitória, e à massa adepta que se deslocou às Caldas, mas teceu grandes elogios ao Caldas. “Mais uma vez mostrou todo o seu valor, merece o realce desta Taça de Portugal, tem aqui bons jogadores que no futuro próximo terão a sua oportunidade para se imporem no futebol”.
E elogiou também os caldenses. “É realmente uma alma ver um estádio cheio, é uma saúde, uma alegria, um sentimento que nos ocorre que é difícil de explicar. Muito poucos clubes têm esta envolvência”.
José Mota acrescentou que ficou feliz por ter participado nesta “meia-final fantástica”, pelo encanto que lhe deram as gentes das Caldas e da Vila das Aves.
A coreografia preparada para o jogo pela claque Sector 1916 | Joel Ribeiro
MÉRITO DESPORTIVO MUNICIPAL PARA O GRUPO DE TRABALHO
As repercussões da prestação dos caldenses na Taça de Portugal foram enormes. Ainda antes da partida decisiva, o município das Caldas da Rainha decidiu atribuir a medalha de mérito desportivo a todos os jogadores do plantel e equipa técnica.
Logo após o final da partida as redes sociais foram inundadas de posts a elogiar a prestação dos caldenses. O clube teve ainda direito a participação especial no programa 5 para a Meia-noite, da RTP1, no dia seguinte ao jogo, fazendo-se representar por atletas, técnicos, dirigentes, colaboradores e elementos da claque Sector 1916.
O próprio Caldas SC homenageou os seus atletas no final do Caldas-Guadalupe, que encerrou a época. Os atletas e treinadores receberam medalhas e algumas ofertas de patrocinadores. O nome dos heróis foi ainda eternizado com uma placa descerrada na bancada central do Campo da Mata alusiva à presença na meia-final da Taça, da qual constam todos os nomes do grupo de trabalho. Foi ainda descerrada uma outra placa alusiva às obras de beneficiação do recinto.
Quem não pôde ir ao Campo da Mata teve oportunidade de ver o jogo num ecrã gigante na Expoeste | Joel Ribeiro
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