“Há sempre pressão sobre quem lidera as equipas do Benfica”

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Alex Pinto ao centro ladeado pelos caldenses Pedro Pinto (treinador de guarda-redes) e pelo adjunto Wilson Ferreira
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Alex Pinto treina pela terceira época a equipa feminina de futsal do Benfica e já soma oito títulos

Alex Pinto, 41 anos, está pela terceira temporada no comando técnico da equipa feminina de futsal do Benfica. Pelas águias já conquistou dois títulos de campeão nacional, duas Taças de Portugal, duas Supertaças, uma Taça da Liga e um título de campeão Europeu. Manter a hegemonia do futsal nacional no feminino é o objetivo do técnico, que vê com agrado a modalidade a crescer.

Quando recebeu o convite para treinar a equipa feminina do Benfica, há mais ou menos dois anos, qual foi a reação?
Recordo-me perfeitamente. Estava a dar aulas e, como é natural, quando o telefone tocou, não atendi. Não conhecia o número, mas retribui a chamada, apresentaram-se e questionaram se estaria disponível para ouvir uma proposta para treinar em equipa feminina. Tenho dito isto ao longo dos últimos anos, eu não treino nem feminino, nem masculino, nem formação, nem seniores, nem elite, nem alto rendimento, ou outro cenário. Treino futsal. E, portanto, a resposta foi prontamente sim, estou disponível para ouvir, tanto mais, tratando-se do Benfica. Foi um bocadinho por aí que, desde cedo, tentei também desmistificar esta diferença que teimamos em colocar em todos os desportos, não há futsal feminino e futsal masculino, como qualquer outro desporto, há futsal. As equipas é que são masculinas ou femininas. Como é fácil entender, a proposta agradou, o contexto é muito aliciante e, por isso, ainda cá estou.

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E surpreendeu o convite?
Sim, surpreendeu, porque não estava nos meus horizontes treinar feminino. Não por ser menos prestigiante ou desafiador, simplesmente porque nunca tinha tido experiência nesse âmbito, logo, não estava à espera. No entanto, ao longo dos últimos anos, quer no futsal, quer noutras modalidades, têm-se quebrado estas barreiras e os clubes têm puxado gente que tem competência para as equipas femininas.

Como foi fazer essa transição?
Há muitas diferenças. Toda a gente me pergunta se é igual treinar masculino e feminino. Não é. Assim como não é igual treinar a Casa do Benfica ou o Benfica. Todos os contextos têm características muito próprias. Tenho a sorte, ou a felicidade, de ter um grupo extremamente profissional e muito ambicioso. Existem algumas características, até fisiológicas e morfológicas, que impedem algumas ações motoras que sejam idênticas às dos homens, mas, tirando isso, é um contexto que me permite treinar tal como faria se tivesse um grupo de homens. Em termos daquilo que é o balneário, o grupo tem as suas características, mas não podemos generalizar, porque este é um grupo que está há sete anos consecutivos a vencer e, de certeza absoluta, treinar outro grupo de mulheres que não têm este contexto também será completamente diferente.

Esta era uma equipa que já estava habituada a ganhar. Isso coloca ainda mais pressão?
Sim, quando cheguei esta equipa era pentacampeã, depois tornou-se hexa e heptacampeã. Há sempre uma pressão grande sobre quem lidera as equipas do Benfica, porque todas jogam para ser campeãs nacionais. Se calhar, daqui a uma década olharemos para esta equipa como uma que fez história no futsal nacional. A hegemonia tem sido tão grande ao longo dos últimos anos que há, realmente, uma pressão, que acho que é saudável e que qualquer treinador gosta de sentir.

Entretanto, são duas épocas completas. Todos os títulos que era possível ganhar, foram ganhos, inclusive a competição europeia, como tem sido fazer este percurso?
Tem sido uma grande aprendizagem, porque vinha de cenários onde não lutava para ser campeão, e agora estou num cenário completamente diferente. É aí que tenho que agradecer ao grupo de trabalho, às jogadoras e a toda gente que gravita à volta da equipa, porque o meu contexto mudou completamente com esta mudança para o Benfica. É muito bom viver estas vitórias, assim como se torna muito pesado todo e qualquer deslize. Nós, no ano passado, falhámos uma competição, a Taça da Liga, e para nós foi como uma catástrofe dentro do balneário. Durante longas semanas sentimos que nos faltava algo. A época teve esse percalço, mas de resto foi quase imaculada, foi fantástica. Mas é um facto que vivemos de forma muito forte qualquer desaire, e não podemos deixar de viver de forma feliz toda e qualquer vitória, independentemente da prova, porque não se pode tornar natural ganharmos. Temos de continuar a festejar, porque o desporto é assim mesmo.

Ganhar o campeonato europeu de clubes, teve um sabor especial?
Teve. Quando entrei no Benfica, em novembro de 2022, entrei 15 dias antes do torneio europeu, e fomos à final. Vencemos a equipa espanhola no grupo e, depois, defrontando a equipa da casa na final, acabou por ficar uma pedra no sapato, porque sentimos logo naquele primeiro momento que o título podia ter sido nosso. Houve uma série de contingências durante o jogo, coisas que nos condicionaram muito, e o título fugiu-nos entre as mãos, acabámos por perder essa final por 3-2. Um ano mais tarde, o objetivo estava bem definido. Queríamos continuar a nossa hegemonia a nível nacional, mas aquele título tinha que ser conquistado. E fizemo-lo em Espanha, na casa do Burela, que é talvez uma das melhores equipas da Europa, e foi muito engraçado esse título, porque antes da minha chegada já o grupo ambicionava muito ganhá-lo. Era algo inédito, era aquilo que faltava fazer, e foi também aquilo que me foi pedido quando cheguei. Foi uma grande alegria, e também não vou esconder que foi algum alívio, porque o grupo trabalhou muito para o conseguir.

Entretanto, esta época já começou com um título. Levam cinco vitórias em cinco jogos. O objetivo é fazer o pleno?
Sim, esse é sempre o objetivo, é conseguir conquistar todas as competições onde estamos inseridos. Temos noção de uma coisa: ganhar é muito difícil, continuar a fazê-lo de forma consecutiva é ainda mais difícil. E, portanto, para que isso aconteça, é necessário que toda a gente assuma que não é importante o título que se disputa em dezembro ou em junho, o importante é o trabalho diário para que exista essa consistência. Não basta estar bem em determinado momento, temos que ser muito regulares. Iniciámos bem a época, da melhor forma, conquistando a Supertaça, estamos neste momento bem na liga, estamos no lugar que queremos, e, portanto, há que dar continuidade, com esse objetivo bem claro. No ano passado falhámos uma competição, este ano gostaríamos de não falhar nenhuma.

Este seu percurso, principalmente desde a Burinhosa, tem um nome em comum, o Wilson Ferreira. É uma pessoa importante também neste projeto desportivo?
O Wilson não é importante, é fundamental. Nós, além de vizinhos que éramos em Tornada, quando eu era treinador na Casa do Benfica ele foi o meu jogador. Depois recrutei-o, digamos assim, para a equipa técnica e tem-me acompanhado. Tem evoluído comigo e tem-me feito evoluir ao longo destes anos. Neste momento, e porque para além de treinar futsal, também tenho o meu trabalho na escola, não me vejo em qualquer clube sem ter o Wilson ao meu lado. Acabamos por nos complementar quase de olhos fechados. As análises que fazemos aos treinos, aos jogos, aos adversários, já não precisamos de qualquer tipo de reunião prévia, já falamos, no final, exatamente das mesmas coisas sem sequer termos visto o vídeo juntos. Portanto, tudo isto faz com que seja muito mais fácil uma comunicação, por vezes até sem palavras, no jogo. Isso ajuda muito e contribui para o sucesso da equipa.

Este ano foi treinador do ano para a Associação de Treinadores de Lisboa, recebeu a medalha de mérito do Município das Caldas da Rainha e agora foi homenageado também na Gala do Desporto das Caldas. O que significam estas distinções?
Bom, as distinções nacionais que tenho recebido, quer da Federação, quer da ANTF, são sempre motivo de orgulho. É sinal que o trabalho é reconhecido e sentimo-nos engrandecidos. No entanto, para mim é um erro chamar o prémio de melhor treinador. O treinador é apenas uma pessoa e este trabalho é feito, no Benfica, por quase 10 pessoas, pelo que não será o melhor treinador, será a melhor equipa técnica e o melhor grupo de trabalho. Sou mesmo um felizardo por ter o grupo que tenho e por me proporcionar isso. Quanto aos prémios das Caldas, é muito bom ser reconhecido a nível nacional, mas ser reconhecido a nível local tem um sabor mais especial, porque é com os nossos conterrâneos. Eu não nasci nas Caldas, mas vim cedo para cá e considero-me mais caldense que de outra parte qualquer, pelo que é algo muito significativo para mim.

Como é que se vê a longo prazo, é um objetivo voltar a uma primeira liga no masculino?
Não. Se há dois anos e pouco atrás não esperaria ingressar no feminino, neste momento não faço planos para voltar ao masculino. Estou feliz no Benfica, gosto muito de fazer o que faço. Vou todos os dias para Lisboa a sentir-me desafiado, porque as jogadoras me provocam. E sinto-me muito motivado perante os objetivos da equipa. Não faço grandes planos para, daqui a um ano ou para daqui a dez, porque a curta carreira que tenho já me ensinou que não há que fazer planos, há que aguardar as oportunidades porque se o trabalho for bem feito elas irão surgir. Por isso os objetivos são o Benfica a presente temporada. ■

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