Defendi, em artigo anterior, a existência de um Estado mais legítimo e sustentável, assim como de melhor serviço público, não necessariamente estatal. Reclamei, também, que os cidadãos se tornem, por direito e obrigação, mais livres, confiantes, solidários, cultos, dinâmicos e conscientes, ou seja, que haja mais e melhor sociedade. Fi-lo, não por estritos preconceitos ideológicos, mas porque entendo que esse é o caminho para construirmos uma sociedade mais justa e feliz. O que há, então, a fazer? Em que domínios actuar? Quem deve fazê-lo? Desde logo, é necessário agir no plano do conhecimento, definindo a agenda pública que interessa, abrindo o debate a todas as categorias sociais, transmitindo perspectivas inovadoras, partilhando informação objectiva e dando exemplo pessoal e institucional daquilo que se propõe para a sociedade. Isto tem sido feito? Não, não tem: distrai-se com o secundário e fantasioso, esconde-se e inventa-se informação, limita-se e enviesa-se o debate e age-se em contradição com o que publicamente se defende.
Depois, é preciso agir no plano da vontade, consciencializando e motivando a sociedade, valorizando o risco e o mérito, apelando à participação e envolvimento cívicos, à iniciativa e ao sentido de responsabilidade, nos termos que celebrizaram John Kennedy quando exortou os americanos a perguntarem o que podiam fazer pelo seu país, e não ficarem à espera de que o país fizesse tudo por eles. Ao mesmo tempo, devem ser tomadas medidas que incentivem e premeiem estas práticas e, em casos justificados, as tornem obrigatórias, condicionando o usufruto dos direitos ao cumprimento dos deveres e os gastos à prévia criação de riqueza, o que definitivamente não se tem verificado no Portugal contemporâneo, dominado na última década e meia por uma oligarquia laxista e despesista, mais estatizante e oportunista do que verdadeiramente socialista, interessada em criar, ocupar e controlar um Estado gordo e dominador. “Felizmente” faltou o dinheiro para levar mais longe tal desígnio, obrigando à intervenção estrangeira para pôr o país na ordem e salvá-lo da bancarrota.
Finalmente, importa agir no plano da possibilidade, abrindo espaços de autonomia e realização, promovendo e facilitando o empreendedorismo e a inovação, substituindo o “porquê?” pelo “porque não?”, combatendo o criticismo, o perfeccionismo, a inveja e o burocratismo. Em simultâneo, deve ser desenvolvido um programa ambicioso de formação em liderança, com uma componente muito forte de mudança cultural, orientada para as cinco dimensões identificadas pelo conhecido psicólogo holandês Geert Hofstede, especialista em culturas nacionais: redução da distância hierárquica, maior autonomia e responsabilidade individual, maior focalização e assertividade, maior aceitação do risco e da incerteza, e adopção de perspectivas de longo prazo. E a quem compete fomentar todas estas iniciativas? Certamente aos membros mais esclarecidos e influentes da sociedade, tanto ao nível da família e da comunidade, como dos que desempenham altas funções no Estado e, por isso, dispõem de poderosos mecanismos facilitadores e incentivadores da mudança desejada. Sem menosprezar as naturais dinâmicas sociais que ocorrem independentemente da vontade e da consciência dos homens.