Tínhamos mencionado numa crónica anterior, que nesta altura do ano, e numa tentativa de fazermos face aos imprevistos do duro Inverno canadiano, todos seguíamos atentamente as informações dos serviços oficiais de meteorologia. Assim, ontem, Sábado dia 5 de Fevereiro, e antes de mais uma manhã normal de trabalho tendo em vista servir algum cliente que por qualquer motivo não se pudera deslocar ao escritório durante os dias normais da semana, tratámos de passar pela garagem para lavar o carro, pois as previsões, eram de temperaturas amenas e menos de um centímetro de neve nas próximas horas.
À noite estava prevista uma pequena reunião familiar, para festejar mais um aniversário do nosso filho mais jovem, na residência do irmão mais velho, que dista apenas cerca de dez minutos da nossa casa. É que o jovem casal, depois de muito procurar acabou por decidir instalar-se perto de nós, numa área que ainda se pode considerar próxima e de fácil acesso à grande cidade, onde todos trabalhamos, e cada vez mais, a exemplo do que se passa em todas as grandes aglomerações o custo da habitação está a ficar inacessível. Aqui, apesar dos condomínios começarem a fazer parte do nosso parque imobiliário, as jovens familias numa busca duma melhor qualidade de vida, continuam a preferir elevar os seus filhos em residências unifamiliares. No caso presente foram considerados os prós e os contras, isto é, o custo inicial do imóvel face à vantagem de ficarem perto dos avós dos seus dois rebentos, facilitando assim os acordos de última hora para os serviços de «babysitting», tão necessários para as jovens famílias de hoje, como o foi para as da nossa geração, afinal.
Depois da pequena festa familiar e dos netos Antoine e Coralie terem partido para os braços de Morfeu, enquanto lá fora nos apercebíamos de que uns pequenos pontos brancos teimavam em não parar de cair, e os nossos dois filhos Olivier e Dominique mantinham animada conversa sobre linguagens de programação, C++, JSP, MySQL ou outras informáticas, a esposa e a nora Caroline falavam de tudo e de nada, e o autor destas linhas descansava tranquilamente no sofá do salão, do que fora uma manhã activa no escritório e uma tarde de trabalho com uma das colaboradoras noutras actividades que mantemos, os puros e imaculados farrapos brancos no exterior teimavam em continuar a cair e entretanto já rodopiavam e batiam nos amplos vidros da janela sob o efeito da ventania que se levantara proporcionando-nos um espectáculo sempre belo e renovado, na luminosidade característica das noites de neve.
Já nessa altura repetíamos para os nossos botões, que de novo, as meninas da televisão se tinham enganado, e em vez dum centímetro de neve, já teríamos pelo menos mais vinte centímetros de brancura ao sairmos para a rua, onde os sapatos que calçávamos se mostrariam mais uma vez inadaptados à situação.
Chegados aqui o leitor perguntará, mas afinal o que tem «Fred» a ver com tudo isto ? Fred é o nome duma marmota, e não é uma marmota qualquer, mas bem a marmota oficial do Québec, simpático animalzinho da família dos roedores, que cava e habita em pequenas galerias subterrâneas, hibernando durante os longos meses frios. A sua função é a de prever quantas semanas nos faltam ainda de Inverno.
Assim, nos primeiros dias de Fevereiro de cada ano, e um pouco à imagem do que se passa noutras cidades da América do Norte estes simpáticos animais são chamados a dar a sua colaboração, na previsão das semanas que nos esperam de frio e de neve. No nosso caso, e porque o animal viu a sua sombra, numa importante cerimónia que teve lugar numa pequena localidade da península de Gaspé, onde não faltou o testemunho das entidades oficiais, sempre prontas, com a sua presença e respectiva fotografia, nos momentos graves da vida do povo, e de várias centenas de anónimos espectadores. Tudo isto logicamente, acompanhado por algumas bebidas bem quentes e outras guloseimas de circunstância. Ficou decidido que ainda teremos de suportar mais seis semanas de duro Inverno, numa previsão que não é corroborada pelas outras marmotas oficiais das restantes cidades do Canadá e dos Estados Unidos, com gabarito suficiente para poderem guardar em vida o simpático animalzinho, e sobretudo, manter-lhe esta inata capacidade ao longo dos anos. Se considerarmos a regra das maiorias, a nossa marmota está equivocada, pois praticamente todos os outros animais previram Invernos curtos, com Primaveras quentes e precoces. Esta foi também a opinião da mais famosa e conhecida das marmotas, a celebríssima e por todos conhecida, Punxutawney Phil, de Filadélfia, onde tudo isto começou no distante ano de 1888. Ela não viu a sua sombra, prevendo assim um Inverno curto, como todos esperamos afinal.
Dirão que tudo isto não passa duma brincadeira, mas se os especialistas dos serviços de meteorologia, com todas as tecnologias à sua disposição se enganam nas suas previsões diárias, por que razão não teriam as pequenas e simpáticas marmotas, o direito ao equívoco como qualquer humano?
J.L. Reboleira Alexandre
jose.alexandre@videotron.ca