Autor de dez livros de poemas, um de entrevistas, três de literatura infanto-juvenil e um sobre Liberdade de Imprensa, José Carlos de Vasconcelos (n.1940) vê em 2016 republicado um seu livro de 1970: o hoje já «histórico» volume «De poema em riste». Em vez de livrarias, galerias ou salões, estes poemas eram lidos em sociedades de recreio, fábricas, filarmónicas e associações juvenis ou de estudantes pois como refere o autor no texto de 1970 «eu gostaria de ser um jogral».
O ponto de partida é um lugar específico, o Portugal de 1970: «Aqui onde respiro / o poema não pode ser rouxinol / quando as sílabas são sitiadas / e as almas são cercadas». Nesse lugar específico existe e persiste uma ditadura, a do poema «A dita dura»: «A dita mói / a dita rói / a dita dói / E contra a dita / um povo grita / Mas a dita dita / sempre a sua razão / sua palavra é escrita / a do povo não». E a guerra: «Há crianças que choram no cais / Há mulheres que choram no cais / Há homens que choram no cais /Oh minha pátria que nunca mais». E os bairros de lata: «Aqui quem se mata / não é de tiro ou de faca / mas de febre ou de fome / – bairro de lata / E não tem anúncio ou notícia / não tem flores nem latim / quem aqui morre / – bairro de lata». No meio da revolta a guitarra de Carlos Paredes faz-se ouvir: «Guitarra laranja azul / metal fresco guitarra / não chores canta / sem que nada simule / tudo o que há para cantar».
Trata-se pois de «uma poesia do povo e para o povo» como se refere na página 64: «Somos todos todos iguais / ricos e pobre pretos e brancos / só que uns calçam sapatos / e outros calçam tamancos / Somos todos todos iguais /só que há uns mais iguais / do que outros / Sape sape lagartos / torpes tipos tortos / venerandos mortos / estamos fartos estamos fartos».
(Editora: Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto, Desenho: Tóssan, Capa/Coordenação: Augusto Baptista, Foto: Gonçalo Rosa da Silva)