Espaço Saúde – De Boca Aberta – A capacidade de acreditar

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A Teresa olhava para mim com um ar de espanto. Só podes estar a gozar? Disse ela. Eu nem acreditava no espanto dela, principalmente por ela ser jovem, tinha 35 anos, mas também por ser uma prestigiada docente universitária e mãe de dois filhos…

De onde vinha este espanto? A nossa conversa começara uns dias antes, quando a Teresa  perdeu um dente devido a uma cárie  enorme que lhe tinha fraturado o dente.  Durante uma conversa ela tinha argumentado que  esta situação se devia ao facto dos seus dentes serem fracos e que mais cedo ou mais tarde algo assim iria acontecer.
A conversa decorreu  animada, a maioria das pessoas concordava com ela, contando as histórias mais bizarras sobre as razões pelas quais os nossos dentes se estragam. Quando a discussão estava no seu auge, e já farto de tanta desgraça dentária, resolvi intervir argumentando que eles estavam errados e que o conceito de dentes fracos não é verdadeiro. Apesar de ser a única pessoa relacionada com a área da saúde oral no grupo, não foi fácil que me ouvissem e mesmo assim, acho que alguns ainda foram para casa a pensar que eu lhes estava a contar uma história…
Na realidade as crenças de saúde são muito difíceis de alterar. Hoje em dia ainda se  defende, apesar de já se ter provado o contrario, que a gravidez prejudica os dentes; que o nascimento dos dentes provoca febre; que há dentes fracos e tantas outras histórias nas quais se acredita serem verdades imutáveis.
Será que há uma verdade? Será que as crenças são realmente inalteráveis apesar dos conhecimentos atuais e da informação  disponível não conseguimos mudar as formas de acreditar em saúde oral?
Este espaço não pretende que fiquem de boca aberta por não acreditarem no conteúdo que aqui produzimos, mas deixem-me partilhar alguns factos para vos ajudar a olharem para a boca com outros olhos:
As principais doenças orais são facilmente preveníveis. Elas só acontecem (a cárie e as doenças da gengiva) porque  nós falhamos as medidas preventivas.
Não existem, salvo raríssimas exceções, mau dentes. Existem sim maus ambientes à voltados dentes e esses, é um dever  nosso controlá-los.
A grande maioria, mas grande mesmo, do mau hálito tem origem na boca. Na maior parte das vez ele é  uma consequência de inflamações gengivais ou zonas de “placa bacteriana”  imaculada, ou seja, raramente controlada.
A gravidez não está associada com o aumento do risco à cárie.  É um facto que durante a gravidez os problemas gengivais podem aumentar e nessa área existe uma relação direta. No entanto, em relação aos dentes, o mesmo já não se verifica.
Muitos são os mitos que vão sobrevivendo ao tempo, no entanto é fundamental ir procurando respostas para desmistificar estas situações.  Principalmente porque elas prejudicam a saúde oral de milhões de pessoas. Quando acreditamos que algo vai mesmo acontecer e descuramos as medidas que o  podem prevenir. Muitas vezes procuramos ajuda para remediar a doença e as suas sequelas, na verdade, deveríamos procurar mais ajuda para evitar a doença e as suas sequelas. Com essa atitude, teríamos menos problemas e acreditem, para além dos ganhos em saúde teríamos certamente ganhos financeiros. Na verdade, a saúde é muito mais económica que a doença…

Mário Rui Araújo
mra@meo.pt