A cidade das Caldas da Rainha encontra-se dividida ao meio pela linha de caminho-de-ferro. Não é nada de extraordinário. Existem muitas cidades assim. Algumas estão divididas por acidentes naturais, como rios, e outras por construções humanas, como, por exemplo, autoestradas.
Essas divisões têm, muitas vezes, como consequência um diferente ritmo de desenvolvimento entre as duas metades da cidade. É normal encontrarmos cidades em que uma das margens do rio alberga mais equipamentos e concentra mais meios de produção do que a outra; em que os habitantes com maior poder de compra residem, preferencialmente, num dos lados da autoestrada… É normal que isso aconteça mas não é desejável.
Tais diferenças têm geralmente razões históricas que as explicam. Nas Caldas, por exemplo, a cidade nasceu e cresceu e, quando passou a ser servida pelo comboio, a linha foi construída numa extremidade da cidade. No início a linha não dividia a cidade. Contornava-a. Assim, a parte da cidade que ocupa o lado poente da Linha do Oeste nasceu como sendo uma periferia das Caldas. Era o bairro “Além da Ponte”, sendo que a “ponte” era o único ponto de ligação entre a cidade e o novo bairro que começava a surgir para lá da linha do comboio.
Terá sido a evidente diferença entre a cidade a poente da linha e a cidade a nascente da linha que conduziu à criação, já na década de 80 do século passado, da freguesia de Santo Onofre. Foi uma das conquistas permitidas pelo regime democrático. As pessoas de bem dos bairros “Além da Ponte” quiserem ter uma palavra a dizer na condução do seu destino comum, palavra essa que ajudasse a desenvolver a freguesia e a melhorar a qualidade de vida das pessoas que lá residiam e trabalhavam. Tratava-se, na altura, de fazer o possível para que se diminuíssem as diferenças entre os dois lados da cidade.
No entanto, muitos foram aqueles que, desde então, procuraram olhar para as duas freguesias urbanas das Caldas da Rainha com o olhar de adeptos de futebol. Incitam à rivalidade entre as gentes dos dois lados da linha, sem perceberem que o desenvolvimento de qualquer parte da cidade das Caldas tem sempre repercussões positivas em toda a cidade.
Acredito que hoje, mais do que nunca, faz sentido olhar para as duas freguesias numa lógica de cooperação ao invés de competição. As pessoas que moram nos Arneiros ou na Encosta do Sol; que trabalham no Bairro da Ponte ou no Borlão; que vivem nas Morenas ou na Praça da Fruta, todas elas sentem verdadeiramente que vivem na cidade das Caldas da Rainha. Não faz sentido, assim, tentar replicar numa freguesia tudo o que já existe na outra freguesia. Existem serviços e equipamentos públicos que devem estar próximos da população e, esses sim, devem existir em duplicado (pelo menos) na cidade. Não faz sentido que exista apenas um Centro de Saúde em toda a cidade e, ainda por cima, na mesma freguesia onde se encontra o Hospital. É, assim, bem-vinda a construção dum Centro de Saúde na freguesia de Santo Onofre. Mas será que se deveria contruir também um Hospital em Santo Onofre só porque já existe um em Nossa Senhora do Pópulo? Claro que não. O Hospital serve toda a região das Caldas, esteja ele em que freguesia estiver. A não ser assim, também teríamos a população de Nossa Senhora do Pópulo a exigir a construção dum complexo desportivo ou até duma autoestrada, só porque já existem em Santo Onofre. Seria um absurdo.
De resto, a cidade tem de se desenvolver como um todo e cada lado da cidade saber cooperar com as freguesias vizinhas, urbana ou rurais, para que todas em conjunto se desenvolvam cada vez mais. A cidade só está dividida pela linha de caminho-de-ferro. Não tem de estar dividida naquilo que mais importa que são as pessoas. Aí, a cidade tem que estar unida.