A propósito das praxes na ESAD, a Gazeta das Caldas trazia, na sua edição de 14 de outubro, uma peça que tem vindo a levantar polémica. Imbuído do espírito descontraído e brincalhão que normalmente acompanha as praxes académicas, Carlos Cipriano socorreu-se de vários trocadilhos linguísticos e, com muita graça, lá foi dando a sua visão sobre as praxes.
A primeira questão que se levantou foi o facto do referido texto, que pelo estilo e objetivo não pode deixar de ser considerado um artigo de opinião, não ser assim identificado e vir enquadrado na secção Sociedade. A verdade é que tal se tratou de um lapso que já foi devidamente reconhecido, tendo Carlos Cipriano pedido as justificadas desculpas.
Por outro lado, já se admite que seja criticável a opção do jornalista e responsável da Gazeta em ter utilizado um estilo e uma terminologia que, não se lhe negando o apurado sentido de humor, parece cair na situação que ele próprio critica. Com efeito, ao utilizar, como utilizou, a ironia e os trocadilhos que podem ser ofensivos, Carlos Cipriano colocou-se numa posição em que, para os visados, perde a autoridade de criticar a humilhação e o insulto barato a que parece querer reduzir as praxes.
Aceitem-se ou não as praxes, concorde-se ou não com a opinião de Carlos Cipriano, a verdade é que o seu texto teve o condão de trazer para a discussão pública esta questão. Sendo um fenómeno que também se passa nas Caldas, não quero deixar de dar o meu humilde contributo para a discussão. Não sendo eu conhecedor de como se fazem atualmente as praxes na ESAD, limito-me a expor, em termos genéricos, a minha opinião sobre os fundamentos da praxe.
A entrada para a universidade é um momento de transição para os jovens. Não só porque o ensino superior envolve, do ponto de vista intelectual, de metodologias de estudo e da quantidade de trabalho, uma mudança enorme relativamente ao ensino secundário, mas também porque é nessa fase que, normalmente, rapazes e raparigas saem de casa dos pais para prosseguirem os seus estudos numa outra cidade. É o que acontece, certamente, com a maioria dos estudantes da nossa ESAD. Tamanha mudança não é fácil de gerir por parte dos jovens e, nessa perspetiva, tudo o que os ajudar no seu processo de inclusão, tornando-o mais rápido e eficaz, deve ser aplaudido.
Ora é essa, na minha opinião, a função da praxe académica: ajudar a integrar na academia e na cidade os alunos mais novos. A ser assim (e se for assim) a praxe é, na verdade, um direito dos caloiros. É um direito disponível, ou seja, um caloiro pode prescindir dele, mas não deixa de ser um direito.
Sendo um direito dos caloiros, a praxe deve ser encarada pelos alunos mais antigos como um dever. Os alunos mais experientes têm a obrigação de ajudarem no processo de integração dos caloiros. Esse processo faz-se, tradicionalmente, através do exercício dum poder por parte dos alunos mais antigos sobre os mais novos. Esse poder, que é também um dever, será bem exercido enquanto se mostrar que corresponde ao direito dos caloiros em serem bem integrados. Quando, numa praxe, o exercício do poder por parte dos mais antigos não tiver como objetivo satisfazer o interesse dos caloiros mas antes a vontade egoística daquele que praxa em querer abusar dum poder sobre alguém que, naquele momento, está em clara inferioridade, aí sim, será um ato que deve ser denunciado e combatido.
Fica à consideração de todos (alunos, academia e leitores), saber se as praxes da ESAD nas Caldas da Rainha cumprem ou não aquele objetivo.