O pagamento de uma dívida de 4000 euros a Filipe Mateus por uma auditoria feita às transferências de contas entre a associação e a Junta da Foz do Arelho foi o tema em discussão numa inusitada Assembleia de Freguesia, realizada a 1 de Fevereiro, que acabou por decidir – por unanimidade – que se saldasse a dívida.
A convocatória desta Assembleia de Freguesia surpreendeu os deputados porque tratava de decidir aquilo que já tinha sido decidido em anterior reunião – o pagamento da auditoria realizada às contas da Associação Para a Promoção Turística da Foz do Arelho.
O tesoureiro da Junta, José Ferreira, começou por dizer que não passaria o cheque a Filipe Mateus porque este não tinha competências para ter realizado uma auditoria, baseando-se para tal num parecer do advogado caldense Filipe Estêvão Ferreira.
Um documento, porém, que já estava ultrapassado pelos factos porque o processo que foi movido a Filipe Mateus pela Ordem dos Revisores de Contas, fora arquivado pelo tribunal. A Ordem alegava que aquele técnico não tinha competências para auditar as contas da freguesia, uma vez que não era membro da Ordem dos Oficiais Revisores de Contas, mas o Ministério Público arquivou o processo por considerar que a actividade por ele desenvolvida “se afigura estar enquadrada no âmbito permitido pelo estatuto da sua Ordem profissional [Ordem dos Economistas] conforme confirmado por esta”.
E foi este documento do tribunal que Fernando Horta, deputado do PSD, apresentou juntamente com uma moção que solicitava a liquidação do valor em dívida a Filipe Mateus pelo trabalho feito na autarquia (e que tinha sido adjudicado pela Assembleia de Freguesia no mandato anterior).
Isto porque a reunião chegara a um impasse. José Luís Quaresma (CDS/PP), presidente da Assembleia de Freguesia, quis pôr o pagamento à votação, mas os deputados do PSD repetiram várias vezes que tal não fazia sentido porque a decisão já estava tomada. Henrique Correia, daquele partido, disse mesmo que se recusava votar uma decisão que já tinha sido votada e que toda esta situação era ridícula.
O problema foi ultrapassado com a votação da moção, que foi aprovada por unanimidade: dois votos do PSD, dois dos CDS/PP e quatro do MIFA (Movimento Independente da Foz do Arelho), que suporta o executivo.
José Luís Quaresma colocou ainda a questão se deveria ficar fiel depositário das pastas com os documentos que foram auditados. Estas foram-lhe entregues por Filipe Mateus quando concluiu o seu trabalho e não devem regressar ao executivo até que a Assembleia de Freguesia receba o relatório e delibere o que fazer com ele.
Segunda auditoria
Esta foi a segunda auditoria realizada por Filipe Mateus a pedido da Assembleia de Freguesia (do mandato anterior). A primeira foi às contas da Junta e a segunda às da Associação para a Promoção e Desenvolvimento Turístico da Foz do Arelho, que tem sede na própria Junta de Freguesia e assegura à população algumas das suas valências.
Após o período da ordem de trabalhos, o presidente da Junta, Fernando Sousa (MIFA) comunicou que a freguesia iria contar com uma loja do cidadão, a funcionar na sede da junta. No concelho das Caldas já existem lojas do cidadão nas sedes das juntas de A-dos-Francos, Santa Catarina, Santo Onofre e Nossa Senhora do Pópulo.
Tribunal arquiva processo movido ao auditor das contas da Junta de Freguesia
Foi arquivado o processo movido pela Ordem dos Revisores de Contas a Filipe Mateus, autor do relatório da auditoria à Junta de Freguesia da Foz do Arelho, que detectou um desvio de cerca de 193 mil euros.
Em causa estava o facto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (OROC) não reconhecer competência legal aquele economista para auditar as referidas contas, uma vez que “não é membro da OROC, e consequentemente não está, nem pode estar inscrito na lista de Revisores Oficiais de Contas”, informou na altura o presidente da Junta, Fernando Sousa, aos jornalistas. Acrescenta que a actividade de auditoria às contas apenas pode ser exercida por Revisores Oficiais de Contas, pondo em causa a legalidade do relatório entregue por Filipe Mateus.
Em Agosto de 2017, depois do presidente da Junta da Foz, Fernando Sousa, ter tornado público o parecer da Ordem, Filipe Mateus enviou um esclarecimento à Gazeta das Caldas onde se dizia “legitimado pela Assembleia de Freguesia para a realização do trabalho”. Acrescentava ainda ter “legitimidade académica e profissional para a realização deste tipo de trabalhos” e referiu que “em momento algum se fez passar por Revisor Oficial de Contas”.
O técnico informou que neste trabalho consultou e analisou 72 pastas de arquivo, com mais de 14 mil folhas, bem como cerca de 1200 cheques. No fim do trabalho as pastas foram “por deliberação por unanimidade da Assembleia de Freguesia, entregues ao Ministério Público”.
A decisão do tribunal, datada de Outubro de 2018, foi a de arquivamento do processo, tendo em conta que Filipe Mateus estava legitimado para poder realizar a tarefa de auditoria e porque não se provou que este tivesse “prestado declarações invocando habilitações literárias diversas das possuídas nem se ter intitulado de Revisor Oficial de Contas”. Ficou, assim, afastado que este tivesse cometido o crime de “usurpação de funções ou outro”.
INVESTIGAÇÃO AINDA DECORRE
O relatório da auditoria à Junta de Freguesia da Foz do Arelho, tornado público em Junho de 2017 apontava para um desvio de cerca de 193 mil euros nas contas entre 2013 e 2016, assim como “fortes indícios” de fraudes contabilísticas, crimes tributários, apropriação indevida de dinheiros e uso de dinheiros públicos para fins particulares. No documento são visados sobretudo o presidente da Junta, Fernando Sousa, e a secretária do executivo e funcionária Junta, Maria dos Anjos, bem como tesoureiros que fizeram parte do anterior executivo.
O processo daí resultante está em investigação na Polícia Judiciária de Leiria, ao qual foi apenso um outro processo que resultou de uma queixa que a Junta de Freguesia apresentou contra Maria dos Anjos.
Esta última é, até à data, a única arguida por ter passado cheques da Junta de Freguesia a ela própria no valor de 7254,84 euros e por ter admitido que retirou 14 mil euros do cofre da Junta. No entanto, Maria dos Anjos alegou à polícia que se apropriou do dinheiro com o consentimento de Fernando Sousa que desta forma comprava o seu silêncio para ela não denunciar “as inúmeras falcatruas que naquela junta ocorriam” (de acordo com o processo que Gazeta das Caldas consultou de forma legal). O pacto de silêncio entre ambos decorria do facto de Maria dos Anjos conhecer as irregularidades da autarquia, nomeadamente o destino dado pelo presidente da Junta, Fernando Sousa, às receitas do parque de auto-caravanas. A ex funcionária da Junta, entretanto despedida e então autarca eleita, acusava o presidente de “se apoderar de forma ilícita do dinheiro do cofre da Junta para fazer seu o dinheiro em numerário das receitas da Junta e do parque de auto-caravanas”.