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O título que gostaríamos de dar a este testemunho seria “Morreu um Zé Povinho do séc. XX”, que se arriscaria a colher a condenação de muitos leitores e comentadores, pois seria uma ousadia fazê-lo,  mesmo que encontre entre ambas as figuras certas singularidades comuns.
Tal como o Zé Povinho, que também nasceu em Lisboa,  teve nas Caldas da Rainha a sua concretização em três dimensões pela mão de Rafael Bordalo Pinheiro, também Mário Soares nasceu em Lisboa e veio para as Caldas da Rainha, onde realizou aos primeiros exames escolares, quando aqui viveu em casa da família Freitas por o pai estar preso nos Açores.
Zé Povinho também não é uma figura pacífica ou de unanimismo, uma vez que transporta consigo, tanto as virtudes do povo português, como os seus defeitos e incoerências.
Mário Soares também, ao longo dos seus 92 anos de vida, coleccionou feitos e defeitos, tendo sido sempre uma pessoa e político controverso, que somou amizades e inimizades, no mundo e no seu país.
Analisado hoje, e basta ouvir os comentários das últimas horas nos media portugueses e internacionais, Mário Soares acaba como uma  personagem estimável, mesmo com uma visão e com uma vontade inquebrantável para atingir os seus objectivos, tendo como referências centrais a Liberdade e a Democracia. Mas por outro lado, também podemos encontrar nele os defeitos tão do Zé Povinho, da vaidade, de uma certa presunção e de um convencimento sem limite, que em política, onde foi mestre, também são virtudes.
Provavelmente não cultivou todos os defeitos e virtudes em simultâneo, alternando-os fruto das circunstâncias e dos momentos históricos que viveu, razão pela qual reuniu apoios e sentimentos diferentes nos vários momentos da sua vida.
Como nota pessoal, os primeiros encontros à distância com Mário Soares foram – ainda antes do 25 de Abril – em França, quando este ali estava no exílio depois da deportação em S. Tomé e ia meio anonimamente ao banco onde eu trabalhava em Paris e que era liderado por alguns dos seus compagnons de route, como Vasco Vieira de Almeida, Rui Vilar e Francisco Veloso (este também já falecido).

 

Soares
GC 13-01-2017
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