Amoreira aposta na valorização do património molinológico

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Visitas, exposição, um mercado, palestra e animação, foram algumas das atividades realizadas para assinalar o Dia Nacional dos Moinhos

No início os grãos eram ingeridos em cru, ou tostados, ainda na espiga. Mais tarde, o Homem começa a esmagar os grãos e a transformá-los em farinha, desenvolvendo diferentes processos e recorrendo a diferentes formas de energia. A explicação histórica foi dada por Orlando Carvalho, amoreirense e filho do último moleiro da terra.
De acordo com este apaixonado pela molinologia, foram os gregos e os romanos quem disseminou os moinhos, inicialmente movidos a água, pela Europa e só mais tarde viriam a aparecer os moinhos de vento. Estes, no tempo da monarquia, eram sobretudo pertença dos grandes senhores rurais que cultivam cereais e,entre os seus assalariados, tinham os moleiros, que transformavam o trigo e milho em farinha. “Alguns dos moleiros saíam das propriedades desses senhores e construíam os seus próprios moinhos, daí existirem tantos espalhados pelo país”, explicou Orlando Carvalho na palestra “Do grão ao pão”, que decorreu na tarde de sábado, inserida nas comemorações do Dia Nacional dos Moinhos.

Mas a vida de moleiro não era fácil. “Vivia de uma maquia que lhe era dada em troca da farinha que produzia no moinho, e que depois vendia nas terras vizinhas”, explicou o orador, acrescentando que este juntava a família para trabalhar consigo. Esta continuidade familiar perdurou até às décadas de 70/80 do século XX, recordou Orlando Carvalho que, também ele, ajudou o pai no moinho até aos 17 anos, no moinho de vento e na azenha.
“O moleiro era um sábio, porque olhava para os astros e sabia como o tempo se iria portar, e era um engenheiro porque quando se estragava a peça do moinho tinha de a recriar”, resumiu.
Na exposição que esteve patente numa das salas da Alcaidaria Mor, com contributos da população, foi possível apreciar pinturas, fotografias, mas também vários artefatos utilizados na transformação dos cereais e confeção do pão. Patentes estavam também diversas espécies de trigo, que são tradicionais portuguesas, e que Orlando Carvalho defende que devem ser recuperadas e colocadas de novo no mercado.
Durante o fim-de-semana decorreu, pela primeira vez, no largo da localidade, um mercado da Primavera, com a venda de diversos produtos alimentares e artesanato, animação com as Concertinas d’Óbidos e o Rancho Folclórico e Etnográfico “As Ceifeiras da Fanadia” e visitas ao moinho de vento.
Valentim Nunes, da Moita dos Ferreiros, Lourinhã, aproveitou o facto do Moinho dos Hipólitos estar de portas abertas para o visitar. Tem 67 anos e é moleiro. O seu Moinho do Boneco (nome que ganhou da alcunha do avô) continua a transformar cereais (trigo e milho) em farinha, que vende para vários pontos do país, sobretudo padarias.
Já Maria Fernanda Tavares chegou movida pela curiosidade. Aluna do curso de Padaria Avançada na Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste (EHTO), a jovem brasileira leu as primeiras páginas do livro Pão de Autor onde fala sobre os moinhos e tentou saber mais sobre a sua existência e função. “É importante retomar a cultura e conhecimento do processo desde o grão até ao pão”, salientou Maria Fernanda Tavares, que há três anos produz o seu próprio pão. A jovem, que atualmente reside no Baleal (Peniche) pretende ficar no país e já está a estabelecer contatos com restaurantes e padarias para vender o seu pão de fermentação natural, mais saudável.

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Recuperar as azenhas
As comemorações do Dia Nacional dos Moinhos, entre 7 e 10 de abril, foram organizadas pela Junta de Freguesia da Amoreira, dando assim continuidade a evento de anos anteriores. “Entendemos que é importante preservar o património existente e dar a conhecer aos mais novos os moinhos e a confeção do pão, tal como era feito antigamente”, explicou à Gazeta das Caldas, Maria João Soares, secretária da Junta de Freguesia.
A localidade possui diversos moinhos e azenhas e a junta de freguesia está a incentivar os donos, sobretudo das azenhas, para as recuperarem e, assim, fazerem um prolongamento do evento, desde os moinhos de vento aos moinhos de água.

Moinho dos Hipólitos é considerado exemplo de recuperação

Situado na Serra da Amoreira, teve portas abertas para visitas

O Moinho dos Hipólitos esteve, mais uma vez, aberto para visitas durante as comemorações do Dia dos Moinhos. E foram muitos os que não perderam a oportunidade de conhecer, ou rever, o funcionamento do moinho e ouvir a entusiasmada explicação de Vítor Hipólito, descendente de cinco gerações de moleiros e o responsável pela sua recuperação.
O moinho tem mais de 200 anos, está há mais de 150 anos na família Hipólito e moeu, até meados da década de 1960.
Os trabalhos de recuperação foram realizados entre 2002 e 2004, período durante o qual Vítor Hipólito, contatou com carpinteiros, artesãos (para fazer as velas), oleiros (para fazer os búzios) e outros profissionais, ficando a conhecer melhor a comunidade portuguesa ligada à molinologia.

Situado na serra da Amoreira, o moinho está na família há mais de 150 anos

A residir em Toronto, mas realizando várias viagens a Portugal durante o ano, o amoreirense recorda que o fascínio pelos moinhos começou em criança, a ver o seu pai a trabalhar, assim como os seus avós e tios, que possuíam uma azenha, com quatro mós, também na Amoreira.
“Se somos donos de um moinho há uma responsabilidade da sua recuperação”, conta, acrescentando que, mais de uma década depois das obras terminadas, decidiu abrir o moinho à comunidade. Desde então o local tem sido palco de visitas, exposições, música e também de recriações etnográficas, por parte do Rancho Folclórico As Ceifeiras da Fanadia.
“Tem sido uma experiência muito positiva, sobretudo com as crianças das escolas, que aqui aprendem como o moleiro trabalhava e era feita a farinha de trigo e de milho”, conta o também membro da Rede Portuguesa de Moinhos e The International Molinological Society.
No local é possível também encontrar vários utensílios utilizados na preparação da farinha, assim como o catavento original, que ajudava o moleiro a perceber de que lado estava o vento.
Vítor Hipólito recorda a forte presença de moinhos e de azenhas nesta localidade e defende que era importante recuperar este património.

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