Na região há sítios que procuram manter viva a tradição, promovendo eventos para os mais novos
Toca a campainha. Ouvem-se do outro lado as vozes das crianças a exclamar entusiasmadas: “Pão por Deus!”. O cenário, que era tão tradicional, é cada vez mais raro, especialmente na cidade das Caldas. As mudanças sociais fazem perder esta tradição. Ainda é possível ver alguns pequenos grupos e, em particular, nalgumas zonas da cidade. Mas longe vão os tempos que permanecem na memória das gerações adultas de ser um acontecimento popular.
Há ainda sítios que resistem e procuram manter viva a tradição, promovendo, no dia 1 de novembro, eventos que permitem às crianças pedir o Pão por Deus de uma forma segura e divertida, como os mais velhos se recordam de fazer.
Nos Vidais, uma freguesia rural do concelho das Caldas, começou-se há três anos a comemorar o Pão por Deus e daí para cá não mais se parou. A adesão das crianças e a relevância que sentiram na iniciativa levou a organização a manter o evento anualmente.
Este ano, na sexta-feira, dia 1 de novembro, logo pela manhã, o grupo de mais de 30 crianças e pais, juntou-se com os sacos e começou a percorrer a rua da aldeia da Carrasqueira. Era um dos grupos na freguesia, numa inciativa que envolveu um total de 60 crianças e familiares. Uns trajados a rigor, outros “só” com a diversão e a “ansiedade” de ver cheios de doces os sacos ainda vazios.
Há várias particularidades neste evento organizado pela Junta de Freguesia, por exemplo, o percurso é previamente definido e os moradores avisados da passagem do cortejo, pelo que se preparam com as suas oferendas.
Chegamos quando o grupo pára em frente à casa de Nuno Crespo, na Carrasqueira. Aqui há Pão por Deus para os mais novos e também para os adultos, com uma ginja caseira. Somos recebidos por dois afáveis cachorros que se deliciam com os mimos e a atenção que recebem.
“Gosto muito e todos os anos preparo o Pão por Deus, porque é giro e é importante nós mantermos estas tradições”, referiu este morador, visivelmente contente com a iniciativa.
“As pessoas têm mostrado grande adesão a este evento e é muito bom ver os miúdos e os pais a continuar estas tradições”, diz, até porque, reforça, “as aldeias estão cada vez mais desertas e é importante a população unir-se para manter vivo este espírito, porque caso contrário estas coisas vão-se perdendo com as nossas rotinas e as obrigações diárias”.
Seguimos caminho, por uma rota que nos permite ir apreciando algumas das bucólicas paisagens da freguesia dos Vidais e aproveitamos uma nova paragem para falar com André Caetano, que vive precisamente nesta aldeia, mas que está a participar, com a esposa e o filho, Isaac, de nove anos, nesta iniciativa.
“Nunca tínhamos participado, porque nos mudámos este ano para cá, mas está a correr bem, faz-me lembrar os meus tempos de infância”, resumiu, admitindo-se surpreendido com a adesão à iniciativa. “Não esperava que participassem tantas crianças, mas é importante para manter esta tradição e para eles conhecerem os significados das coisas”, frisa.
O envolvimento das famílias é outro dos pontos fortes que vê nesta atividade.
“Acho que a Junta de Freguesia fez bem em organizar este evento e que é uma iniciativa que poderia ser também replicada noutras freguesias, com as Juntas a fazerem um roteiro e a avisarem os moradores, porque para as crianças é uma alegria !”, defendeu.
Aproveitamos também para falar com Rafael Silva, que tem seis anos e que vive nos Vidais. Também ele nunca tinha participado neste Pão por Deus e, enquanto repousa num sofá, descreve-nos as suas impressões. “É divertido e ganhei montes de doces, quase um saco inteiro!”, disse alegremente.
“Foi fixe irem tantos meninos, mas foi um bocadinho cansativo, andámos muito a pé”, contou, esclarecendo que veio vestido de Darth Vader e o pai de Luke Skywalker. “Gosto muito do Stars Wars e até tenho o Lego do Darth Wader”, contou.
“O doce que gostei mais foi uma bolacha de chocolate”, afirmou.
O grupo faz parte do percurso a pé, outra de carro, passa por Cortém e termina nos Casais do Igreja, com novo brinde com ginja caseira para os mais velhos e os saquinhos do Pão por Deus dos mais novos carregados com doces, frutas, bolos, etc.
O presidente da Junta de Freguesia dos Vidais, Rui Henriques, explicou que decidiu retomar esta tradição portuguesa e unir as crianças da freguesias há três anos. “Vão conviver e percorrer a freguesia”, nota o autarca, explicando que durante a iniciativa convivem com as pessoas mais velhas e mais isoladas, num convívio muito saudável para as duas gerações.
Nas várias aldeias organizam-se grupos para o porta a porta, com os Grupos de Moradores. “O evento tem crescido todos os anos”, refere, explicando que oferecem sacos com doces, fruta local e uma história ou lenda (para dar a conhecer a História, por exemplo, do São Martinho, da cidade das Caldas ou da freguesia dos Vidais). “Oferecemos também conhecimento”, refere o autarca, notando que a leitura desse documento é sempre um momento que as crianças apreciam. Rui Henriques deixa ainda a nota que “Vidais não pára”, convidando os leitores para percorrer a rota dos Presépios da Minha Aldeia, inaugurada a 8 de dezembro, com a cerimónia final no dia 6 de janeiro.
Houve outros locais no concelho com iniciativas do Pão por Deus, que também é assinalado nas diferentes escolas. No La Vie havia decoração de sacos e jogos.
Centenas nas Gaeiras
No concelho de Óbidos, mais precisamente na freguesia das Gaeiras, o Pão por Deus é um evento importante que é organizado pela Junta de Freguesia há cerca de dez anos.
Este ano o evento reuniu um total de mais de 600 crianças e as suas famílias.
Além da distribuição dos sacos e respetivos doces para as crianças fazerem o porta a porta, neste dia é dinamizada por um grupo de cerca de 15 voluntários da freguesia uma atividade intitulada de “Oficina do Pão”, que lhes permite visitar o moinho do Ti Manel, perceber o processo de transformação do cereal em farinha e depois colocar as mãos na massa e fazer o próprio pão.
O presidente da Junta de Freguesia das Gaeiras, Ricardo Duque, salienta a crescente adesão, com gente de outras freguesias, dos concelhos das Caldas e de Óbidos, que sabem que aqui existe a tradição e, portanto, o hábito de abrir as portas. Havia, ainda, jogos tradicionais nalguns locais da freguesia.
O autarca pretende “continuar a incentivar a população para que neste dia abra a porta” e que com estas ações os mais novos “cultivem este hábito de dar e receber, que do ponto de vista formativo é um dos valores mais importantes desta iniciativa”. ■
Uma casa assombrada para o Halloween
Na noite do terror, a Expand fez uma visita a uma casa assombrada, na Colmeia, nas Caldas
Uma visita à casa assombrada do maior serial killer do Oeste era o mote para a noite de Halloween proposto pela Expand, um grupo de jovens que se conheceu na ESAD e que se uniu para organizar eventos.
Mal chegamos à antiga Colmeia, ao lado dos Silos, na noite de 31 de outubro, a iluminação foi pensada para criar terror. Toda a receção nos vai preparando para o assustador.
Entramos. Vemos roupa por todo o lado e somos recebidos por duas personagens. Somos guiados pela casa e nas várias divisões, diferentes vítimas do assassino em série vão partilhando as suas histórias e pormenores relativos ao assassino.
Com mais e menos sustos e gritos, chegamos a uma última sala, onde encontramos o assassino. Este partilha a sua história e trata-nos como as próximas vítimas. No final somos “convidados” a fugir do assassino.
A antiga Colmeia é atualmente um espaço que é utilizado por uma associação também como depósito de roupa para doação para os mais necessitados.
João Amaral, da Expand, explicou que dado que “este espaço tem roupa por todo o lado, aproveitámos esse aspeto para criar uma história à volta disso. É um serial killer que matava as vítimas aqui e ficava com as suas roupas”.
A apresentação desta “peça” interativa envolveu nove pessoas, entre os quais alunos da ESAD que participaram no projeto.
Cada sessão durava entre 15 e 20 minutos, com grupos de oito a dez pessoas. “Está esgotado”, fez notar João Amaral. Ao longo da noite receberam “mais de 100 pessoas”, complementou. Entre os visitantes, alguns vinham já trajados a rigor, dado que, no final, havia uma festa de Halloween com DJ Fred, no Central Silos, logo ao lado, com concurso para os melhores disfarces individual e de grupo.
A Expand realizou o seu primeiro evento em abril deste ano e surge da iniciativa de jovens, alguns das Caldas, que se conheceram na ESAD. Dois deles tiraram o curso de Programação e Produção Cultural e uniram-se também a pessoas da área do design gráfico para criar um grupo com o grande objetivo de dinamizar eventos culturais, artísticos e festivos.
Pelo concelho realizaram-se outras iniciativas para celebrar o Halloween. Entre festas e caminhadas, comerciantes que aderiram (decorando montras, mascarando-se e preparando menus temáticos, por exemplo), e espetáculos, houve também o assinalar do Halloween nas escolas. ■