Duas obras de Malhoa do Novo Banco foram depositadas no museu caldense

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Duas Obras de Malhoa do Novo Banco - Gazeta das Caldas
Maria da Conceição Pereira (vereadora), Celeste Amaro (directora regional), Tinta Ferreira (presidente da Câmara das Caldas), António Ramalho (CEO Novo Banco), Fernando Baptista Pereira (assessor do ministro da Cultura) e Carlos Coutinho (director do museu) - Natacha Narciso
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O Museu de José Malhoa tem desde o passado domingo, 17 de Junho (dia do seu 85º aniversário), duas novas obras do pintor naturalista caldense que antes pertenciam à coleccção do Novo Banco (antigo BES). Em dia de festa, a Liga dos Amigos – que também assinalou o 15º aniversário da sua refundação – ofereceu vários equipamentos, necessários para o bom funcionamento do Museu.  A sessão terminou com a intervenção de João Serra,  que deu a conhecer com pormenor a realidade cultural caldense na década de 50.

“Ao cair da Tarde”, um óleo sobre tela de 1881 e “Um coleccionador”, óleo sobre cartão de 1888, podem agora ser vistos em exposição no Museu José Malhoa. A assinatura da concessão decorreu entre António Ramalho, presidente do Novo Banco, e Celeste Amaro, directora regional de Cultura do Centro.
As duas pinturas, feitas numa fase inicial da carreira de José Malhoa, pertenciam ao espólio artístico daquela entidade bancária e que estão agora a ser distribuídas “por museus de todo o país nos próximos dois anos”, disse António Ramalho. No total serão 97 as obras que vão ser disponibilizadas a museus nacionais e regionais, disse o responsável, afirmando que, a posteriori, há a intenção de se constituir um roteiro nacional de arte com as obras cedidas.
A colecção tem quadros que são valiosos, mas é nos museus que eles devem estar entre obras congéneres pois é isso que faz sentido. O presidente do banco afirmou que a cedência das obras “é por cinco anos, renováveis, mas o nosso objectivo é que o protocolo seja tão eterno como o banco”, rematou.
Celeste Amaro referiu que este era um momento importante, marcado pela refundação da Liga e pelos 85 anos do despacho ministerial para a criação deste museu. A responsável agradeceu o facto da região Centro ter sido contemplada com várias obras do Novo Banco e que hoje enriquecem os museus de Castelo Branco, da Guarda e das Caldas da Rainha.
O presidente da Câmara, Tinta Ferreira, sublinhou o papel que a Cultura possui nas Caldas e a importância do pintor naturalista. “Por causa de Malhoa, Figueiró é a única cidade portuguesa que é irmã das Caldas”.
Na sessão houve ainda intervenções de Francisco Batista Pereira, em representação do ministro da Cultura, e de historiadora de arte, Ana Paula Correia. Ambos referiram e contextualizaram a colecção do Novo Banco e as duas obras de José Malhoa. A primeira de 1881 é uma paisagem onde se destaca a paleta de cores que o artista usou para transmitir a ideia de final da tarde. Na segunda, de 1888, José Malhoa retratou um coleccionador, algo invulgar na pintura portuguesa, mas que é comum na pintura europeia do século XIX.
Carlos Coutinho, director do Museu, estava satisfeito com o depósito das novas obras que podem agora ser contextualizadas junto às restantes obras do artista. Ao todo há 150 obras do pintor naturalista, umas resultantes de doações e outras que estão em depósito e que pertencem ao Museu do Chiado.
Durante o evento foi inaugurada a exposição “Reviver Malhoa entre Amigos”, que integra obras das reservas do museu e que poderá ser vista até 2 de Setembro. Inclui um núcleo central de obras doadas pela actual Liga dos Amigos (LAMJM). Foi igualmente inaugurada uma segunda exposição, resultante de um concurso de pintura promovido pela Liga.

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LIGA CONTINUA A ANGARIAR SÓCIOS

Margarida Taveira, presidente da Liga, sublinhou o papel de António Montez, criador deste museu “que era também o nº1 da Liga e José Malhoa que era sócio nº 2”, disse.
Margarida Taveira afirmou que o anterior presidente Mário Gonçalves “está para a Liga como António Montez esteve para o Museu Malhoa”, dado que o antigo director do Centro Hospitalar das Caldas e sócio honorário daquela entidade “percebeu que através dela poderíamos ter um suporte para manutenção do Museu Malhoa e para o seu futuro”.
A Liga tem vindo a aumentar o seu número de sócios e presentemente são já cerca de 400.
“Não queremos que falte nada ao nosso museu!”, disse Margarida Taveira, acrescentando que além da compra de obras de arte, têm vindo ao longo dos anos a oferecer vários equipamentos que o museu necessita e que o Estado não pode adquirir. Neste aniversário ofereceram um computador portátil e datalógrafos, que são equipamentos que medem a temperatura e humidade das salas onde estão as obras de arte. “São equipamentos que fazem muita falta e que temos dificuldade em adquirir através das nossas tutelas”, disse Carlos Coutinho.

AS RESERVAS DE TINTA FERREIRA

O presidente da Câmara, Tinta Ferreira, recordou que está em curso a descentralização do Estado para as autarquias, que envolve não só as escolas (básicas e secundárias) e os centros de saúde, como também os museus, aludindo à possibilidade de municipalização daquele espaço. “Tenho muitas reservas sobre este processo”, disse o edil caldense, acrescentando que a decisão “será legal e imperativa”, isto é, “sem ter em consideração a opinião das câmaras”.
O evento contou com apontamentos musicais da pianista caldense Luísa Vieira Pereira e do barítono Armando Possante.

[caption id="attachment_118930" align="alignnone" width="850"]Duas Obras de Malhoa do Novo Banco - Gazeta das Caldas Sala cheia para assistir à cerimónia que durou toda a tarde de domingo – Natacha Narciso[/caption]

“Este museu começou por ser uma pura invenção”

Como era as Caldas nos anos 50, no que diz respeito às artes e à cultura? João Serra dedicou a sua intervenção a esta década, salientando os momentos mais importantes do próprio Museu Malhoa, que era “um dos mais visitados de todo o país”, disse, acrescentando que no seu início (anos 40) não tinha edifício nem colecção. “Logo, era uma pura invenção daquele que haveria de ser o seu fundador, António Montez”, disse João Serra. No início este museu “nem sequer tinha patrono”, informou o historiador. A ligação entre Malhoa e as Caldas nos anos 20 praticamente não existia. “Foi preciso inventá-la, dado que o pintor apenas tinha passado uma infância longínqua na sua terra natal”, disse o orador.
A primeira ambição era a constituição de um museu de artes. Só em 1949, com a realização da Exposição da Estremadura nas Caldas, a cidade ganhou nova importância, tendo permitido a António Montez a constituição do museu. Primeiro apenas com doações e posteriormente com dádivas dos próprios artistas que reconhecem em Malhoa “uma herança e uma marca”, devido ao seu percurso e reconhecimento dentro do mundo das artes.
“Este é um edifício incremental que vai aumentando o número de salas à medida das necessidades”, disse. O edifício abriu em 11 de Agosto de 1940, mas uma década depois precisa de ampliação. “O êxito foi tal que quando abriram as oito salas iniciais, as paredes já estavam cheias”, disse o historiador explicando que era necessário continuar a aumentar o espaço. Em 1950 abriram mais quatro salas e, em 1956, mais duas. Foi feita uma cave, primeiro para reservas e que, posteriormente, se transformou em galeria expositiva.
Em 1957 foi criado um parque de esculturas de ar livre no exterior do museu. João Serra referiu outros temas como as grandes exposições e conferências que se realizaram no Museu Malhoa, muitas delas tendo dado origens a edições. Em 1957 foi doada uma biblioteca de arte pela Gulbenkian, fundação criada no ano anterior. “O modernismo, em conflito com o Estado Novo, não foi recebido neste museu”, disse João Serra, que procurou estabelecer onde “paravam” os artistas modernistas que passaram pelas Caldas Muitos estavam ligados à Secla, e expunham os seus trabalhos na Associação Comercial e também nos cafés: na Zaira (que abriu em 1948), nos Capristanos (1949) no Café Central (1950). “É no Central que em 1955 Júlio Pomar assina um esgrafito, executado por Dias Coelho”, disse o orador.
O convidado chamou a atenção para a vinda para as Caldas do militar, escritor e investigador Manuel Ferreira, que viveu nas Caldas entre 1954 e 1958. Durante a sua passagem pela cidade escreveu e publicou o romance “A Casa dos Motas” (1956), que conta com ilustrações de Ferreira da Silva. O autor era também uma referência para a acção cultural, tendo organizado sessões culturais nos Pimpões (que estão reportados nos arquivos da Pide porque incomodavam o regime) e no Sindicato dos Empregados de Escritório. Este último tinha um grupo de teatro, constituído em 1957, que se designava Conjunto Cénico Caldense e cujo primeiro presidente foi o próprio escritor Manuel Ferreira.

[caption id="attachment_118931" align="alignnone" width="850"]“Este museu começou por ser uma pura invenção” - Gazeta das Caldas João Serra deu uma lição de história sobre os anos 50 nas Caldas – Natacha Narciso[/caption]

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