Ricardo Couto
Caldas da Rainha
35 anos
Edmonton (Alberta), Canadá
Investigador científico de pós-doutoramento na Universidade de Alberta
Percurso escolar: Escola Primária da Encosta do Sol, Escola D. João II, Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro, Universidade Nova de Lisboa (Licenciatura em Química Aplicada, Mestrado em Biotecnologia e Doutoramento em Química Sustentável)
O que mais gosta do país onde vive?
Uma coisa que marca bastante pela positiva, principalmente a alguém acabado de chegar da Europa, é a afabilidade das pessoas em geral, a eficiência e simpatia no atendimento nos serviços públicos (ao contrário do que é a regra na Europa), as oportunidades profissionais e a ausência de crise.
O que menos aprecia?
Da distância ao mar, da alimentação muito baseada em fast-food e do centro da cidade não ter aquela arquitectura típica das cidades europeias. Aqui as ruas são todas largas e perpendiculares e não existem pequenas praças com cafés e esplanadas, o que acaba por transmitir uma sensação de uma cidade descaracterizada e pouco acolhedora.
De que é que tem mais saudades de Portugal?
Da família e amigos, da gastronomia, do clima, do mar, de um café nas esplanadas da Foz do Arelho ao fim-de-semana e do meu Agrupamento de Escuteiros, o imparável 337.
A sua vida vai continuar por aí ou espera regressar?
Espero um dia regressar, mas não me parece que seja num futuro próximo. Aqui estou envolvido em projectos de investigação científica muito interessantes e existe uma forte aposta na investigação como motor de desenvolvimento económico com diversas ligações à indústria. E apesar de só ter chegado há seis meses, já tenho propostas para continuar por aqui com outros projectos. Este cenário actualmente é completamente impossível em Portugal depois do exercício de desmantelamento da capacidade científica nacional a que assistimos nos últimos anos, como resultado dos radicais cortes no orçamento para investigação, que resultou num retrocesso de dezenas de anos.
“Uma grande diversidade cultural faz com que as pessoas sejam bastante abertas e simpáticas”
Neste momento estou a trabalhar num projecto de investigação que pretende desenvolver por processos amigos do ambiente e sem resíduos tóxicos nanopartículas baseadas em lípidos onde possam ser incorporados suplementos alimentares (como vitaminas) para serem usados como aditivos naturais em produtos alimentares saudáveis.
Comecei o ano de 2014 desempregado, depois de um ano de pós-doutoramento em França. Em Fevereiro encontrei uma oportunidade para realizar um projecto de investigação aqui no Canadá, que tinha bastantes pontos de contacto com a investigação que tenho desenvolvido desde 2005. Como achei que este projecto tinha a minha cara, enviei um e-mail concorrendo à vaga. Em duas semanas estava contratado. Onde é que isto é possível em Portugal? Este é um choque cultural muito positivo, pois em Portugal o processo é completamento o oposto. Em vez de serem os professores universitários a terem projectos com financiamento e fazerem a selecção directa de pessoas para os lugares, em Portugal são os candidatos a elaborarem um projecto de investigação que concorre a nível nacional num processo que demora no mínimo seis meses com uma taxa de aprovação baixíssima.
Embora toda a minha investigação anterior tenha sido desenvolvida na área da Química e Engenharia Química, aqui estou inserido no departamento de Agricultura, Alimentação e Ciências da Nutrição e o edifício onde desenvolvo a minha actividade está situado no meio de campos de cultivo e criações de gado que pertencem à universidade para fins de investigação científica, o que proporciona uma caminhada bastante agradável para o local de trabalho, pelo menos nos meses de verão. Esta zona é apropriadamente conhecida como “a quinta” e tem a particularidade de estar integrada no actual centro da cidade.
Este vai ser o meu primeiro Inverno aqui, e de cada vez que refiro isto a alguém que está cá há vários anos costumo receber uma série de avisos e algum gozo sobre o que me espera. É que no Inverno as temperaturas chegam aos -40ºC e no final de Outubro já tivemos a primeira neve do ano!
O Canadá é um país de emigrantes. Até agora são pouquíssimas as pessoas que conheço que são verdadeiramente canadianas, nascidas no Canadá e descendentes de canadianos há várias gerações.
Isto resulta numa diversidade multicultural extraordinária, pelo que a integração na vida do país é bastante fácil e não tenho a sensação de ser visto como alguém que não pertence aqui porque a grande maioria da população não é nativa daqui. Ao andar pela rua vêem-se rostos de todo o mundo. No meu grupo de investigação não existe um único canadiano.
Esta grande diversidade cultural, e talvez também o clima rigoroso, faz com que as pessoas sejam bastante abertas e simpáticas. Em pouquíssimo tempo construí um grupo de amigos constituído por pessoas de todo o mundo (nenhum é canadiano…) que fui conhecendo nas mais variadas situações e são raríssimos os fins-de-semana em que não tenho um programa qualquer ou uma semana em que não tenha duas ou três noites ocupadas com actividades depois do trabalho.
Ricardo Couto