“O enfermeiro português é muito mais competente que o enfermeiro inglês e são os próprios a admiti-lo”

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Gazeta das Caldas
emigSara Oliveira
23 anos
Bombarral
Chelmsford – Inglaterra
Enfermeira
Percurso escolar:
Escola Básica e Secundária Fernão do Pó, Escola Superior de Enfermagem – Instituto Politécnico de Leiria

 

Do que mais gosta do país onde vive?
As condições de trabalho que me oferecem e a valorização profissional inerente à profissão de Enfermeira  tal como a possibilidade de subir na carreira, de poder facilmente investir na minha formação profissional. Para além disso, a multiculturalidade, sem dúvida. Inglaterra é um país muito rico em diferentes culturas e isso acaba por fazer com que os ingleses tenham uma mente aberta em relação aos imigrantes. É muito comum ir trabalhar e em toda a equipa médica e de enfermagem não existir um único profissional inglês.
O que menos aprecia?
Não querendo generalizar e baseando-me apenas na minha experiência profissional na área da saúde, posso dizer que Inglaterra é um país rico em recursos materiais mas que ainda precisa de investir muito na formação profissional. Já trabalhei num serviço especializado em demência e agora estou num serviço de cirurgia vascular e urológica. Em ambos os serviços os recursos materiais eram imensos. No entanto, em termos de qualidades de Enfermagem ainda têm muito a melhorar. O Enfermeiro português é muito mais competente que o Enfermeiro inglês e são os próprios a admiti-lo.

De que é que tem mais saudades de Portugal?
Das pessoas, sem dúvida. Costumo dizer que a minha vida profissional é em Inglaterra e a minha vida pessoal em Portugal. Acaba por ser uma dicotomia difícil de gerir. Faz-me muita falta sair depois de jantar para beber um café, faz-me falta a rotina portuguesa, a “boa vida” portuguesa. A minha adaptação pessoal a Inglaterra não tem sido fácil e tenho muitas saudades de chegar a casa e ter alguém com quem conversar, cara a cara. Todo o meu suporte pessoal, todos os alicerces que fazem de mim a pessoa que sou encontram-se em Portugal.

A sua vida vai continuar por aí ou espera regressar?
Quero muito regressar e planeio fazê-lo a curto prazo. Tem sido uma experiência fantástica e difícil ao mesmo tempo. Não tenho medo da mudança, a vida felizmente é recheada de surpresas. Por isso tento não pensar muito no futuro. Sei que um dia se estiver cansada de Inglaterra volto para Portugal. Nada é definitivo, a vida vai-se moldando às circunstâncias.

“A vida em Inglaterra é cara, mas a qualidade de vida é superior à de Portugal”

Terminei a licenciatura em Enfermagem em Julho de 2014 e no mês de seguinte tive uma entrevista de emprego para o hospital onde me encontro. Sempre disse aos meus pais que depois de me licenciar não queria voltar para casa, queria ter o meu trabalho, a minha vida e sobretudo a minha independência. Na minha cabeça voltar a viver com os meus pais era dar um passo para trás no ciclo natural da vida. No entanto era impossível ter esta independência em Portugal.
A ideia de ir para Inglaterra acabou por ser a escolha mais óbvia tendo em conta que o meu conhecimento da língua inglesa era razoável, as condições de trabalham iam de acordo ao que eu procurava e era um país suficientemente perto para me permitir vir a Portugal regularmente. Assim, em Agosto de 2014 passei na entrevista que me oferecia a posição de enfermeira num hospital central que alberga uma população alvo de nove milhões de habitantes. Muita burocracia à parte, em Outubro de 2014 voei para Inglaterra, tendo sido recebida no aeroporto por uma representante da agência de recrutamento que me contratou. Morei durante quatro meses nas residências do hospital e depois disso encontrei um espaço para mim no centro da cidade.
O meu horário são 37,5 horas semanais sendo que existem turnos de 7h, 8h, 14h30 e 10h30. Isto significa que na maior parte das vezes trabalho três turnos por semana.
Estou inscrita numa agência de enfermagem que trabalha em parceria com o meu hospital, podendo desta forma trabalhar alguns turnos extra e receber três vezes mais do que o que receberia num turno “normal”. É muito bom porque sempre que me apetece cometer alguma “loucura” (estou a referir-me a compras, obviamente) nem preciso de tirar dinheiro do meu ordenado. Basta-me trabalhar um ou dois turnos extra e tenho dinheiro suficiente para todos os gastos “não planeados”.
A vida em Inglaterra é cara, mas a qualidade de vida é superior à de Portugal. As rendas das casas são astronómicas, mas de resto não noto muita diferença em relação ao nosso país. Costumo de dizer que quem quer emigrar para Inglaterra tem que ter uma de três coisas: ou tem contrato de trabalho, ou tem pessoas conhecidas que podem ajudar, ou tem que ter mesmo muito dinheiro. Não se arrenda casa sem contrato de trabalho tal como ninguém dá emprego se não tivermos um sítio para viver.
É um país lindo, muito cinzento mas com uma certa magia. As pessoas são muito simpáticas e muito carinhosas. São um povo simples no sentido de relação pessoal. Os meus doentes são tratados na maior parte das vezes pelo primeiro nome e é bastante frequente tratarem-me por «love” (amor) ou “dear” (querida). Já perdi a conta aos cartões de agradecimento e às caixas de chocolate que os familiares dos doentes me oferecem. É bom esta valorização e este carinho especialmente num país que não é o nosso.

Sara Oliveira