ontem & hoje

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Postal Ilustrado, edição Pasaporte
Joaquim António Silva – 2013

 

 

 

 

 

A dezanove de Fevereiro de 1949, nascia nas Caldas da Rainha o seu primeiro centro comercial. Este edifício marcante, desenhado pelo arquiteto Camilo Korrodi, foi considerado na altura a melhor estação rodoviária do país, a mais luxuosa da Península Ibérica e uma das mais modernas da Europa. Em conjunto com a gare rodoviária abriu também um café, restaurante, sala de espera, bilheteiras, tabacaria e uma barbearia no centro de uma cidade com vida, bonita, com glamour, onde vinham a banhos pessoas de todo o país. Durante todo o dia, a “menina das partidas” anunciava aos altifalantes da estação as partidas e chegadas das camionetas no intervalo da música ambiente. A limpeza era impecável (havia um empregado, de fato de macaco e boné, que passava o dia a limpar os pingos de óleo do chão).

As fardas, obrigatórias. A exigência dos proprietários, implacável. Aos domingos à tarde atuava uma pequena orquestra no café, num palco construído para o efeito. Aos Capristanos ia-se passear ou ouvir música na garagem ou no café. No restaurante, um dos mais conhecidos e caros do país, a cozinha era esmerada e havia gente de muito longe que vinha de propósito às Caldas para almoçar ou jantar. Até um programa de rádio foi emitido a partir das oficinas. Um verdadeiro luxo para a época.
Na altura, Caldas da Rainha era uma cidade bonita, de comércio de excelência, com empresários à altura dos desafios que se lhes apresentavam.  Arthur Eduardo Capristano era um deles. Um homem do seu tempo, austero e duro. Começou a sua vida como mecânico (quando ainda pouco se falava em automóveis), mas cedo chegou a chauffer de D. Carlos. Criou a sua empresa no Bombarral (Capristano e Ferreira), sempre ligada ao transporte de passageiros, mas decidiu deixar o seu sócio e mudar-se para a cidade que desde sempre polarizava a região – Caldas da Rainha. Já com os seus filhos José e Artur, a empresa Capristanos foi um dos motores do desenvolvimento local e regional da época. Nos anos cinquenta, chegou a ter 450 trabalhadores. Nas Caldas, estavam os serviços centrais da firma, os escritórios e a oficina. A maioria dos antigos empregados refere o caráter austero do velho Arthur e o rigor da gestão dos filhos, mas vivia-se um bom ambiente de trabalho. Sérios, com visão estratégica empresarial e social apurada, criaram uma marca que ainda hoje é querida e citada com saudade.
Mas a empresa é vendida aos Claras em 19 de Dezembro de 1961 e é nesta altura que fecharam o escritório e a maior parte do pessoal passou para Torres Novas. Pena que o tempo e outros empresários tenham desfeito a sua criação, ou uma boa parte dela. O declínio da estação começou nesta época, e as sucessivas tentativas de revitalização têm sido evitadas ou adiadas até aos dias de hoje. As paredes, grafittadas, alteram por completo a aparência de um edifício que é património municipal.
No entanto, uma nova era começou no final do ano de 2012. Uma nova gerência na exploração do café e a vontade dos responsáveis da Rodoviária do Tejo conjugam-se para revitalizar finalmente um dos ícones das Caldas da Rainha. O café vai ser transformado, e o edifício vai ser, finalmente, pintado e reformulado. Esperamos que as nossas memórias se transformem em realidade e que possamos em breve voltar a ver, com orgulho, os Capristanos com o glamour dos velhos tempos…

Rui da Bernarda