
A pandemia levou à redução nas consultas, entre elas da diabetes, doença crónica que afeta 13,3% da população entre os 20 e os 79 anos
Todos os anos, Mara Marques, especialista em medicina geral e familiar e com área de interesse em diabetes e obesidade, organiza caminhadas, workshops de cozinha saudável ou sessões de promoção da saúde. Este ano a pandemia impossibilitou as ações, mas a médica não baixou os braços e organizou um evento online sobre a perspetiva histórica do Dia Mundial da Diabetes, nutrição e da importância do exercício na prevenção da doença.
Para além das alterações nas iniciativas de prevenção, a pandemia trouxe constrangimentos aos cuidados de saúde, sobretudo nos primeiros meses, quando a grande maioria das consultas de vigilância foram canceladas. “Alguns seguimentos foram feitos via telefone, mas muitas pessoas, infelizmente, viram as suas consultas e vigilâncias proteladas”, conta Mara Marques. A médica fala também de casos em que houve um “mau controlo da doença”, pelo sedentarismo provocado pelo confinamento.
A médica de família optou por contactar com os doentes maioritariamente por chamada telefónica e alguns via e-mail. “Fiz muitas consultas deste modo e a maioria recebeu bem esta alteração”. No entanto, e porque nada substitui a consulta presencial, logo que foi possível, estas foram restabelecidas. “Ainda me lembro das primeiras chamadas que fiz em tempos de pandemia e que do outro lado a voz do meu utente era de surpresa por ter a médica a ligar”, partilha, acrescentando que para muitos foi um importante apoio também do ponto de vista emocional. A também assessora para a prevenção e consciencialização acerca da diabetes no Lions Club reconhece que, devido ao confinamento e à diminuição da atividade física, muitos doentes poderão estar mais suscetíveis à diabetes, mas que também há quem se tenha motivado em apostar mais na saúde.
Novas formas de resposta
De acordo com a diretora executiva do ACES Oeste Norte, Ana Pisco, a pandemia trouxe novas formas de dar resposta aos utentes que necessitam de cuidados de continuidade. Assim, mesmo durante o confinamento, os serviços continuaram a acompanhar doentes crónicos (onde a diabetes se inclui) e, entre janeiro e outubro, foram efetuadas cerca de 33.750 consultas a utentes diabéticos, um número que difere em 7% relativamente ao período homólogo de 2019. De acordo com a responsável, foram agendadas telefonicamente as consultas presenciais, as quais se realizam em horários e espaços diferentes dos atendimentos aos utentes com doença aguda. “Contudo, e apesar serem espaços e circuitos seguros, alguns utentes continuem com algum receio de irem ao centro de saúde”, explicou.
Nos primeiros meses de pandemia a maioria das consultas de vigilância da diabetes foram canceladas ou adiadas
Os concelhos que integram o ACES Oeste Norte possuem taxas de prevalência da diabetes que se situam entre os 8,9% e os 9,7%. Também as unidades hospitalares do CHO têm registado um “ligeiro decréscimo em relação ao mesmo mês do ano anterior” ao nível da atividade assistencial a estes doentes. De acordo com a presidente do conselho de administração, Elsa Baião, alguns dos fatores que contribuíram para esta alteração prendem-se com a deslocação de alguns profissionais da área da diabetes para as áreas de tratamento covid-19, e com constrangimentos ao nível dos espaços, derivados da afetação de áreas ao tratamento dos doentes covid-19.
Até 30 de novembro tinham sido registadas 2.338 consultas médicas da diabetes nas três unidades do CHO, menos 619 do que em 2019.
No início da pandemia verificaram-se algumas desistências na comparência às consultas, por parte de “alguns doentes receosos”. No entanto, atualmente já “denotam uma maior confiança quando têm que se deslocar ao hospital para realizar análises, ou comparecer nas consultas ou nas sessões de hospital de dia, quando é dada essa indicação”, explica Elsa Baião.
O CHO manteve as consultas aos doentes portadores da diabetes, embora, na sua maioria, estas fossem não presenciais. A equipa tem realizado um acompanhamento telefónico ou por e-mail, sempre que possível, e nos doentes com melhor controlo metabólico. Também muitos doentes portadores de monitorização flash da glicémia (sensor Libre), descarregaram dados numa plataforma, que são visualizados pela equipa de saúde, e depois ajustada a terapêutica – insulina, quando necessário, informa.
Crianças com diabetes assistidas no CHO
As crianças diagnosticadas com diabetes inaugural já são acompanhadas no hospital das Caldas da Rainha do Centro Hospitalar do Oeste (CHO) para aprendizagem do tratamento da doença, em vez de terem de ficarem internadas no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
Desde o passado mês de junho que, para aprender a lidar com a doença, saber o que comer, a fazer a contagem dos hidratos de carbono a ingerir, ou injetar insulina, os diabéticos ficam no internamento de pediatria.
Esta é uma valência que traz vantagens para as crianças e para os pais, que deixam de ter de se deslocar diariamente, ou ficar durante vários dias, na capital, e que permite um acompanhamento por estas equipas.
“Antes as crianças ficavam em Lisboa em consulta e só vinham ao nosso hospital para eventuais compensações, o que não era benéfico para elas porque tinham que se expor a uma equipa que não conheciam”, explica a diretora do serviço de pediatria, Luísa Preto.
Agora, se tiverem algum problema “vão ter ao mesmo sítio onde estão a ser seguidos e são acompanhados pela mesma equipa”, refere a responsável, acrescentando que é-lhes disponibilizado um número de telefone para onde ligam sempre que têm dúvidas ou alguma dificuldade. “Há uma maior proximidade”, remata.
De acordo com aquela médica, a diabetes tem aumentado exponencialmente nas crianças nos últimos anos. “Há uns anos atrás tínhamos dois ou três casos, entretanto foi aumentando e desde dezembro de 2019 até agora já tivemos 12 casos”, referiu Luisa Preto, salientando que esta é uma situação que se verifica por todo o país.