Como morador nas Caldas, acérrimo defensor do caminho de ferro, e cidadão, achei por bem deixar aqui, e na sequência da entrevista dada pelo Sr. Administrador da CP, apenas algumas das muitas reflexões que já fiz sobre a matéria e sobre as questões que se prendem com a Linha do Oeste e com o transporte ferroviário no nosso país.
A primeira questão prende-se, no meu ver, com o ratio Kms percorridos/passageiros. Nunca vi, por parte da CP uma atitude “comercial”/competitiva nesse sentido. Tomemos por exemplo o que acontece em alguns países do mundo onde existe algo que se chama bilhetes familiares que se destinam a fomentar a utilização do transporte público. Estou a lembrar-me das linhas de suburbanos em redor de Perth onde por apenas 9 dólares australianos aos fins de semana uma família até quatro pessoas pode viajar numa coroa de cerca de 35 Km de diâmetro durante 24 horas em qualquer meio de transporte.
Na Bélgica, desde o fim de tarde de sextia-feira até Domingo inclusive, os bilhetes dos comboios regionais têm uma redução de 50%. Estamos a falar de distâncias que vão até cerca de 100 Km. É mais do que óbvio que se um bilhete das Caldas para Lisboa varia, desde os 7,65 euros nos Regionais até os 9,40 nos Inter-Regionais poucas famílias irão utilizar essa opção, para já não falar no tempo de percurso exagerado de 1 hora e 59 minutos para o percurso mais rápido, por comparação com – pasme-se! – as 1 hora e 38 minutos que levava a composição nº 4013 em 1954.
Nesta perspectiva, e em tempo de crise, o transporte rodoviário particular será muito mais económico Se estas questões fossem tidas em consideração, muito menos veículos circulariam nas nossas estradas, com todas as vantagens que em termos ambientais daí adviriam. Esta ideia foi ligeiramente aflorada pela antiga secretária de Estado dos Transporte, Ana Vitorino, mas única e exclusivamente em relação aos Intercidades e Alfas, mas, como tantas outras ideias, foi deixada na gaveta durante esta legislatura.
Se se conseguisse duplicar a lotação das actuais composições, haveria uma poupança ao nível ambiental, assim como reforçaria a chamada de atenção para tudo o que o comboio representa.
A segunda questão terá a ver com o princípio de que em qualquer país civilizado da Europa Ocidental existe uma ligação directa entre a capital e a periferia. No nosso caso, quem estiver a residir em Leiria ou Figueira da Foz tem de fazer pelo menos um transbordo. Por teórica que esta interrupção seja, há sempre um impasse/paragem mais demorada que aumenta o tempo da viagem. (…)
A terceira questão terá a ver com a filosofia de utilização da linha do Oeste. Desde há muito que esta deveria ter sido considerada como uma variante à linha do Norte. Se se constroem auto-estradas paralelas (nomeadamente a A29 e a A1), tendo sido aprovada recentemente a terceira auto-estrada Lisboa-Porto (auto-estrada do Pinhal Interior), por que não utilizar a mesma política para com a Linha do Oeste, à semelhança do que se faz na Alemanha como as circulações nas duas margens do Reno?
Se esse princípio tivesse sido posto em prática, ter-se-iam já retirado da Linha do Norte muitas das composições de mercadorias, particularmente no percurso onde entronca com a Linha da Beira Alta – diminuindo a amálgama de circulações numa só linha – Mercadorias, Regionais, Intercidades, Alfas Pendulares etc. com todas as vantagens que dai se extrairiam.
Como última questão, o comentário do Sr. Administrador da CP relativamente ao não ser necessária a renovação do material circulante. Em parte concordo que, por força dos inúmeros cruzamentos, a melhoria no material circulante traria poucos benefícios. No entanto, se se funcionasse em CTC (Comando de Tráfego Centralizado) e não por cantonamento telefónico, talvez se conseguisse que os tempos de espera nos cruzamentos fossem menores.
Por outro lado, as composições que aqui circulam (série 450) são obsoletas. Provêm das antigas 400, construídas em 1968 pela saudosa Sorefame e apenas lhes foi instalado o ar condicionado e um novo sistema de travagem. Os motores são os mesmos, já cansados, o que no pino do Verão, com o ar condicionado ligado, se traduz numa redução significativa na aceleração. Circulações eléctricas resolveriam este problema ou quiçá algumas automotora Camelo recentemente alugadas à Espanha.
Numa última palavra urge, no âmbito das promessas feitas com o intuito de indemnizar esta região pela não construção do aeroporto da Ota, no mínimo duplicar e electrificar a linha do Oeste, criar a dita variante Malveira-Lisboa, para que se reduza significativamente o tempo de percurso para Lisboa e se consiga competir com a rodovia. Só assim conseguirá esta região desenvolver-se economicamente e reforçar a notoriedade que a história desde há muito já lhe conferiu.
António Cabrita
Porque desde há muito me interesso pelas coisas dos comboios, achei o artigo muito interessante. Fui passageiro diário no troço Entroncaento/Lisboa durante alguns anos e apercebi-me nitidamente do desprezo que, nessa altura, já estavam a votar à Linha do Oeste. Mas nesses tempo, mesmo assim, quando havia acidentes graves na Lina do Norte, a do Oeste servia sempre de alternativa para os comboios de longo curso para o Porto. Hoje penso que, lamentavelmente, seria impensável tal operação.
Admiro-me como é que o pessoal do Oeste deixou chegar a sua Linha ao estado a que chegou. Como também me admiro, já que a CP nunca teve vistas largas, que nunca tivesse sido pedida a ligação ferroviária das Caldas ao Entroncamento que abriria a possibilidade de contactos mais fáceis entre o litoral e o interior. De qualquer forma parabens pelo artigo.
Tirem daí o sentido. A linha do Oeste só é rentável entre Lisboa e Caldas/Alcobaça.