PS/ÓBIDOS – Trabalhar na Óbidos Criativa pode não ser compatível com ser deputado municipal

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A Gazeta das Caldas publicou uma notícia intitulada “Trabalhar na Óbidos Criativa é compatível com cargo de deputado municipal”. A notícia surge após a Assembleia Municipal de Óbidos de 27 de junho, onde foi apresentado um parecer jurídico da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR LVT), sobre “a eventual existência de incompatibilidade e ou impedimento no caso de um membro da Assembleia Municipal de Óbidos exercer funções em regime de prestação de serviços na Empresa Óbidos Criativa – EM, deste Município, cujo capital é totalmente detido pela Autarquia”.
O dito parecer conclui: “ante o exposto, afigura-se-nos que não se verifica incompatibilidade e ou impedimento legal ao exercício de atividade em regime de prestação de serviços, por parte da Assembleia Municipal de Óbidos, na Empresa Óbidos Criativa – EM “.
Ora, porque os leitores merecem ser totalmente esclarecidos, entendemos nós, vereadores do PS na CM de Óbidos, que tal parecer é legítimo, é respeitável, mas que merece contestação jurídica evidente.
Esta matéria é regulada pela Lei 29/87, de 30 de junho, vulgo Estatuto dos Eleitos Locais (EEL).
A jurista da CCDR LVT recorreu ao citado EEL, mas não leu nem apreciou o disposto na alínea e) do nº 2 do artigo 4º:
“No exercício das suas funções, os eleitos locais estão vinculados ao cumprimento dos seguintes
princípios: (…) 2) Em matéria de prossecução do interesse público: (…) e) Não celebrar com a
autarquia qualquer contrato, salvo de adesão; (…)”.
O que a lei diz, sem qualquer dúvida, é que um eleito local, vereador ou deputado da assembleia de freguesia ou da assembleia municipal, não pode celebrar nenhum contrato, exceto de adesão (de fornecimento de água, por exemplo), pelo que o deputado do PSD em causa não podia, e não pode, depois de eleito, celebrar um contrato de prestação de serviços com a Óbidos Criativa, que é detida a 100% pela Câmara Municipal.
Aliás, este entendimento tinha já sido subscrito por um outro parecer jurídico da mesma CCDR LVT (parecer n.º 39 / 2010), onde se sustenta que “(…) relativamente às incompatibilidades, estabelece, de modo expresso, a subalínea v) da alínea b) do artigo 4º do Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei nº 29/87, de 30 de Junho e republicado pela Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro que, no exercício das suas funções, os eleitos locais estão vinculados ao cumprimento de vários princípios, designadamente, em matéria de prossecução do interesse público; não podendo celebrar com a autarquia qualquer contrato, salvo de adesão.” Conclui esse parecer jurídico de 2010 o seguinte: “.Em face dos preceitos supramencionados parece-nos não ser legalmente admissível a acumulação das funções de membro da assembleia municipal e prestador de serviços para a câmara municipal do mesmo município.”
Primeira conclusão a este respeito: parece, afinal, que trabalhar na Óbidos Criativa pode não ser compatível com cargo de deputado municipal.
É ainda oportuno, a este propósito, consultar a Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, que prevê as inelegibilidades a que estão sujeitos os eleitos das autarquias locais. As inelegibilidades, determinam não só a impossibilidade de ser candidato aos órgãos do poder local, como também podem originar a perda de mandato se o autarca, posteriormente à eleição se colocar numa situação que o torne inelegível (inelegibilidade superveniente). O que manifestamente parece ter acontecido no caso em apreço. Não estava impedido quando foi eleito, mas agora está!
Segunda conclusão: o deputado do PSD em causa pode perder o seu mandato por ter assinado um contrato de prestação de serviços com a Óbidos Criativa.
Por último, Julgamos não ser preciso ser jurista para perceber a incompatibilidade em apreço: quando o deputado do PSD intervém e vota na Assembleia Municipal, está a representar quem e a defender o quê? Os eleitores que o elegeram e os interesses coletivos da população, ou está a representar-se a si próprio e a defender os seus interesses pessoais enquanto prestador de serviços? Temos muitas dúvidas, e foi por elas que julgámos oportuno esclarecer os leitores da Gazeta das Caldas, e foi por elas que solicitámos esclarecimentos jurídicos junto da CCDR LVT, o que continuamos a aguardar.
Paulo Gonçalves
Vítor Rodrigues
Vereadores do PS