Foi bonita a festa. Muito bonita! Teve foguetório e luminárias, arranjos florais do mais fino gosto, arruamentos acabados à pressão, discursata a condizer com impecáveis nós de gravata, cavalos a correr, meninas a bailar, tudo para festejar com requinte o dia da urbe, que dantes era o do pau pintado.
Em tempos que já lá vão era a ocasião em que os caldenses se deslocavam ao Hospital Termal (esse mesmo sobre o qual um organismo da tutela considera possuir uma «denominação enganosa») para assistir à cerimónia em que o administrador hospitalar abria oficialmente a época balnear termal. Administração essa que honrava então os seus compromissos, em exercícios de gestão responsável, pagando atempadamente cauções de exploração das águas e análises regulares destas, contrariamente ao laxismo da actual, enredada nos seus premeditados preconceitos, e que se vai eximindo à missão que lhe está confiada, utilizando como pretexto as infelizes declarações de um desastrado secretário de Estado que tem o topete de achar que o Hospital não faz parte do «core business» (encantadora expressão!) do Ministério da Saúde.
Mas a festa foi bonita. Tratou-se do arranque oficial da pré-campanha propagandística do Partido do Primeiro-Ministro, em que Sua Excelência se dignou estar presente e aproveitou o balanço para, de passagem e com seguranças à Hollywood, presidir à condecoração do ex-Edil Mor que, por mero acaso, é o chefe da estrutura distrital partidária laranja. Há até quem, pensando nestas duas figuras juntas nas Caldas da Rainha, não deixe de recordar que da última vez tinha sido um a retirar o microfone ao outro, cortando-lhe cerce e imperiosamente a palavra. Mas o que lá vai, lá vai e desta vez até veio medalha e tudo!…
E a festa que bonita que foi! Não teve passadeira vermelha, o que foi uma pena, mas teve oração laudatória, teve mérito cultural para outras lides e outras fitas que não as da companhia teatral profissional residente que até já foi prémio de crítica especializada pelo «conjunto da obra» mas que, ignorada aos 20, esquecida aos 25, teve de contentar-se em ser destacada pelo acumular de 30 anos de uma dedicação pública nunca enjeitada, teve diplomas e caixinhas com a distinção entregues sobre almofada aveludada, cousa que, convenhamos, confere sempre um certo «chic».
E ficaram-se a conhecer alguns aspectos relevantes, a saber: afinal há dinheiro (5 milhões arrecadados e postos de lado, segundo o ex-Edil Mor, não desmentido pelo seu sucessor) para intervir no Hospital Termal; a transferência da concessão das águas pode demorar dois anos (o homenageado dixit; também disse, sob a forma de insinuação, que quer manter o direito de pernada sobre as obras de iniciativa municipal no concelho, mas isso são contas de outro rosário); que os autarcas criticam frontalmente a desinformação do Ministério da Saúde sobre o Hospital Termal (não se percebendo pois porque não curaram esses mesmíssimos autarcas em prestar esclarecimentos eficazes ou porque aceitaram, submissos logo à partida, as opiniões condicionantes e restritivas expressas oralmente por um Director-Geral, sem nenhum tipo de força legal); que o apetite privatizador cujo favorecimento, num primeiro momento, se garantia nunca, jamais, em tempo algum seria contemplado, pouco a pouco e passo a passo, vai marcando terreno; e, por fim, que o Primeiro se confessou ingénuo por ter visitado as Caldas sem vir preparado para uma discussão sobre o Hospital Termal (aliás, que importância é que esse mero detalhe, um pormenor de somenos portanto, poderá ter, não é verdade? Trata-se apenas do elemento fundador da cidade e o seu principal motor económico, facto que o último relatório clínico conhecido, apesar de referente tão só ao curto período de funcionamento do Hospital antes do seu encerramento, acaba por confirmar abundantemente).
Tudo informações de muito proveito e virtude, como se constata.
E lá que a festa foi bonita, lá isso foi. Muito bonita! Teve foguetório e luminárias, arranjos florais do mais fino gosto, a presença de Sua Excelência, O Primeiro, discursata a condizer com impecáveis nós de gravata…
José Carlos Faria
jcrffaria@gmail.com