Foi em 2016 que o Caixa Negra entrevistou Dora Mendes no âmago do seu trabalho. Uma surpreendente tranquilidade e otimismo que são fruto da sua maturidade invadiam a voz da entrevistada. Não há certezas em relação à sua visão sobre a cultura da cidade, nem tão pouco a cultura de Caldas da Rainha é um mundo de certezas. Talvez não as queiramos, pois é da incerteza que nasce a necessidade de construção no caminho da plenitude. “The role of uncertanty is the way to creativity”, dizia Juhani Pallasmaa no ultimo Fólio, quando na Torre dos Maneis dava a sua palestra sobre a criatividade na cidade, pois quando alguém está certo de algo a busca termina, no entanto se a incerteza é permanente, o espirito humano procura atingir respostas para todo e qualquer processo intelectual, dizia o filósofo. Do ponto de vista de um arquiteto, urbanista e humanista, esta visão tem algo que se assemelha à crescente atividade cultural de Caldas da Rainha. Dora Mendes explicava que este fenómeno algo inquietante, tem nas Caldas da Rainha um papel que serve o cidadão, e entrega a este território uma fervilhante e sempre constante permanência de ações culturais, e que exatamente pela liberdade existente na comunidade, liberdade que sempre existiu, e que as entidades Municipais muito apoiam, a atividade cultural que se rodeia de uma certa incerteza, é aqui um fenómeno, que entre os vários nichos que vão desde o mais underground ao mais clássico, resulta numa oferta eclética e diversificada. Nas Caldas da Rainha convive-se com instituições variadas que apoiam todos os eventos aqui organizados, resultando numa panóplia de cores, que em muitos poucos locais de igual dimensão existe ou poderá existir.
A capacidade de suportar a incerteza que é muitas vezes vivida pelos atores culturais locais da cidade, é o fruto da qualidade que aqui vivemos. Dora Mendes como atora cultural local, é uma das personagens fundamentais e incontornáveis desse processo, pois no domínio da riqueza que existe neste território, é também ela uma pensadora que procura respostas, e nessa procura acaba por ser responsável por projetos que já tiveram e ainda têm um pouco da sua sabedoria local e otimismo. A incerteza e o otimismo, que alguns de nós poderão apelidar de fé, é para a maioria dos arquitetos como Juhani Pallasmaa, um sintoma do seu tempo, no qual, o seu professor e mentor universitário se gabava de entregar os seus projetos de arquitetura com 5 anos de atraso. Poderia ser possível numa sociedade anterior à II Grande Guerra Mundial, proceder dessa forma, sem pressa e sem a necessidade de fechar um contrato de condomínio que posteriormente é entregue a um promotor imobiliário para venda. “VENDE-SE” é o foco de cada arquiteto dos dias de hoje, pois sem essa venda os seus honorários também não serão pagos. No entanto e porque existe um arquiteto em cada um de nós, e em especial nas Caldas da Rainha, a maioria dos projetos culturais não têm um valor de mercado, tão pouco têm preço de bilhete e tão pouco têm um fim à vista. À conversa com a “arquiteta cultural” Dora Mendes, e ainda com saudades dos mercados criativos do Verão de 2014, é com ilusão que ainda se espera que um dia poderão voltar a acontecer.
Os “arquitetos culturais” desta cidade, são todos eles movidos pela paixão ou carolice, como Dora apelidou, e por isso mesmo existe a Fé de um dia eles regressarem à cidade, pois nenhum deles é movido pela necessidade de vender um projeto, nesta cidade sem condomínio onde tudo acontece mais devagar.
Dora Mendes poderá ser encontrada facilmente nas redes sociais, onde ela é a otimista que sempre acredita no impossível.