Era uma vez… A manta de retalhos

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Gazeta das Caldas - Era uma vez
Beatriz Lamas Oliveira

Era uma vez uma menina, a quem a Mãe perguntou se queria uma manta de retalhos. A menina Tizinha, era esperta e rápida perguntou:
– E quem vai costurar os retalhos?
Surpreendida, a mãe, que estava a descascar ervilhas, parou de trabalhar, levantou a cabeça, olhou a filha e perguntou:
– Costurar? Mas a manta já está pronta! Está na loja, na montra. É muito colorida e quentinha.
– Ah! Disse a curiosa Tiza, já a pensar noutra direção. Então e quem escolheu os tecidos para compor a manta?
A Mãe já conhecia as habituais correntes contínuas de perguntas da menina. Recomeçou a fazer saltar as ervilhas da casca e continuou a conversa:
_ Não sei quem escolheu os diferentes tecidos, mas vi que todos os retalhos têm tons de verde e de rosa. As cores estão muito bem combinadas.
– E não perguntaste à dona da loja quem coseu a manta?
Sorriso materno. Ser Mãe era aprender um jogo de paciências!
– Não perguntei, mas posso perguntar. É costume as pessoas guardarem restos de tecidos de roupas variadas que já não usam, depois vão cortando quadrados, todos do mesmo tamanho, vão juntando e juntando, até ter bastante material, para compor a manta!
– Mas tens de perguntar, Mãe! Eu imagino que deve demorar muito tempo, para uma pessoa conseguir assim tantos quadrados, só a cortar tecidos que sobraram, apenas numa casa, quer dizer, numa família! Se calhar a pessoa que fez a manta pediu tecidos às amigas, não achas?
A Mãe deixou escorregar duas ervilhas saltitantes e enxugou o suor da testa.
– Estás a suar, Mãe? Mas não está calor.
– Tiza! Lembrei-me que, para eu ter estas ervilhas para o jantar, foi preciso alguém escolher as sementes,preparar a terra,estrumar e semear. Depois ir vendo as plantinhas verdes a crescerem. Depois as plantas abrem em flor. E da flor sai a vagem com as ervilhas dentro. É preciso apanhá-las. Isso já são quatro meses de trabalho! Depois vendê-las! E agora eu aqui a descascar!
Até me parece que estou a fazer uma outra manta de retalhos, porque, de repente, isto quase é uma vertigem, da semente até à ervilha, a cair como uma manta verde de sopa apetitosa, nos nossos pratos!
-Mãe! Que lindo isso que disseste agora no fim. Sabes, a minha professora disse que essas frases assim, que parecem uma história, e soam como música, se chamam poemas.
-Oh! Estás a dizer que eu sou poetisa?
– Pois, se calhar és Mãe! Se calhar, já disseste muitos poemas, mas, como eu ainda não tinha ouvido a professora a explicar do efeito da música nas palavras, nunca to podia ter dito!
– Obrigada, Tiza, o teu Pai vai ficar muito orgulhoso por ter uma poetisa desconhecida em casa!
-Tenho a certeza de que ele vai gostar! Não te preocupes, Mãe. Eu explico-lhe tudo, quando ele chegar.
Tiza inspirou e fez uma pausa:
– Mas, e ,oh Mãe, voltando à manta de retalhos. Tu pensas que leva mais tempo, desde escolher as sementes até comermos as ervilhas ao jantar, ou levará mais tempo a colecionar os retalhos de tecido, compor as cores e costurar?
– Desta vez não sei mesmo responder, Tizinha. Parece-me é que, aquela manta que está na loja, ficava mesmo bem sobre as minhas pernas, a aquecer-me, quando estou a tricotar!
– Pois é, Mãe! e quando a manta te aquecer as pernas, eu aproveito, conto os quadrados, meço-os e peço à professora que me ajude a calcular quanto tecido lá está!Não te preocupes com nada e compra a manta para ti!
A Mãe da Tizinha, agradecida, continuou a descascar ervilhas, verdes, roliças, para o jantar.
E a Tizinha pensou:
– Porque é que a Avó Gabriela diz que até parece que eu nasci numa taça de champanhe?

Beatriz Lamas Oliveira
blamas599@gmail.com