Cristina Soares
consultora de comunicação de ciência
Há dias, durante um debate a que assisti, um dos intervenientes queixou-se da falta de espírito crítico das gerações mais novas. Afirmação que foi apoiada por quase toda a mesa de debate. E eu fiquei a pensar (e a suspirar um bocadinho, confesso) em duas coisas:
Primeiro que, infelizmente, a falta de espírito crítico não é um exclusivo das gerações mais novas. Eu diria até que é algo transversal à humanidade e exclusivo de muito poucos. Se assim não fosse não teríamos negacionismo, racismo ou outro tipo de descriminação nem teríamos queimado na fogueira mulheres às quais chamámos bruxas.
Segundo, todas as gerações dizem uma de duas coisas sobre as gerações mais novas: ou que estão perdidas, ou que são os novos messias que irão salvar o mundo. Nós dizemos isto dos nossos filhos, os nossos pais disseram-no sobre nós, os nossos avós disseram-no sobre os nossos pais e assim sucessivamente, até provavelmente chegarmos ao Paleolítico. Onde provavelmente um pai se terá queixado que agora as novas gerações eram umas preguiçosas que já não caçavam mamutes, dedicando-se ao vandalismo da propriedade pública, a que mais tarde chamaríamos pintura rupestre. Aliás, há registos de que no antigo Egipto e na Roma Antiga os mais velhos se queixavam de que as novas gerações estavam perdidas. Pelos vistos enganaram-se, dado que chegámos até ao século XXI através de sucessivas gerações perdidas. Mas também o fizemos sem que nenhuma delas tivesse salvado o mundo.
Não há gerações piores nem melhores. Há pessoas, simplesmente pessoas, em circunstâncias e contextos sociais e tecnológicos diferentes, os quais levarão, obviamente, a respostas diferentes. Um miúdo que foi criado com um Iphone ou um tablet na mão terá uma resposta diferente aos desafios que o mundo lhe apresenta, da de alguém, como eu, que cresci a rebobinar cassetes com canetas BIC e com apenas dois canais de televisão.
E o segredo para a coisa correr bem, parece-me, talvez seja juntar as diferentes gerações, em vez de as apartar em trincheiras. Juntar quem, por tudo o que viveu, sabe que o tempo é a variável decisiva em qualquer processo de mudança, com a garra de quem ainda acredita que podemos tudo, basta querer. Afinal, se por um lado “sangue na guelra” sem sabedoria acaba em vã inconsequência, qualquer sabedoria sem viço na alma, mirrará e definhará em desilusão. ■