Amélia Sá Nogueira
socióloga e ceramista
O discurso pessimista tomou conta do nosso quotidiano. Nas redes sociais, nos debates políticos, nas conversas banais, as temáticas variam pouco ou nada. Lá longe na Ucrânia vive-se uma guerra destruidora de vidas e de sonhos. De forma quase egoísta uns amigos vindos diretamente da Alemanha verbalizaram estas simples palavras que caíram como uma pedra sobre as nossas felizes vidas de paz “desde de que chegamos a Portugal foi como se a guerra tivesse acabado”. A guerra, como quase tudo na vida, depende do nosso lugar de observação. Dentro ou fora. Perto ou longe. À guerra junta-se, a pandemia, a inflação, o preços dos combustíveis, o preço dos bens alimentares, a seca, a crise ambiental, a pobreza, o populismo, o fanatismo, o negativismo. Tema de várias correntes de pensamento o debate entre a visão pessimista por oposição à visão otimista da realidade, tem conduzido ao longo dos tempos a diferentes perspetivas face à evolução das sociedades humanas. No centro desse debate surge o conceito de desenvolvimento sustentável que apela na sua essência a uma mudança de estilos de vida em sociedades ditas desenvolvidas, de modo a que o seu impacto não comprometa o futuro das gerações vindouras. O mais recente relatório das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano com o título “Tempos incertos, vidas instáveis: Construir o futuro num mundo em transformação”, não deixa margem para dúvidas. O quadro apresentado é dos mais pessimistas dos últimos tempos, com indicadores que apontam para um retrocesso face a aspetos como a esperança média de vida, a educação ou o aumento das desigualdades sociais. O paradigma presente rege-se pela incerteza. A pedra de toque, o mecanismo capaz de travar esta onda de destruição está na mudança individual, na consciencialização, na responsabilidade coletiva. Solidariedade e criatividade são palavras que surgem como apelo na conclusão do relatório das Nações Unidas. Mas tal como na guerra, a nossa atuação depende do nosso lugar de observação. A Alemanha e a França preparam as mantas para um inverno que se prevê frio com a introdução de medidas de poupança de energia. No Reino Unido ouvimos pelas notícias crianças a irem para a escola com fome. Em Portugal, sugerem que optemos por fontes de energias renováveis e, muito embora o país seja um dos mais bem preparados na produção de energia através de fontes alternativas, continuamos a ter as casas menos confortáveis, mais frias e menos preparadas.
Levemos à letra as palavras de Gramsci “contra o pessimismo da razão, o otimismo da prática”.