Praças e mercados
As redes sociais têm hoje uma importância significativa nas nossas vidas. Vem isto a propósito de uma iniciativa na rede social mais popular do planeta, não me recordo agora se no formato de um evento ou de uma página temática, em que um caldense lança a iniciativa de solicitar por esta via a uma revista americana que considere a nossa Praça da Fruta como um dos mais importantes, belos, significativos ou emblemáticos mercados diários do mundo e ao ar livre. A iniciativa em si nada trás de mal ao mundo e nada me move contra ela. Mas convenhamos que é um gesto ingénuo e inconsequente. Ou alguém pensa seriamente que uma revista do calibre da USA Today se deixa influenciar na sua linha editorial por um pequeno grupo de uma qualquer cidade de província numa rede social…
Esta crescente mania das listas e dos rankings, agora muito populares na imprensa internacional, a propósito de tudo e de mais alguma coisa, veio trazer alguma visibilidade a certos temas e fenómenos que se vêem depois ampliados pelas tais redes sociais, ao ponto de nos virem confundir a leitura do real. Para a Praça da Fruta e para as Caldas da Rainha talvez fosse importante aparecer numa desses listas dos melhores mercados do mundo, mas para isso não basta fazer um movimento online. Antes disso é preciso trabalhar muito para que essa nomeação seja merecida e credível, e portanto assumida por uma publicação internacional de referência.
Todas as grandes cidades têm praças e mercados de frescos de referência. Quase todos – senão mesmo todos – cobertos. E na sua grande maioria em recintos fechados. No campo de mercados ao ar livre arriscamo-nos e vermo-nos listados em companhia de países e cidades do terceiro mundo de que ninguém ouviu falar, e em grande parte até talvez seja melhor nem ouvir falar. Não quero com isto dizer que a nossa Praça da Fruta não tenha o seu valor. Antes pelo contrário: a Praça da Fruta é hoje o lugar mais genuíno e emblemático de Caldas da Rainha. A nossa identidade como território e comunidade está ali vertida diariamente no burburinho matinal entre os que compram, os que vendem, os que trabalham, e os que apenas se passeiam.
Recordemos para melhor entendermos esta realidade que a Praça é talvez o último sobrevivente patrimonial e identitário do que foi Caldas no último século. Com a indústria cerâmica e o termalismo moribundos, resta-nos a Praça da Fruta, num município com cerca de 60% do seu tecido empresarial ligado à agricultura, de acordo com os dados dos últimos censos. Apesar desta realidade ser sobejamente conhecida, a dificuldade de agir institucionalmente sobre ela prevalece. Em sede de Orçamento Participativo foi aprovado um projecto para lançar a marca Praça da Fruta que a CMCR por incapacidade própria não consegue fazer avançar. Um projecto simples para dotar a Praça, e os que aí fazem pela vida diariamente, de uns quantos instrumentos de marketing e ferramentas de comunicação que os colocasse em menor desigualdade com as grandes superfícies. Que lhe trouxesse a capacidade de se afirmar e promover a produção local com outra imagem, atraindo mais clientes, renovando-se e rejuvenescendo-se tanto na oferta como na procura e até como destino turístico que as tais listas online tanto promovem por esse mundo fora.
Se esse trabalho de qualificação não for feito não há lista ou ranking online que nos valha. Mesmo que aconteça essa publicação, será como a história da pirâmide de cavacas revisitada, nos tempos em que o que interessava (…) era aparecer no Guiness Book de recordes: É uma brincadeira gira na altura, mas dai não resulta nada para futuro.
Lino Romão
linoromao2.0@gmail.com