Mágui Lage
Secretária-Geral do Volt Portugal, Engenheira de Energias Renováveis
Ninguém se pergunta se um bebé é curioso, todos sabemos que sim, daí a extrema preocupação que os pais têm nos primeiros anos de vida de uma criança. Tudo o que querem é experimentar, brincar e aprender com o mundo exterior.
Todos sabemos que para além de comerem e dormirem, durante as horas em que estão acordadas, as crianças procuram constantemente perceber o que acontece com as suas ações. Seja a correr atrás dos pássaros, a chapinhar nas poças de águas ou até a querer tocar em objetos quentes. Aquilo que tentam fazer é ver o que acontece a seguir, simplesmente porque a curiosidade é algo que é inato a todos nós.
Mas o que acontece a essa curiosidade? Será que nós adultos ainda fazemos as tais perguntas “básicas” que muitas vezes ainda estão por responder?
À medida que vamos crescendo, que entramos na escola e que começamos a nossa formação, parece que ao longo dos anos essa curiosidade vai se desvanecendo, tornando-nos adultos conformados com aquilo que existe e muito pouco críticos sobre toda a informação que ingerimos. Num mundo em que nunca foi tão fácil aceder à informação e procurar respostas às nossas perguntas, o sentido crítico é o filtro que todos precisamos para realmente conseguirmos evoluir e resolver problemas.
No entanto, não acho que sejamos suficientemente ensinados nas escolas a sermos críticos, seja através de um resultado que obtemos num exercício de matemática, ou mesmo relativamente ao conteúdo que absorvemos dos professores. Simplesmente assumimos que tudo o que nos dizem é verdade.
Acho que é bastante óbvio que o modelo educacional, não apenas em Portugal mas no mundo inteiro, está completamente desajustado às necessidades do mercado de trabalho e está na realidade focado na produção em “massa” inspirado na Revolução Industrial.
A educação é a base de uma sociedade civilizada. É através da educação que preparamos os jovens para resolver os problemas que nós ainda não conseguimos antecipar. Se pensarmos bem nisso, uma criança que entrou no 1º ano este ano irá fazer 12 anos de ensino obrigatório e possivelmente mais 5 de Ensino Superior e nessa altura terá de estar preparado para resolver problemas que surjam em 2040. Teremos alguma ideia que problemas serão esses?
A verdade é que o futuro é muito imprevisível. Alguém que nasceu nos anos 50 e que via pela primeira vez televisão a cores, nunca iria imaginar que 60 anos depois, estaríamos a criar programas de inteligência artifical ou que tivéssemos robôs da Boston Dynamics a fazer danças ao som de músicas do Sharif Dean.
Estamos cada vez mais perto de uma época em que quase a totalidade das profissões podem ser robotizadas. O que vamos fazer nessa altura? Quais serão realmente as características importantes para termos de modo a diferenciar-nos?
A verdade é que o pensamento crítico e a criatividade serão a resposta a esta pergunta. Estaremos nós a ser formados de modo a conseguirmos pensar “fora da caixa” e trazermos soluções inovadoras para os problemas do amanhã?
Grande parte de encontrar essas soluções, de sermos criativos e de sermos originais prende-se com a vontade de arriscar e com o facto de não termos medo de errar.
Os adultos, em geral, têm medo de estarem errados, têm medo de colocar perguntas “estúpidas” e têm medo do que os outros vão pensar se disserem algo que não faça sentido. Mas as crianças não. Esse medo não nasce connosco, é algo que nos é incutido ao longo do nosso percurso. Temos hoje sistemas de ensino em que errar é a pior coisa que podemos fazer e acabamos por educar cidadãos em que as suas capacidades criativas são completamente negligenciadas.
Por outro lado, se olharmos para uma turma de 25 alunos, todas essas 25 pessoas têm perfis diferentes, capacidades diferentes e tendências para gostar mais de umas disciplinas do que outras. No entanto, aquilo que acontece é que tratamos estes 25 alunos de forma igual, normalizamos a turma e acabamos por não aproveitar as capacidades individuais de cada um.
Isto pode ser visto com a seguinte analogia: fazermos uma corrida com um pássaro, uma lebre e um peixe. Cada um destes animais têm competências diferentes, o pássaro sabe voar, a lebre sabe correr e o peixe sabe nadar, mas se os avaliarmos a todos com base numa corrida, claro que o pássaro e o peixe vão perder, porque aquela não é a forma correta de exponenciar as suas capacidades.
Mas afinal, como seria possível fazer isto? Como poderíamos nós exigir aos professores uma aprendizagem individualizada quando, para começar, esta é uma profissão que está extremamente desvalorizada?
Acho que o primeiro passo para haver uma mudança é haver consciência destes problemas. Tanto do lado de como o ensino está estruturado e a falta de resposta que está a dar à forma como educamos e desenhamos os nossos programas, como da forma como tratamos os profissionais que estão na linha da frente a educar os jovens.
Consequentemente, poderíamos pensar numa abordagem de ensino mais interdisciplinar onde fosse possível aprender como as várias descobertas contemporâneas foram feitas e os pontos de ligação entre as mesmas.
Este tipo de ensino foi feito no Japão no início dos anos 2000 e é conhecida como a “aprendizagem modular integrada”. Foi testado em algumas escolas secundárias e fez parte das reformas educacionais mais amplas do Japão, que tiveram como objetivo promover a aprendizagem interdisciplinar e abrangente. O foco estava precisamente no desenvolvimento do pensamento crítico, da criatividade e das habilidades de resolução de problemas dos alunos, através da conexão dos conteúdos de várias disciplinas como matemática, ciência e física e como estas disciplinas estão interligadas.
Poderíamos pensar se não faria sentido, numa altura de tamanha digitalização e acesso à informação, modernizar as nossas escolas de modo a que a experiência pessoal insubstituível das escolas tivesse o resultado que todos precisamos: jovens críticos e preparados para o futuro.