Viragem obrigatória à direita

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Na altura em que esta crónica for publicada, já é conhecido o nome do partido político que vai governar a Província do Québec nos próximos quatro anos. Como referimos anteriormente, os únicos grupos partidários com hipóteses de ganhar as eleições, são o Partido Québécois (Quebequense), PQ, a Coligação para o Futuro do Québec, CAQ, com apenas alguns meses de existência (como seria refrescante para a relativamente jovem democracia portuguesa aparecer algo semelhante, depois da tentativa falhada daquele senhor da AMI), e obviamente, o partido que dirige actualmente a província, o Partido Liberal do Québec, PLQ.
O primeiro grupo mencionado, já esteve no poder durante várias legislaturas. Lembramo-nos duma forma muito especial do primeiro período de governação do PQ. Tínhamos acabado de chegar a estas paragens em 1976. A nossa juventude da época, aliada a uma personalidade salpicada de tons romântico idealistas e uma grande identificação, muito por influência daquela que viria a ser a nossa companheira nesta longa caminhada, com os mais influentes membros da classe artística, (sempre prontos para estarem do lado das revoluções….) criaram em nós um sentimento de relativa simpatia por aqueles representantes dum povo, que na sua própria terra, era marginalizado pela classe dirigente. Uma minoria anglófona, dirigia uma maioria francófona. A mesma ideia de povo colonizado que tínhamos acabado de conhecer, durante os doze meses que passáramos em Angola entre Outubro de 1974 e Outubro de 1975. Não nos referimos aqui aos povos das primeiras nações, pois não é deles que estamos a tratar.
Segundo o artigo primeiro dos estatutos do PQ, a razão da sua existência é a luta pela independência do Québec através do voto democrático. Ideologicamente fazem parte do partido, uma mescla de individualidades, que vai da esquerda liberal até ao centro direita. A Coligação para o Futuro do Québec, CAQ, foi fundada há alguns meses por um dissidente do Partido Quebequense onde deteve entre outros a pasta da Educação, e que, por via da nossa vida ligada às viagens, conhecemos do tempo em que a partir duma pequena Agência de Viagens e financiado por capital de risco resultante da emissão dum tipo de acções especiais, com deduções à colecta em sede de IRS que ofereciam generosos abatimentos que podiam atingir 150% do capital investido, era o chamado Regime de Poupança em Acções, criou a companhia de aviação Air Transat, que é hoje o mais importante elo de ligação entre o Canadá, (províncias de Ontário e Québec) e Portugal. Estamos a falar do senhor François Legault que de independentista convicto, passou a federalista declarado, e é sobretudo conhecido pelas suas polémicas opiniões sobre as reduções de despesa a efectuar no seio do funcionalismo público do Québec. Temos finalmente o P LQ, de centro direita, no poder desde 2003. Sofre de notório desgaste e foi ultimamente acusado de vários casos de corrupção, mal que por estas bandas é ferida mortal para qualquer governo, e ainda da forma ineficaz como, desde o início em Fevereiro, tem gerido a grave crise estudantil.
A mensagem que pretendemos no entanto transmitir com esta pequena crónica é a de que, qualquer que seja o partido no poder a partir do dia 4 de Setembro, e independentemente de todos os slogans eleitorais, algures durante a sessão legislativa lá para daqui a dois ou três anos será obrigado a adoptar medidas geralmente conotadas com a direita. Obviamente menos drásticas (o FMI não andará certamente por aqui…) do que aquelas que os portugueses sofrem presentemente, e que serão impostas não por uma questão ideológica, mas pela situação orçamental, pelas mal-amadas agências de crédito e pelos nossos credores, que nos imporão uma limpeza no balanço das contas públicas, que têm ultimamente sido fechadas no vermelho.
Apesar da situação orçamental do Québec não ser ainda tão dramática como aquela que se vive na Europa, o próximo governo provincial, terá de pôr de lado muitas das promessas feitas durante o período eleitoral. É que apesar do custo dos imóveis ser ainda bastante mais acessível no Québec do que na maioria das províncias canadianas, os alertas sobre um possível rebento da bolha imobiliária são constantes, e todos sabemos quanto será prejudicial para o conjunto das populações uma situação similar à que vivem os Estados Unidos e os países da União Europeia. O próprio Partido Quebequense, que está neste momento á frente nas intenções de voto, e que deseja separar-se do Canadá, e da «implícita apólice de seguro» que o mesmo representa face às agências de crédito, será obrigado a fazer uma limpeza nas finanças públicas da província. Se olharmos para o passado, foi exactamente um chefe de governo deste partido, o Senhor Lucien Bouchard, que fez em 1999 os cortes mais drásticos jamais efectuados na nossa despesa pública e instaurou uma política de défice nulo. E foi igualmente uma ministra das finanças do PQ, Pauline Marois, actual chefe do mesmo e candidata a chefe de governo, a única que nos últimos cinquenta anos procedeu a reembolsos parciais da dívida soberana provincial. É que, por vezes, são as circunstâncias que orientam as ideologias políticas, e não o inverso.

J.L. Reboleira Alexandre
jose.alexandre@videotron.ca