O vereador do principal partido da oposição, o social-democrata Hugo Oliveira, tece críticas à gestão do executivo, que acusa de falta de estratégia. Garante não ser candidato às próximas autárquicas e acredita que o PSD tem pessoas capazes para voltar a liderar a Câmara das Caldas
Hugo Oliveira alerta para o aumento do custo com as despesas de correntes, por parte do executivo, e o baixo investimento
Depois de 40 anos no poder, o PSD é agora oposição na Câmara das Caldas. Como têm corrido estes últimos três anos?
Em primeiro lugar, nós perdemos as eleições por culpa própria. Temos que ter a humildade de reconhecer que, 40 anos depois, as pessoas estavam cansadas de nós, o que é normal na política. Se calhar foram dados sinais que nós não entendemos. Não é que estivéssemos a fazer tudo mal, estávamos a fazer coisas bem, isso nota-se hoje, outras se calhar não tão bem. Hoje, eu diria que, para muitas dessas pessoas [que quiseram mudar], a tendência será dizerem que preferiam ter mudado para melhor e não para pior. Mas temos de ter essa humildade e dizer que estamos disponíveis para o futuro, apresentarmos ideias novas, com pessoas novas também, com um objetivo único que é servir os caldenses. O PSD aprendeu a lição, vai continuar a lutar pelas Caldas e espera conseguir dos caldenses essa confiança, porque estes três anos de balanço são uma destruição daquilo que estava a ser bem feito nas Caldas da Rainha. E isso preocupa-nos muito. Não há projetos de futuro, não há uma visão e, a breve trecho, Caldas da Rainha vai sentir muito estes quatro anos que tivemos de um movimento de pessoas que espreitaram uma oportunidade, apresentaram-se, mas sem algo que os unisse, um projeto, uma visão.
Divergem com o executivo sobre a aplicação da taxa de saneamento às fossas séticas. O PSD continua a ser contra?
É curioso porque eu tive a oportunidade de falar com vários presidentes de Câmara sobre isso. Havia uma recomendação, em tempos, da ERSAR, de que nós tínhamos que pagar uma taxa de lixo. A Câmara das Caldas foi a antepenúltima a pagá-la, porque tentámos esticar ao máximo, para salvaguardar os munícipes. A aplicação desta taxa podia ser evitada, a Câmara quis ser logo a primeira a fazê-lo, e nós fomos contra, colocámos em causa.
Muitas câmaras não aplicaram ainda, por isso podia ter sido adiada alguns anos. E nós discordamos que possa ser a mesma taxa para quem tem saneamento à porta, porque são serviços diferentes. A partir do momento em que passou a haver a taxa, devia ter sido pedido um parecer para conseguir defender os caldenses que estão nesta situação, para que tivessem uma taxa diferente para um serviço diferente. Não o fazendo, o PSD não podia aceitar isto, votou contra e dificilmente mudará de posição.
A segurança tem sido um dos problemas apontados pelo PSD em relação ao que se passa na cidade. O que é que deve ser feito?
Qualquer ação feita pela Câmara deve ser integrada e deve-se olhar para o território. E quando lhe falta essa estratégia – eu já o disse olhos nos olhos ao presidente da Câmara -, falta depois também a capacidade de olhar para o território e perceber o que é preciso fazer para melhorar. Eu fiz uma pergunta, enquanto deputado, à ministra da Administração Interna e ela respondeu: já tomámos a iniciativa de falar com a Câmara para ter videovigilância. Como sabem, há cerca de 15 anos eu fiz essa proposta e as pessoas achavam que não fazia sentido. É preciso ter uma estratégia proativa e não reativa. A Praça 5 de Outubro tem problemas. Nós já o tínhamos percebido há muito tempo e propusemos uma intervenção para melhorar o espaço, porque quanto mais arranjado está um espaço, menos ele é danificado. Fizemos um projeto, que até foi um jovem que apresentou no Orçamento Participativo, mas o presidente da Câmara disse que não era prioritário.
Está prevista para a zona da PSP a alteração do PDM, que tem levantado algumas questões ao PSD. Discordam do projeto?
Não existe projeto, existe uma ideia. Mas já existia uma ideia antes. O que estava no plano de mobilidade era que podia haver ali um estacionamento subterrâneo que acompanhasse a diferença de cota junto à OesteCIM. Discordamos que se faça ali um parque subterrâneo pago. Isso significa que os funcionários do comércio e dos serviços que ali estacionam o carro têm que pagar. Mas isto ainda tem mais um agravante, que é a alteração do PDM. Se a Câmara vai ter que comprar algum terreno, hoje custa X e não se pode construir, amanhã custa Y e pode-se construir com densidade. Isto eu acho que é, no mínimo, um problema que estamos a criar à Câmara e aos caldenses.
É mais importante a questão do silo automóvel na estação [ferroviária]. Quando nós fizemos as obras da regeneração urbana retirámos muito estacionamento. Tinha que haver uma compensação, mas os projetos demoraram algum tempo. Seria um estacionamento em altura, aberto, com um coberto vegetal, que desse apoio à linha férrea, com um espaço onde as pessoas pudessem fazer uma reunião e seguir. Um espaço de estacionamento gratuito que servisse a avenida.
O estacionamento subterrâneo na Rua 15 de Agosto não dá essa resposta?
Também e era para ser feito no futuro, mas o prioritário era este. Eu estive a negociar com a Infraestruturas de Portugal com muita dificuldade para conseguir alargar a Rua da Estação. Já era um grande desejo do Vasco de Oliveira, ter aquela rua com dois sentidos. Consegui que se autorizasse deitar abaixo do muro, fazer o estacionamento em espinha e ter dois sentidos para desanuviar a avenida e garantir estacionamento. Deixei pronto o projeto, primeiro ficou deserto o concurso, teve que se aumentar os valores, que mudaram por causa da covid. Preocupa-me que haja uma visão de vender o terreno para se fazer um prédio e guardar 70 lugares para serem públicos. Eu não sei quantas habitações vai ter o prédio, mas se tiver 70 e se tiver 70 lugares para as habitações, os outros 70 são para o segundo carro, não adianta de nada.
O termalismo está na génese das Caldas. Como é que vê a aposta do município nesta área?
Andamos sempre à volta do mesmo, falta de estratégia. Existe um grande masterplan termal, que na verdade é um estudo urbanístico, de termal tem pouco. E quem o apresenta diz que de termal tem pouco porque foi já dito tudo e juntou-se o que as pessoas disseram. Eu aceito que sim, mas os tempos mudaram. Caldas era uma cidade termal e passou a ser uma cidade com termas, são coisas diferentes. Uma cidade com termas que tem que se adaptar, porque não vive só das termas. Temos que perceber a vantagem de ter ali um hotel de cinco estrelas e como é que isto encaixa. Eu olho para o termal e sei o que é que gostava de fazer em cada piso, tenho uma visão. Na Câmara nunca vi ninguém ter uma ideia do que fazer. Estamos a dar passos, já temos tratamentos, mas é preciso o novo balneário, discutir onde vai ser feito, tenho muitas dúvidas sobre o local onde o querem fazer, como é que se integra com o hotel, como com o resto da cidade.
E que visão seria essa do PSD se tivesse sido executivo?
Nós deixámos o projeto de obra do Termal em andamento. Tanto é que depois foi inaugurada a obra no primeiro andar. Mas tínhamos projetos para o rés do chão, mais para o uso cultural e turístico. Assim como aquela praça, que tem de ser vista no enquadramento do hotel. Tínhamos uma visão clara de infraestruturas e de continuar a fazer obras, até ter um novo balneário e, ao mesmo tempo, na promoção e na criação de programas, que agora começaram a surgir na Câmara, para projetar as Caldas. Tínhamos a necessidade de projetar as Caldas como uma cidade com termas.
Quando fazia parte da Rede Europeia das Cidades Históricas Termais não era para ir passear, mas para aprender e trocar experiências. Acho que podem olhar para nós com a humildade de que estamos disponíveis para fazer a diferença.
E o que é que se pode esperar daqui para a frente da oposição do PSD neste último ano deste mandato?
Nós temos sido uma oposição responsável, mas estamos a chegar a um ponto…
As pessoas perguntavam, a dada altura, porque é que nós não éramos mais agressivos. A pior coisa que podia acontecer era olharem para nós e dizerem que estávamos a fazer oposição só por fazer. Nós deixámos trabalhar e não me parece que tenha sido mau. Mau para as Caldas, sim, mas as pessoas perceberam o que está, ou não, a ser feito.
Custa-nos que estejam a delapidar o orçamento da Câmara e isso é uma preocupação para o futuro.
Pode dar alguns exemplos?
Não deve estar muito longe de gastar um milhão de euros em atividades de Verão, mas são opções que se fazem. Mas há duas outras questões que me preocupam, como a falta de capacidade de investimento e o aumento das despesas correntes. Estou de acordo que a Câmara precisava de mais quadros superiores, o que é preciso é ter um equilíbrio. A Câmara, neste momento, está com pouco mais de 800 funcionários, uns resultam da transferência de competências, mas alguns já lá estavam, não é por aí… Mas tem que ser gradual, porque, grosso modo, a despesa anual com pessoal deve ser de cerca de 600 mil euros. E agora, com a proposta do Organograma, e que nós temos muita dificuldade em aceitar, estamos a falar de mais de um milhão e meio de despesas correntes com o pessoal por ano. E isto pode significar um problema terrível para as Caldas, no futuro, ao nível do custo da despesa corrente e incapacidade de investir.
Quem vier a seguir vai ter um problema na Câmara pela gestão, ou a má gestão, que está a ser feita hoje em dia.
Há anos que se fala da candidatura de Hugo Oliveira à Câmara das Caldas, após a liderança de Tinta Ferreira. Vai ser candidato nas próximas autárquicas?
Antes quero só dizer que Vítor Marques é um homem bom, mas não significa que seja um bom presidente de Câmara e acho que isso está à vista de todos. Deve ter sido o pior presidente de Câmara que tivemos em Democracia. Custa-me ver as Caldas definhar assim e é uma pessoa que até tem bondade, é próxima, mas não chega para ser presidente de Câmara.
O que me motiva são ideias e projetos, mas não é minha intenção ser candidato à Câmara. Em 2013 tinha essa intenção, agora estou a fazer o meu doutoramento, quero concentrar-me nas minhas funções na Assembleia da República.
Não quero ser candidato mas quero ajudar a encontrar alguém para termos uma candidatura ganhadora. Acho que o partido nas Caldas tem muitas pessoas com capacidade para liderar a Câmara.
Fernando Costa já se ofereceu para ir nas listas do PSD. Concorda com a proposta?
A melhor forma que o partido tem de honrar o seu passado é reconhecer os seus membros ao longo dos anos de gestão autárquica e trabalho feito. Tem de ser a comissão política do PSD a definir, na sua estratégia, se este ou aquele membro deve ocupar uma posição.
Fernando Costa é uma mais valia, foi nosso presidente de Câmara durante 28 anos e fez obra nas Caldas.
O novo hospital do Oeste, que as Caldas defende que se deve manter neste território. Vai ser persistente junto do seu partido, que agora é governo?
A minha convicção é a mesma, fiz intervenções na Assembleia, escrevi artigos. Ainda a sra. ministra não tinha assumido o cargo e já tinha falado com ela sobre esta matéria, porque era minha colega deputada.
Eu não desisto e vou continuar a fazer o meu trabalho.
É preciso termos a noção de que é necessário estarmos todos em conjunto, não é preciso estar a fazer ataques. O Manuel Nunes era deputado municipal (pelo PS) e apresentou um documento, assinado por todos os partidos na altura, que era a nossa posição. E logo na primeira reunião com a então ministra da Saúde [Marta Temido], este executivo “rasgou” esse documento. Deixemo-nos de ataques, sem lógica nenhuma, e temos é que dizer qual é a estratégia. E também se exige a um presidente de Câmara que tenha essa estratégia.
Como é que vê a Câmara?
Uma câmara tem de ter eco junto das suas instituições e hoje falam com o presidente de Câmara, que hoje diz uma coisa e amanhã outra, isso não pode acontecer. Isto descredibiliza a política e, quando ela chega a um ponto institucional de relacionamento difícil com os presidentes de junta, ainda pior. Institucionalmente é mau quando os presidentes de junta sentem que estão a ser mal tratados pelo presidente de Câmara, e foi público na Assembleia Municipal.
Ainda no encerramento das Tasquinhas não foram chamados ao palco, eles estão a sentir…
As coisas não correram bem nas Tasquinhas?
Não sei se os artistas não foram suficientes ou não atraíram público suficiente… Ainda no Dia do Emigrante estava cheio à noite mas à tarde, o lanche, foi um fracasso. Aproveito para dizer também que tenho muitas dúvidas que a Câmara contrate uma empresa para fazer esse lanche, para depois o contratar com as associações, quando se fazia diretamente. A Câmara investiu 220 mil euros e acho que não correu bem.
Preocupa-me a promiscuidade que possa existir nessas coisas, e não me posso calar se sinto que estamos a chegar a este nível. As pessoas abordam-me na rua e dão a cara. Eu não compactuo com os ataques anónimos.
São cada vez mais frequentes. Teme o que possa acontecer com o aproximar das autárquicas?
Pode ser estranho e é prejudicial. Já disse ao presidente da Câmara que o que lhe digo, digo-lhe nos olhos. Estou habituado na política e as coisas são assim. Já o disse aqui, é um homem bom, mas o presidente de Câmara tem que ser muito mais, não tem tido essa competência e capacidade. E depois, ver estas questões, estes envolvimentos, preocupam-me para o futuro.
Temo por quem vier a seguir porque é preciso ter visão e um planeamento estratégico, pensamento, candidaturas a fundos comunitários, mas não vejo nada. Quem vier a seguir pode ter um fosso. Ter uma câmara com um custo de despesas correntes maiores, pouca velocidade de investimento, sem projetos para investir… Isso preocupa-me em nome dos caldenses. ■
Ouça aqui a entrevista a Hugo Oliveira na íntegra