O 16 de Março fez das Caldas a cidade a nascente da Democracia portuguesa

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Fotografia de grupo após a visita ao quartel das Caldas

A Escola de Sargentos do Exército (ESE) abriu as suas portas na manhã de sábado, 16 de Março, à comunidade, dando a oportunidade, a dezenas de caldenses, de conhecer os locais onde se desenrolou a acção do Golpe das Caldas. O presidente da Câmara, Tinta Ferreira, continua a achar “estranho” que as entidades nacionais passem ao lado do 16 de Março e quer começar a preparar, com pompa e circunstância, os 50 anos da iniciativa. Presente no evento, a historiadora Joana Tornada reafirmou a importância do acontecimento caldense na preparação da Revolução – que tem um carácter único no mundo – e que coloca a cidade das Caldas “a nascente da Democracia portuguesa”.

São 10h00 e as portas da ESE abrem-se a dezenas de caldenses que querem visitar o quartel que em 1974 albergava o Regimento de Infantaria 5.Alguns vêm organizados em grupos como aconteceu com alunos da Universidade Sénior. Os convivas encontraram-se na messe dos oficiais para beber café, recolher um livro de BD de José Ruy e um lápis que assinala o 45º aniversário do 16 de Março. Há entre os presentes até quem se lembre da inauguração do próprio quartel, nos anos 50.
O anfitrião, o comandante da ESE, Gonçalo Azevedo, deu a conhecer que foi numa das mesas da própria messe que se tomaram decisões sobre o plano operacional relacionado com a ida a Lisboa com o objectivo de derrubar o governo. Assim o confirmou o professor de História da ESE, Joaquim Silva, que relatou aos presentes que, por volta das quatro da madrugada, uma coluna de cerca de 200 homens saiu daquelas instalações com rumo a Lisboa.
Na verdade, não chegaram à capital pois descobriram que estavam sozinhas e que o regime tinha posto forças de prevenção a barrarem-lhe a entrada em Lisboa. A coluna voltou para trás sem conseguir os dois objectivos que tinha: tomar a Rotunda do Relógio e o aeroporto. Regressaram por volta das 10h00 e vieram unidades de Tomar e de Santarém para cercar o RI5. “Os oficiais foram presos na Trafaria e o comando foi restabelecido. Afirmava então Marcelo Caetano que a ordem reinava o país”, disse o professor de História, recordando que tal ordem apenas reinaria por mais um mês, altura em que acontece o 25 de Abril.
A comitiva de visitantes, às quais se foram juntando mais pessoas de todas as idades, dirigiu-se em seguida para o gabinete do comando e para a biblioteca onde os militares revoltosos prenderam o comandante da altura. Visitaram a biblioteca e em seguida uma caserna que mantém as características dos anos 70. As camas e os cacifos eram feitos de ferro. Por contraste, foram visitados os actuais aposentos militares, com camas em madeira clara e secretárias individuais.

Lápis, desenhos e selos

O vereador do PS, Jaime Neto, foi o autor da ideia de fazer um lápis alusivo à data e de o ofertar às escolas. Presente na sessão, explicou que estava satisfeito com a oportunidade de conhecer, pela primeira vez, os locais onde decorreu parte da acção do Golpe das Caldas. Foi este autarca que também propôs a feitura de trabalhos sobre o 16 de Março nas escolas caldenses e que serão apresentados no próximo ano. Também fez a sugestão à autarquia de criar selos que poderiam ser usados para enviar as suas cartas. “Seria uma forma barata de fazer marketing institucional”, referiu.
Maria da Conceição Pereira deu a conhecer que a Câmara distribuiu pelas escolas caldenses livros de BD de José Ruy e 5000 lápis alusivos a esta comemoração. Questionada pela Gazeta das Caldas sobre o Centro de Interpretação, a autarca respondeu que este está a ser preparado em conjunto com a ESE e “já há algum trabalho realizado entre o Exército, o PH e a Câmara de modo a poder apresentar alguns textos junto do monumento para dar a conhecer o que se trata”.
Após a visita às casernas, os visitantes reuniram-se junto ao edifício do comando da ESE para ouvir as intervenções do presidente da Câmara e da historiadora Joana Tornada.

Estado não assinala 16 Março

Militares e civis em convívio durante a visita

O presidente da Câmara, Tinta Ferreira, que também visitou a ESE, afirmou que “por razões que ainda não percebemos, o Estado Central não comemora o 16 de Março”. Apesar da falta de reconhecimento oficial, o autarca garantiu que as Caldas continuará a celebrar esta data. Mencionou a construção do monumento alusivo que foi inaugurado no ano passado e a necessidade de preparar o 50º aniversário, devendo para tal ser constituída uma comissão com nomes também a nível nacional “pois queremos assinalar a data com mais visibilidade”.
Para a historiadora Joana Tornada, a revolução portuguesa “é única no mundo” e suscita curiosidade noutros países dado que “foi feita por militares com o objetivo de restabelecer a democracia”. Na sua opinião, são muito importantes as visitas aos locais onde a acção decorreu, bem como o conhecimento das histórias de vida de quem fez parte daquele movimento.
Joana Tornada diz que, ao dar origem ao 25 de Abril, o 16 de Março coloca a cidade das Caldas “a nascente da Democracia portuguesa”. Segundo Joana Tornada, os manuais de História já fazem curtas referências ao 16 de Março. E recorda que houve gente que veio a Portugal na altura para conhecer melhor a Revolução dos Cravos.
Após as intervenções, os participantes dirigiram-se ao monumento de José Santa Bárbara que se situa no exterior do quartel para uma fotografia de família. O coronel Novo, que participou na acção militar, lembrou que estava um dia bonito, tal como há 45 anos. “De madrugada, quando partimos para Lisboa, havia nevoeiro, mas depois destapou-se e o sol brilhou”, referiu.
Também o coronel Ferreira da Silva, que à data estava em Lamego e fez a chamada telefónica que acabou por determinar a saída da coluna, se mostrou satisfeito com a forma como se assinalou esta efeméride. O militar promete continuar a vir anualmente às Caldas da Rainha para recordar esta data.