Recentemente, assisti a uma conversa on-line promovida pelo British Museum que me desassossegou. Intitulada “Art has no country”, a discussão girou em torno de um artista iraniano e de outro iraquiano que, nos últimos anos, vítimas da guerra no Médio Oriente, foram compelidos a viver noutros países como refugiados ou migrantes. Forçados a abandonar os seus bens pessoais, privados das suas referências sociais e espaciais, perderam a noção de “casa” (para um, esta foi resumida a duas malas de viagem que o acompanhavam). Órfãos de um mundo a que duvidam poder regressar, têm vindo a explorar as ideias de Pátria e Nostalgia (a nossa “Saudade”) na sua obra recente.
Venetia Porter, curadora da exposição “Reflections: contemporary art of the Middle East and North Africa”, no âmbito de cuja programação aquela conferência foi promovida, sugere que, se quisermos entender melhor o passado e o presente de um país, não há melhor forma do que começar pela arte contemporânea.
Entenda-se, aqui, contemporânea no sentido de realizada por artistas cuja atividade reflete a atualidade e, por conseguinte, as suas obras não são apenas arte, mas também documentos que falam sobre o seu tempo.
Certo, não é novo o gosto pelo inventário visual da região ou do país, nem o compromisso artístico com a denúncia e transformação da sociedade. Para trazermos a reflexão para a geografia mais próxima, basta lembrarmos a ligação que, desde finais do século XIX, a pintura naturalista favorecia entre a arte e os propósitos regionalistas. Mas hoje dá-se primazia à ativação territorial, ao envolvimento da comunidade e à arte participativa.
Os museus dão também o seu contributo no projeto de “tipificar” as identidades regionais ou nacionais. Têm responsabilidade em proporcionar à comunidade o seu melhor conhecimento, a sua tomada de consciência mediante um processo de identificação e de diferenciação.
No MIMO – Museu da Imagem em Movimento, em Leiria, está patente a exposição “Identidade Territorial: Imaginário Visual da Região”, cuja visita recomendo. Programada no âmbito da candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura 2027, reúne fotografias e objetos que retratam patrimónios e tradições dos 26 municípios que integram a Rede Cultura 2027.
Cada concelho/museu foi curador da sua representação, o que estimulou uma reflexão interna para selecionar as 5 fotografias e 1 objeto (artístico ou etnográfico) que os retratassem. Processo participado e erguido em rede, esta seleção atesta a responsabilidade dos agentes do património na cocriação da visualidade identitária do mesmo.
Para nós, visitantes, conhecedores ou ainda desconhecedores do vasto território em exposição, percebemos que não se quis “criar” uma região, na esteira da visão bucólica de outros tempos, embora o olhar tenha partido do passado. Sobretudo, compreendemos que o espaço representado (enquanto “produto social”, na expressão de Lefebvre) é diverso, mas potencia sinergias, aproximações. Convida a (re)olhar-nos e a identificar-nos com este território para que ele seja a nossa “casa”, mesmo quando a vida nos lança para a distância e a ausência, para uma mobilidade constante ou forçada, para o desenraizamento.