Catarina Tacanho
farmacêutica
Grandes descobertas científicas deram-se simplesmente por acaso. Mas por acaso deram-se a quem já se dedicava ao tema, e quem estava atento à evidencia do demonstrado. Acasos só por si, não sei se existem nestes casos!
Vejamos.
1928, Alexander Flemming descobre a penicilina, porque foi de férias e esqueceu-se da sua caixa de petri abandonada na bancada do laboratório.
Podia ter simplesmente ignorado o resultado, mas observou atentamente que o desenvolvimento de fungo tinha destruído as bactérias.
Acaso ou atenção, foco, espírito aberto e mente brilhante?
O Viagra, ou o tão conhecido comprimidinho azul, foi inicialmente estudado para a angina de peito e hipotensão arterial. Foi observado ainda em fases iniciais de ensaios clínicos, que provocada como efeito lateral de ereção nos homens que o tomavam e inteligentemente a empresa que estudava esta substancia alterou a utilização da mesma.
O Pacemaker foi também obra de um engano, quando um engenheiro que trabalhava em aparelhos para registo de batidas cardíacas trocou uma peça. E temos um aparelho que salva vidas.
Não poderia deixar de referir Louis Pasteur, que veio demonstrar através de uma experiência que a vida vinha da vida, e não de matéria inerte como se pensava desde a Grécia antiga. Esta importante descoberta contribuiu para que fosse criada a noção de assepsia e que fossem reduzidos o número de mortes por esta falta de cuidado. Também Pasteur teve sorte, ou também por acaso inventou as vacinas. Pasteur estava a estudar cólera das aves, injetando bactérias nos animais e registando a evolução dos sintomas. A dada altura foi de férias e deixou instruções ao seu colega, que se esqueceu de as seguir, injetando as bactérias um mês depois. As galinhas manifestaram sintomas ligeiros, mas sobreviveram. Algum tempo depois, Pasteur voltou a injetar bactérias causadoras de cólera e as galinhas não adoeceram. Estava assim descoberto o conceito de atenuação do agente patogénico! Mas foi acaso, sorte ou uma vida dedicada a estudar e a querer descobrir e evoluir? Após esta situação estudou o antrax e a raiva, tendo desenvolvido vacinas e tendo tido um papel determinante na redução da mortalidade.
E por falar em vacinas e Pasteur, convém salientar como se testam vacinas, e como o próprio Pasteur testou as suas. São ensaios controlados e aleatórios, em que se pega em dois grupos, e se usa um grupo controlo. Observam-se e analisam os resultados em ambos os grupos. Gera-se evidência, provam-se teorias, salvam-se vidas.
Por acaso ou não, a população totalmente vacinada contra a Covid-19 não apresenta taxas elevadas de internamentos por Covid-19 nem situações graves. E temos mais de 80% da população portuguesa inoculada. É esta a enorme eficácia da vacina. Mas talvez seja um acaso. ■