Das falácias da meritocracia ao engodo dos rankings

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José Ribeiro
Professor de Políticas Públicas

Byung-Chul Han, filósofo alemão de origem sul-coreana, no seu livro “A sociedade do cansaço”, alerta para a perversão da máxima: se não és vencedor, a culpa é tua, i.e., as pessoas têm o sucesso que merecem. Nestas premissas assenta a meritocracia: é do esforço de cada qual que advém o tal sucesso. Algo muito próximo do libertarismo, defensor dos “self-made men” e da absoluta liberdade individual enquanto epítome do que deve ser o Homem inserido num Estado mínimo, a isto juntemos a nossa tradição judaico- cristã que enraizou profundamente a crença de que as pessoas merecem o que lhes sucede. Os influencers, coachs, redes sociais, entre outros, cavalgam esta ideia (que para alguns é um filão). É claro que discutir a meritocracia não põe em causa o esforço individual, o trabalho e a coragem de empreender, sabendo, como Einstein, que sempre haverá fatores sobre os quais não temos qualquer controlo. Que sucesso é este? Dinheiro, fama, luxos? No mesmo sentido, quando falamos de rankings das escolas, falamos de quê? Comparam-se médias em exames e acreditamos nas parangonas que anunciam “ranking das escolas volta a ser liderado pelos privados”? No fundo destes rankings estão invariavelmente escolas públicas das zonas carenciadas das grandes cidades e de restantes regiões do país com elevadas carências socioeconómicas, mas é aqui que mais valor público se cria. A igualdade é um princípio constitucional e a equidade, um pilar do estado social que tem assumido esta distribuição diferenciada dos recursos: dar mais a quem mais precisa, pugnar por uma sociedade o mais equilibrada possível em termos de oportunidades, de meios e de bens. Este é um caminho sinuoso, mas é o caminho. As escolas Raúl Proença e Bordalo Pinheiro podem não ter as melhores médias nos exames, mas quantos alunos motivaram a ler um livro, a concluir um ciclo de estudos, a interessarem-se pelo 25 de abril ou pelos direitos humanos, quanto alunos impediram de desistir e ajudaram a encontrar uma vocação, um talento ou um percurso que lhe permita ver futuro? Isto é Valor público, variável difícil de medir e de percecionar e que não faz parte dos rankings. Nestas escolas abertas a todos, porque são públicas, como medir a contribuição para educarmos pessoas mais tolerantes e conscientes, que o convívio com as diferenças permite? Quem “mede” o mérito destes professores? (Sem qualquer desmérito para as escolas privadas, que urge livrarmo-nos das dicotomias e extremos que nos impedem de ver melhor). Alguns defendem mais competição entre escolas, poder escolher pública ou privado e assim tudo resumirmos às falácias do mérito nas altas médias expostas em rankings que nada dizem sobre os verdadeiros valores que nos devem orientar. ■