Momento histórico no Campo da Mata seguido na Finlândia

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Caros conterrâneos,
Não esperava, de todo, disfrutar tão intensamente esta quarta-feira, um memorável episódio desportivo do meu “Caldas”. Aqui, a 5000 quilómetros a nordeste do Campo da Mata (vivo na Finlândia), onde nos anos 80 fui cliente assíduo nas soalheiras tardes de Domingo. De 15 em 15 dias lá convencia os meus pais a fazer o tradicional churrasco mais cedo de forma a conseguir ver o árbitro a apitar para o início do encontro. Ainda eram dois quilómetros a pé, pois a casa fica do lado oposto da cidade. Tenho agora a sensação de que nunca conseguia sair de casa sem a minha mãe recordar a história antiga que o meu avô contava, já certamente empolgada, mas mesmo assim, sempre divertida – vale a pena partilhar a versão que me lembro, embora distorcida pelo tempo e pelo espaço – “supostamente” por razões de segurança realizava-se na “Mata” jogos ente os “Nazarenos” e o “Penicheiros” – então consta que havia gente que esperava, na Rua Diário de Notícias, o fim do jogo, para desfrutar do pessoal que com o animo inflamado se embrulhavam lá em cima e vinham a rebolar até ao chafariz. Depois a polícia acertava o passo e  punha tudo na estação – uns iam para a Dagorda e outros para o Valado.

Nunca tive medo. Nunca tive quaisquer problemas. E era uma criança. O que me assustava era ver a destreza dos jogadores, a sua entrega insana naquele agressivo campo pelado. Eu tinha respeito por eles!
Entretanto, ao ouvir na passada quarta-feira o João Carlos Costa narrar o jogo, fui revendo estes slides da minha infância nas Caldas. Realmente, não tenho a mínima ideia da última vez que ouvi um relato de futebol na rádio. O reinado da imagem, imposto pela televisão e os herdeiros híbridos inteligentes móveis, agora cilindraram obviamente as audiências radiofónicas dos eventos desportivos. Nada a fazer. Todavia foi surpreendente ouvir um relato. Sim, um relato. Uma descrição sequencial de factos que permite “ver” pela rádio o que acontece do outro lado. Tornou claro o facto de as transmissões televisivas, actualmente “bordadas” com comentários de especialistas que somente “explicam” como acontece, porque é que acontece e quando acontece. Uma aula. Os Luís(es) Freitas Lobo(s) dão cursos de treinadores pelo preço de subscrição dos canais. Garantem que os telespectadores sabem bem o que cada jogador e/ou equipa tem que fazer para levar a melhor, sem explicar que se uma delas fizesse o que diriam… a outra ficaria impossibilitada de fazer o que acabaram também de dizer. O acesso às infinitas estatísticas apimenta o conjunto com um sem número de curiosidades, que permitem alicerçar as teorias que vão mudando com o evoluir da partida. É como desfolhar o Livro Guiness dos Records em vídeo. Pior que isso só a imparcialidade da BTV.
O streaming da RLO garantiu a verdadeira experiência da Radio. Som baixo para não acordar os vizinhos – nos anos 80 ouvia os jogos da minha equipa (grande) sempre pela rádio, e tinha de ser baixo, porque a minha mãe queria ver televisão e não queria o relato a chatear. Auscultadores não se usavam e auriculares eram algo que eu nunca tinha ouvido falar – mesmo no Campo da Mata, eram incontáveis os rádios encostados à orelha. Era uma imagem de marca da Foz e (suponho) de todas as praias portuguesas, os domingueiros a dormir a sesta nas suas viaturas caoticamente estacionadas junto à praia, quando não estavam a ouvir o relato, com as portas abertas, do seu clube do coração. O “Domingo Desportivo” fechava então o fim-de-semana, onde podia então ver finalmente os golos enquanto fazia os últimos trabalhos de casa para segunda-feira ir para a escola com eles prontos. Realmente a diferença para os programas desportivos de hoje…
Obrigado ao Pedro Emanuel, ao Januário e a todos os outros que através deste momento histórico me trouxeram de volta às Caldas de uma forma tão intensa e apaixonada como há duas semanas atrás onde estive mesmo fisicamente lá (aí)!
Foi bom sentir aquele sabor do futebol (antigo) onde parecia que se jogava porque simplesmente se gostava enquanto imaginava tudo o que se passava no “Campo da Mata” à minha maneira.
Foi bom rever (em vídeo da festa do fim da partida) aquela monumental flora que envolve o Campo.
Foi bom sentir a ferver o orgulho de ser “Águas Mornas”.
Viva “O Caldas”!

Plácido Afonso

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