Serra d’El-Rei – mudança toponímica?

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Quando, em 1 de Julho de 2005, Serra d’El-Rei, por aprovação da Assembleia da República, ao abrigo da Lei nº 11/82, foi reconhecida, por razões administrativas, com a categoria de vila, esta mudança de estatuto deveu-se ao seu desenvolvimento no sector terciário e às suas raízes históricas.

Contudo, o que, ao fim de seis anos, se tem vindo a verificar é que esta mudança de estatuto, por razões desconhecidas e não contempladas na lei, passou a significar uma mudança toponímica, já que é frequente – e errada – a designação da povoação por “Vila de Serra d’El-Rei”. Ora, como sabemos, muitas vezes, o uso torna-se lei e isso parece-me pouco revelador do respeito que a tradição e as nossas origens nos merecem.
Serra d’El-Rei é um topónimo poderoso. Evoca o passado e todo um percurso histórico, desde os tempos em que Atouguia da Baleia era sede de concelho e esta povoação se designava “Serra da Pescaria” ou “Serra de a par d’ Athouguia”. A construção do Paço Real, no tempo de Afonso IV, a vinda dos Reis para estadias de caça e a ligação que D. Pedro I estabeleceu com os seus habitantes contribuiu para a sua incontornável definição toponímica – Serra d’El-Rei -, contribuindo, de forma inequívoca, para a consolidação da identidade desta comunidade que, assim, afirmou a sua posição no concelho e no país até à actualidade.
Parece-nos, por isso, desnecessário confundir a determinação da categoria de vila com o seu desadequado uso como topónimo. A título de exemplo, temos, no país, topónimos com a palavra “Vila”, mas que são aldeias, prendendo-se este uso com a sua herança romana (villa) ou medieval (por carta de foral).
Este artigo pretende chamar a atenção para estas duas questões distintas, que, sendo pouco explícitas, induzem em erro os mais desprevenidos. Um erro que, no futuro, poderá vir a pôr em causa algo mais que a nossa designação toponímica – de que nos devemos orgulhar, por todo o percurso que ela contém -, tal como a nossa identidade como comunidade.
Não vamos, por isso, deixar-nos deslumbrar pelo facto de, administrativamente, sermos considerados uma vila, pois não temos, sequer, o direito de grafar esta palavra com letra maiúscula, simplesmente porque não é um nome próprio, não faz parte do topónimo. Serra d’El-Rei deverá continuar a ser, simplesmente, Serra d’El-Rei, em todo o seu esplendor. Não precisa do uso recorrente da palavra “vila” para se afirmar. Tornámo-nos vila e foi uma conquista, mas não deixemos perder aquilo que somos e que o tempo nos tem legado.

Dina Carvalho Aparício