Gazeta das Caldas
Luís Tarenta

Falar de formação em cozinha parece um tema interessante e atual e, de facto, assim é. Contudo, não é um tema assim tão ligeiro como possa parecer pois, na minha opinião, a formação de um cozinheiro passa sempre pela história pessoal de cada aluno.
Pensar que chegamos a uma cozinha, vestimos uma jaleca, ligamos um fogão, pegamos na matéria prima e com as técnicas que aprendemos na escola fazemos uma “desconstrução do cozido à Portuguesa” é, de todo, um erro. Para que o cozinheiro possa chegar a este patamar, (por si só discutível – esta estória das desconstruções – mas isso são contas de outro rosário) terá sempre que haver um estudo, uma pesquisa para saber as fontes do prato a confecionar.
Tal como digo aos meus alunos da EHTO, qualquer ser humano sabe cozinhar; uns melhor outros menos bem! Num curso de cozinha, nós formadores, ensinamos termos técnicos, processos de confeção, tipos de serviço, técnicas culinárias, cozinha nacional e internacional, tipos de cozinha, também a história da cozinha, etc. Mas para além destes conhecimentos, tentamos que cada um transmita a sua própria personalidade ao trabalho que faz. E é neste tema que gostaria de expor a minha ideia sobre o que é ser-se cozinheiro hoje em dia.
Ouvimos os cozinheiros e chefes de cozinha dizer que a cozinha é uma arte, que a cozinha é uma paixão, e eu, como cozinheiro e chefe, concordo plenamente. Jamais me imaginaria a passar um dia que seja sem cozinhar ou estudar cozinha. Não posso esquecer o que é para mim a cozinha – a paixão está nas memórias que tenho a sentir o fumo que me transporta à aldeia onde nasci, o sabor da chanfana que me lembra os almoços feitos pelo meu pai e a sopa… a sopa de feijão que só mesmo a minha avó sabia fazer!
E estas memórias, estas recordações são a essência desta profissão. Se conseguimos ter paixão ao cozinhar é garantido que quem come aquilo que confecionamos também irá sentir essa mesma emoção em cada garfada que leva à boca.
Neste ponto, a escola tem um papel fundamental no desenvolver desta fase importante da formação do cozinheiro. Esta geração mais recente tem vivências diferentes daquelas que acabei de referir; os tempos são outros e uma grande parte dos alunos de cozinha não teve as experiências gastronómicas daquilo que era a cozinha portuguesa nos tempos mais antigos (e não precisamos recuar muitos anos). É para nós uma dificuldade, mas também torna maior e mais desafiante a formação. Por isso, na escola privilegiamos os produtos e a cultura regionais; trabalhamos as gastronomias nacional e internacional, sempre com base nas experiências de cada aluno, de cada formador ou até mesmo da família. São frequentes as visitas à praça da fruta, aqui nas Caldas da Rainha, para um contacto direto com os produtos da região, as visitas a restaurantes e pastelarias, a caves de vinhos e outras.
As experiências que alunos e formadores da escola têm no estrangeiro também são uma forma de aprendizagem, não só para quem as realiza, mas também para toda a comunidade, pois os conhecimentos apreendidos são depois colocados em prática. Nestes últimos cinco anos, já pudemos trazer conhecimento de vários países, que depois se traduziram em evolução na aprendizagem de novos sabores e técnicas. Mas mesmo no estrangeiro esta essência daquilo que somos se reconhece. Seja em que país for, o cozinheiro tem sempre como génese as memórias daquilo que foram os sabores e saberes dos seus antepassados.
Lembro-me do entusiasmo de toda a comunidade escolar, quando a escola decidiu fazer a atividade “Na cozinha com os avós”; nesse dia pusemos em prática aquilo que defendo ser a essência da profissão e a simplicidade da mensagem que os cozinhados dos nossos antecessores nos transmitem. Ficarão sempre nas memórias daqueles alunos os rissóis da avó do Gonçalo, a Caldeirada de Peniche da Avó da Ana, a Caçoilada da avó do David e muitas outras.
Concluindo, ser cozinheiro hoje em dia é ser um apaixonado pela profissão, por esta arte efémera. E eu, além de cozinheiro –chefe de cozinha tenho a felicidade de estar na escola do Oeste a transmitir estes conhecimentos a esta geração de “novos cozinheiros”.

Luís Tarenta

Chefe de Cozinha, Coordenador

Escola de Hotelaria e Turismo do Oeste