25 de Abril, sempre – Foi bonita a festa, pá!

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Catarina Tacanho
farmacêutica

Vivemos a terceira fase de desconfinamento. Já tudo parece estar lentamente a regressar a uma normalidade inexistente, mas temos o dever de ficar em casa, ainda que apenas a partir da uma da tarde, ou os senhores agentes podem multar-nos em 200€ por incumprimento do dever de recolhimento.
Liberdade?
Numa altura em que sentimos que um vírus nos roubou esse bem precioso, a nós e à imensidão do resto do mundo, ansiamos por um cravo (ou um ramo de alecrim) que nos devolva o que perdemos, e o que ainda vamos perder, ainda que as medidas sanitárias de controlo desta pandemia sejam absolutamente necessárias, digo, algumas.
Passaram 47 anos do 25 de Abril, sempre, esse que deve ser cumprido, esse que tanto mar nos deu, digo devolveu. Porque liberdades jamais devem ser tiradas.
Se em 2020, no 25 de Abril, cantámos o Grândola Vila Morena à janela, à porta, on line (depois de um actuação comovente de Dino de Santiago e Branko numa avenida da liberdade deserta, em directo para o you tube), pensando que os vizinhos que não cantaram seriam fascistas ou insensíveis (como não cantar abril em tempos tão desconcertantes e solidários?) , já em 2021, vimos liberdade na avenida cheia de gente, envergando vaidosamente cravos, com ainda mais orgulho que no passado. Pacificamente os valores de Abril desfilaram, floriram, entre máscaras e álcool gel, gerações contentes caminhando no sentido da liberdade. Da liberdade de expressão, da liberdade de ser diferente, da liberdade de viver livremente. Apesar do covid. Apesar do recolher obrigatório.
Ora recuemos uns meses, antes do COVID. Qual a probabilidade de aparecer um vírus a meter-se nas nossas vidas? Os governos antecipavam este cenário? Os gabinetes de crise estavam criados e prontos a actuar?
Preparamo-nos para o imprevisível, ou para o que podemos antecipar?
Na faculdade, a minha professora de virologia antevia que um dia um vírus iria mudar o mundo. Não porque tivesse uma bola de cristal, mas porque incorporou conhecimento científico baseado em evidência, com a “breve” história do mundo.
Seria visionária ou realista?
Esta pandemia podia de facto ter sido prevista? E se soubéssemos o que aí vinha, teríamos mudado o nosso comportamento? Caro leitor, esta sim é a pergunta para queijinho.
Ora há 47 anos a Rádio Difusão Portuguesa anunciava: “Aqui posto de comando das Forças Armadas Portuguesas, apelamos a todos os habitantes no sentido de recolherem as suas casas, nas quais se devem conservar com a máxima calma”, porque uma revolução vinha aí. Hoje o motivo do recolhimento é outro.
Ora qual a probabilidade de acontecer uma revolução para devolução da liberdade sem mortos, com cravos na espingardas e pacífica?
A mesma certamente de ir a andar numa estrada e lhe cair uma árvore em cima do carro.
Amanhã vai ser outro dia. ■