Bruno Reis Santos (Mantraste)

A arquitetura, umas das disciplinas artísticas fundadoras do design, organiza, planeia, estrutura, pensa o espaço e cria a casa. Quando encontrei a casa que procurava, esta já estava criada, mas nela encontrei também dúvidas e perdi certezas e agora tenho de viver com elas.
Mas deixem-me mostrar-vos as divisões primeiro.
É fácil imaginar um futuro em que tudo corre bem, mas expectativas não passam de desilusões fora do seu tempo e por isso as evito tanto. No entanto, passeei em lojas de bricolage atrás de ideias, impaciente, até perceber que via a casa como mais um projeto, um livro, uma pintura. Assim que tive a chave, comecei por pintá-la, mas pintar é sempre mais duro do que parece, primeiro vem a dúvida nas cores, depois vem o desgaste e o cansaço e então o pensamento negativo toma conta da cabeça cansada demais para se proteger, e uma vez instalado, cresce com a dúvida.
A dúvida: se isto não é um delírio, solidão, um impulso, um desejo, o desejo de nunca errar, o medo de não estar no sitio certo, de estar no caminho errado. Lembro-me de explorar trilhos perto de casa no meio do mato, em miúdo, por entre tojos, silvas e urtigas, e após largos minutos a furar caminhos deparar-me com um beco sem saída, estreito e curto. Aí ficava ansioso, ficava difícil respirar, sentia-me sem saída, no entanto continuava a caminhar para ver o fim, e no fim o início, uma pequena abertura, um túnel, uma passagem escondida por silvas e fura-capas. Encontrava sempre uma passagem até ao dia em que não encontrei, entre lágrimas e asma descobri que estava perdido e foi no desespero por encontrar um caminho que entendi que podia sempre voltar atrás, que para seguir em frente tinha de voltar atrás.
E o mesmo faço agora que volto, volto atrás para ganhar balanço, mas não volto quem parti, quando parti estava cá confortável e agora volto desconfortável.
Mas é desse desconforto que preciso, o conforto é meu inimigo e é dele que nasce a insatisfação e o medo, medo esse que consome a alma. Então, em vez do medo de não dar certo, encontro a curiosidade do que irá dar. Quero continuar a seguir os trilhos mas não vou ser seguido pelo medo de falhar, desta vez vou perseguir eu o medo, entender-me, entusiasmar-me com as incertezas sem receio de perder algo pelo caminho, curioso sobre onde tudo irá dar. Consciente de que para construir temos de destruir, tenho de saber deixar ir, deixar o velho dar lugar ao novo, descobrir novas formas de me exprimir, de pensar, de ser. Talvez seja este o meu esplendor na relva ou então uma primeira reforma, mas isso só o tempo o dirá.