Cidades amigas dos ciclistas

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Gazeta das Caldas
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ciclistasA bicicleta foi recentemente eleita pela ONU como o transporte ecologicamente mais sustentável do planeta. Na realidade, este fantástico meio de transporte acessível a todos os tipos de pessoas, não emite gases poluentes, não faz barulho e é uma forma privilegiada de entrar em contacto com as populações e de conhecer as forças e as vulnerabilidades da cultura local. Enquanto objeto de lazer e turismo, a utilização da bicicleta está associada a muitos dos valores pelos quais muitos cidadãos se sentem atraídos: liberdade, autenticidade, descoberta, independência, tranquilidade, bem-estar e poder usufruir com todos os sentidos dos encantos de uma cidade ou de uma paisagem natural. Além disso, os viajantes de bicicleta encontram nesta forma de viajar uma velocidade de pedalada perfeita para ver o mundo tal como ele é. O turista de bicicleta, devido à forma lenta com que se desloca, tem mais tempo para descobrir e apreciar o património local e pode deslocar-se fora dos itinerários turísticos clássicos.

A Dinamarca e a Holanda são atualmente os países

mais amigos dos ciclistas. Mas nem sempre foi assim. No período pós guerra, com o progressivo aumento dos automóveis, na cidade de Amsterdão foram derrubados edifícios para alargar as estradas e as praças da cidade foram transformadas em parques de estacionamento. Não tardou muito que a crescente invasão dos carros, os muitos acidentes de trânsito e o crescente aumento da poluição se tornassem um problema. No início da década de 70 andar de bicicleta tornou-se muito perigoso na Holanda. S

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ó no ano de 1971 perderam a vida 3 300 ciclistas, entre os quais 400 crianças. Isto provocou uma crescente onda de protestos por parte da população, o que, associado à crise do petróleo de 1973, conduziu o governo holandês a uma mudança radical na política de transportes e de mobilidade dos cidadãos. Ao mesmo tempo que foram tomadas medidas favoráveis à utilização da bicicleta, criando uma rede de ciclovias e de estacionamentos práticos e seguros, foram tomadas outras que desincentivaram o uso do automóvel. A primeira destas medidas foi a proibição da circulação de carros no centro das cidades aos domingos. Pouco tempo depois a circulação e o estacionamento automóvel foi totalmente proibido no centro das cidades.

Ainda hoje estes países continuam a investir em infraestruturas para a bicicleta, o que atrai os seus cidadãos, mas também milhões de turistas de bicicleta.

A Dinamarca é um país com metade da área de Portugal e tem 12 000 quilómetros de ciclovias. Mais de metade dos habitantes da capital Copenhaga deslocam-se para a escola ou para o trabalho de bicicleta (entre os quais 63% dos membros do parlamento dinamarquês).

A Alemanha, com mais de 50 000km de ciclovias, é atualmente um dos países onde é mais fácil viajar de bicicleta e Berlim é uma das cidades mais verdes da Europa, onde andar de bicicleta é uma das maneiras mais interessantes de visitar a cidade. No Canada, país onde no final dos anos 80 nasceu o conceito de via verde, existem atualmente mais de 5 000 quilómetros de ciclovias e a Rute Verte (Via Verde) na província do Québec atrai todos os anos mais de meio milhão de turistas de bicicleta. Em 1997, na cidade de Nova Iorque, foi feita uma grande campanha de promoção do uso da bicicleta e muitas faixas rodoviárias foram requalificadas em ciclovias. Na Suécia, apesar do clima frio, mais de 30% da população desloca-se de bicicleta. E mesmo num país montanhoso como a Suíça, existem várias cidades onde a bicicleta é muito utilizada, como é o caso de Basileia, onde 23% das pessoas a utilizam para se movimentarem na cidade.

Impacto económico

 

Estatísticas recentes mostram que o turismo de bicicleta está em crescimento em muitos países e a tornar-se num instrumento de desenvolvimento do território e de diversificação da oferta turística, com um impacto positivo na economia desses países e proporcionando a criação de novos empregos. Estima-se que o turismo de bicicleta na Europa tenha um impacto económico direto de 44 biliões de euros.

No ano de 2011, o turismo de bicicleta em França gerou 7,5 milhões de euros e conduziu à criação de 16 500 empregos. A enorme popularidade da ciclovia do Vale do Loire tem atraído anualmente milhares de turistas de bicicleta. Um dos incentivos ao cicloturismo nesta região foi a criação de um comboio com uma carruagem exclusiva para o transporte gratuito de bicicletas.

Na Escócia, onde nos últimos anos tem sido feito um grande investimento na promoção do uso da bicicleta, em 2013 os cicloturistas gastaram mais de 140 milhões de euros.

A “Veloland” (rede suíça com cerca de 20 000km de ciclovias), é percorrida todos os anos por mais de 5 milhões de ciclistas e o impacto económico anual é superior a 200 milhões de euros.

E Portugal?

 

O turismo de bicicleta está em crescimento e pode tornar-se num instrumento de desenvolvimento do território e de diversificação da oferta turística, o que terá um impacto positivo na economia do nosso país e proporcionará a criação de novos empregos.

O nosso país tem um enorme potencial para se tornar um dos principais destinos do turismo de bicicleta a nível internacional. Povo simpático e hospitaleiro, bom clima, segurança, boa gastronomia, enorme riqueza de património histórico, cultural e paisagístico, caminhos e trilhos de grande beleza, boa relação preço-qualidade, etc.

Mas para atrair turistas de bicicleta é fundamental: a existência de uma boa rede nacional de ciclovias, bem sinalizada e que permita atravessar zonas urbanas e ligar localidades, duma forma segura e passando por locais de interesse turístico; estacionamento seguro junto aos principais serviços e locais de interesse turístico; oferta de alojamento especializado para acolher turistas de bicicleta com garagem e oficina que permita a lavagem e manutenção da bicicleta; informação turística de qualidade; forte promoção e divulgação dos itinerários, assim como das boas práticas turísticas amigas do ciclista, ao nível do transporte de bicicletas nos transportes públicos, do alojamento, da restauração, guias turísticos, aluguer de bicicletas, transfer de bagagens, etc.

E Caldas da Rainha?

 

Lamentavelmente e apesar das recentes obras de requalificação de algumas ruas da cidade da cidade, nada foi feito para fomentar o uso da bicicleta, quer nas deslocações para o trabalho ou para a escola, quer no lazer e no turismo. Na zona urbana das Caldas não existe qualquer ciclovia, nem foram criados estacionamentos atrativos e seguros.

Com este cenário, quantas são os pais que encorajam os seus filhos a deslocarem-se de bicicleta para a escola? E quantos são os cidadãos que se atrevem a ir de bicicleta para o trabalho?

A “rede” concelhia de ciclovias é muito pobre, incompleta e sem conexão.

Inexplicavelmente, a ciclovia Caldas-Foz do Arelho só começa a 3km do centro da cidade, depois do nó da A8. Há alguns anos o então vereador do desporto justificou esta situação afirmando que a ideia era a ciclovia começar junto ao Estádio Municipal. E como é que se transportam as bicicletas para o Estádio Municipal? De carro? Mas as ciclovias existem para as pessoas não utilizarem o carro!!

A ecopista da lagoa, uma das mais belas do nosso país, continua incompleta, sem ligação entre as margem norte e sul.

A ciclovia da estrada atlântica, que não passa de uma berma mais larga, onde os ciclistas tem que circular nos 2 sentidos…tem grandes declives e só começa no alto de Salir do Porto.

A ciclovia que deveria existir entre a praia de Salir do Porto e a cidade das Caldas, apenas liga a aldeia de Chão da Parada ao apeadeiro do comboio de Salir do Porto.

Relativamente à ligação ciclável entre as localidades mais importantes da região Oeste (Óbidos, Bombarral, Torres Vedras, Peniche, Lourinhã, Rio Maior, Santarém, Nazaré, Alcobaça, S. Martinho do Porto)… está tudo por fazer. Aos ciclistas e cicloturistas não resta alternativa do que partilhar a estrada, o tráfego e os riscos com os automóveis.

Enquanto na maior parte dos países da Europa considerados “amigos da bicicleta” existem Plano Nacionais de Ciclovias, em Portugal tudo tem girado em torno da vontade e dos caprichos dos autarcas e governantes.

Se as Caldas fosse uma cidade “bike friendly” (amiga do ciclista) existiriam várias ciclovias a ligar os bairros da cidade ao centro e seria possível a qualquer cidadão deslocar-se de casa para o emprego ou para a escola de bicicleta, em pistas cicláveis seguras e separadas dos veículos automóveis.

Se as Caldas fosse uma cidade “bike friendly” seria possível a qualquer cidadão fazer o trajeto Caldas-Foz do Arelho, sempre em ciclovia, partindo de qualquer ponto da cidade.

Se as Caldas fosse uma cidade “bike friendly” haveriam estacionamentos adequados e seguros junto às escolas, fábricas, restaurantes, museus, locais de interesse turístico e junto às estações de autocarros e de caminho de ferro,

Se as Caldas fosse uma cidade “bike friendly” existiriam vários “Bike Hotel”, com capacidade para atrair e receber turistas de bicicleta, disponibilizando estacionamento seguro e locais para limpeza e manutenção das bicicletas.

Se o Oeste fosse uma região “bike friendly” haveria um Plano Regional de ciclovias, ligando as principais localidades da região, possibilitando aos cicloturistas visitar o rico património histórico, cultural e paisagístico desta região

com benefícios diretos para as economias locais.

Se o Portugal fosse um país “bike friendly” todos os anos seríamos visitados por centenas de milhares de turistas de bicicleta, atraídos pela beleza do nosso território e pela riqueza do nosso património histórico, cultural e paisagístico… e o impacto económico seria enorme.

 Por: Vitor Milheiro

Docente na Escola Superior de Desporto de Rio Maior

Viajante de bicicleta

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