José Ribeiro
Professor de Políticas Públicas
Mais cedo do que o esperado (e desejado), o ciclo político legislativo de quatro anos foi (novamente) interrompido. Sendo a concretização popular do nosso sistema democrático representativo, esta entidade intersubjetiva e única razão de ser da política e do Estado, o “Povo”, está cansada. Que políticos temos/queremos, que políticos devemos ter, que políticos/representantes merecemos? A história e evolução da democracia podem ser compreendidas de vários ângulos. O homo politicus é relativamente recente, após a iniciação democrática na polis grega (“cidadão” era aquele que participava nos assuntos públicos) instalou- se a visão teológica na política e na sua prática. Com destaque para os vários pensadores iluministas, e as revoluções subsequentes (a francesa e a americana), voltamos a esta ideia de participação cidadã, necessária e indispensável, na vida pública. Nasceu um ideal de Estado em constante (des)construção. As utopias floresceram, as ideologias germinaram, o Povo, enquanto entidade central e justificativa da ação política, emergiu. Desde o primordial modelo grego até modelos atuais, como na Islândia, que estabeleceu uma Assembleia Constituinte, espoletada pela crise financeira de 2008, composta por cidadãos e que seria responsável por reescrever a constituição. Para assegurar a participação, foram utilizadas as redes sociais, incentivando a discussão entre a população e este Conselho Constituinte. Embora este processo não tenha sido ratificado, o seu modelo de participação democrática integral e ímpar tem sido inspirador. Que sistema e políticos queremos, que democracia procuramos? Um sistema de democracia direta (ideia que vem desde a Comuna de Paris) e consequente dispensabilidade dos partidos políticos e inutilidade da própria política, nas quais o próprio Estado deixa de ser necessário, como o exemplo islandês? Sabemos como as utopias tendem para se transformar em distopias autocráticas. Queremos políticos e representantes impolutos e moralistas, que à semelhança das utopias, tendem a ser o contrário do que apregoam? Sobreviverá a democracia a esta onda populista, extremista e maniqueísta que avulta (os cartazes que apregoam “50 anos de corrupção” insinuam que no tempo da nossa ditadura o Estado e os políticos eram uns santos? Sabemos bem que não, muito pelo contrário). O “Povo” talvez não saiba exatamente o que quer, mas tem expressado o que não quer. Por entre as manipulações variadas, talvez encontremos o novo ideal de democracia, mais participada, mais próxima, com políticos que se movam pela missão, com vida e percurso profissional, social e intelectual que justifique a honra de representarem os seus semelhantes.