Rui Lopes,
Nutricionista, docente no Politécnico de Leiria/ESSLEI/ CiTechCare
Podemos ler e interpretar um território de variadas maneiras, e, algumas dessas formas podem ser a sua cultura, as tradições etnográficas, o património edificado e imaterial, entre outros. Mas é na gastronomia que se traduz muito da história de uma comunidade e de um determinado território. Com a candidatura a Cidade Criativa Gastronómica da UNESCO, que o concelho de Alcobaça está neste momento a preparar com vários stakeholders da sociedade civil, pretende-se enaltecer o legado alimentar e gastronómico dos Monges de Cister e das comunidades que se desenvolveram em redor dos Coutos de Alcobaça.
Ao propor-se a este desafio, a cidade de Alcobaça pode vir a ser a primeira cidade portuguesa a receber esta distinção da Unesco. A história gastronómica e alimentar do território é farta o bastante para que sejamos bem sucedidos. A doçaria conventual e a Mostra Internacional, que conta já 22 anos; o património alimentar ligado à produção de fruta; a produção de vinho de elevada qualidade, que tem atraído cada vez mais investimento em adegas bastantes tecnológicas e a produzirem vinhos amplamente premiados; as belíssimas praias e a gastronomia associada aos frutos do mar; a indústria alimentar com uma história riquíssima, como é a de frutas e leguminosas enlatadas; o Porco Malhado de Alcobaça, património genético e etnográfico secular; as Misturadas ou o Pão da Benedita, que conta com vários prémios nacionais em pão tradicional; ainda o Pão de Ló de Alfeizerão e o património cultural de Cós, que para além da cestaria tradicional terá estado na origem deste bolo tão especial. Mas também as indústrias de cerâmica utilitária ou a decorativa, que integram os elementos gastronómicos e alimentares; as importantes indústrias da cutelaria e do vidro de embalagem e utilitário. Todos estes elementos da economia, da cultura e da sociedade integram uma só vontade nesta candidatura: a transformação e a reinvenção do território a partir da gastronomia e da alimentação.
Toda a história e evolução das sociedades assenta num princípio de criatividade, de sonho, de vontade de mudança e melhoria nas comunidades. Assim foi, quando os seguidores de Bernardo de Claraval aqui se instalaram e foram conquistando granjas e quintas aos sulcos incultos das matas e fazendo recuar o mar para o lugar onde hoje o conhecemos. É essa herança de criatividade, profunda transformação e inovação do território que se pretende engrandecer nesta candidatura. O nosso desejo é que esta ação seja fonte de inspiração para os jovens e de orgulho para os mais velhos, que seja uma alavanca às indústrias criativas, da cultura, da gastronomia, das indústrias transformadoras, da agricultura e da sociedade em geral. Para que possa alavancar projetos de educação alimentar, gastronómicos sustentáveis e inovadores, que possa criar programas públicos de alimentação saudável, que possa unir os alcobacenses numa visão tão territorial quanto a tiveram os Monges de Cister, e que juntos possamos perpetuar este território fértil, abastado e emblemático no País e no Mundo.
A gastronomia é identidade e património, é história e valor acrescentado que teremos de saber aproveitar, para alcançar uma economia integradora dos enormes recursos que podemos contemplar no concelho de Alcobaça desde a serra até ao mar. Esta candidatura é um trabalho com a sociedade civil, de auscultação das gentes, das instituições, é um trabalho do sentir, do viver e de Dar Lugar ao Amor em Alcobaça! ■