Infortúnio inesperado ou a sorte do lado certo?

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José Luiz de Almeida Silva

Uma visita informal a um amigo da Gazeta que vive em Valência (Xohan Viqueira, que foi o autor da capa no 99º aniversário), proporcionou-me viver uma experiência – vista a posteriori – quase inacreditável e que permite a qualquer um testar as suas capacidades últimas e a sua sorte.
Estava no dia aziago na cidade capital da região mártir [Valência], tendo de manhã desse dia – terça-feira 29 de outubro – visitado vários pontos culturais, nomeadamente na zona da Cidade das Artes e da Ciência, no antigo leito do rio Túria, que distinguem aquela cidade internacionalmente e atraem diariamente milhares de pessoas.
Contudo, pairava no ar um aviso das autoridades meteorológicas, para um provável fenómeno desconhecido entre nós de “gota fria”, uma espécie de revolta da natureza contra tantos males que lhe provocamos, nomeadamente gerados pelo tão discutido e desmentido pelos negacionistas “aquecimento global”.
Os avisos continuados, temidos mas apesar de haver sempre uma ideia que não devia ser nada de muito anormal, levaram-me a apressar a deslocação para o aeroporto com vista a regressar ao país, como estava previsto. Sem outros percalços aí cheguei e fiz o normal check in.
Eis senão quando, no exterior do aeroporto e em toda a região Valenciana, o fenómeno climatérico esperado alterou toda a vida das pessoas e que se começou logo a sentir pela mudança da programação das companhias aéreas que suspenderam sucessivamente todos os voos. Mesmo assim reinava uma ausência de informação cabal sobre o que se passava no exterior.
Não havia televisões ligadas, nem havia outras fontes de informação, apenas as redes sociais que nesse momento tinham escassa informação sobre o sucedido. Apenas chegavam aos telemóveis avisos dos meteorologistas para que as pessoas tivessem o máximo cuidado.

Esta situação inconcebível, num primeiro momento, não encontra reação racional de quem desconhece a gravidade da situação, fazendo com que se intuam soluções alternativas especialmente para poupar o incómodo de uma noite passada num banco de aeroporto. E aí ensaia-se a procura de hotel nas proximidades do aeroporto, através de táxi aventuroso, na ausência de qualquer outro transporte público, numa via irrefletida e de quem não mede totalmente as consequências.
Uma corrida desenfreada pela cidade, inundada e com inúmeras vias cortadas pela polícia, encontrando todos os hotéis lotados e não sendo solução, a hipótese mais segura da passagem da noite à espera de novos aviões, no dia ou dias seguintes, era regressar ao aeroporto.
Já havia deixado de chover, a cidade estava deserta, os polícias impediam os acessos a vias mais perigosas e onde havia inundação, mas o centro de Valência estava desimpedido e foi possível chegar a uma dezena de hotéis com segurança.
Inconcebivelmente aí não havia informação televisiva, que contrariamente chegava ao resto do mundo com a dimensão da tragédia, deixando as pessoas na ignorância do que estava a ocorrer, permitindo cogitar soluções impossíveis.
Meditando no final da crise mais aguda, este episódio, permitiu-me concluir de quando em situações críticas, a tomada de decisão por vezes torna-se irracional e pode provocar a busca de soluções limite, e algumas vezes, irreversíveis. Percebo agora a mensagem acertada de Xohan a certo momento da noite: “Espero esta experiência te haga reflexionar sobre muchas cosas”. Afinal tinham morrido já mais de duas centenas de pessoas.
O espetáculo dantesco dado pelas imagens das televisões posteriormente, e que os jornais de todo o mundo puxaram para as primeiras páginas a partir de quinta feira (dois dias depois do acontecido), ajudam-me agora a ver melhor o que sucedeu e o que podia ter sucedido caso fosse cometido algum erro maior.
Para mim tudo acabou em bem. Mas para muitos outros daquela terra não tiveram esta felicidade! Mas fica o aviso para os povos de todo o mundo vivam em que parte dele viverem! ■

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