Jornalismo de proximidade e elites locais

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Sara Vieira
diretora do Região de Cister

Ainda se fala e escreve pouco sobre jornalismo de proximidade, mesmo quando (quase) todos tenham consciência da sua importância. A verdade é que tão depressa o elogiamos como o penitenciamos. Tudo depende do que se escreve e, sobretudo, sobre quem se escreve.
A um semestre de terminar a licenciatura em Comunicação Social e Educação Multimédia, no Politécnico de Leiria, uma professora insistiu para fazer o estágio na imprensa. O ritmo e a exigência de um jornal assustavam-me… fui para uma news magazine. Fiquei conhecida como a “correspondente de Leiria”. Percebo agora que foi ali que o jornalismo de proximidade me escolheu. Falar com quem conhecia e partilhar as histórias que também vivi pareceram-me boas estratégias para amaciar a minha insegurança e aparente falta de competência para ser jornalista.
Quando dei por mim estava sentada numa redação de um jornal regional a escrever uma tese de mestrado sobre jornalismo de proximidade e elites locais, com o intuito de perceber a influência destes grupos nos conteúdos noticiosos ou, como vim a confirmar, nos “pseudoacontecimentos”.
Os teóricos defendem que é em jornais, como o Região de Cister e a Gazeta das Caldas, “onde o jornalismo é mais humano e mais verdadeiramente social, ao pôr em contacto e ao relacionar os que informam ou opinam, escrevem editoriais e dão conselhos, com um público que não é apenas recetor, mas é também enormemente ativo, que, por sua vez, informa, recrimina, aceita, valora, aplaude ou censura de forma eficaz”.
Mas, se assim é, como se explica o poder das elites e a tendência para a manutenção do estado das coisas no jornalismo regional? As elites políticas, religiosas (sobretudo nos jornais regionais de inspiração cristã) e económicas tendem a apropriar-se das fragilidades das redações, nomeadamente a falta de recursos, a escassez de investigação jornalística e a insustentabilidade financeira, para se imporem na produção regular de matéria-prima informativa, alimentando a cena mediática. Até porque essas fontes de informação são também – e por norma – as principais geradoras de receitas publicitárias, o que torna estes jornais ainda mais dependentes das elites.
Sabemos que quanto menor for a área de influência destes jornais, maiores serão as dificuldades e os problemas. Também sabemos que quanto mais profissional e independente for um jornal regional, na sua relação com os interesses da comunidade, mais essa comunidade tenderá a dar passos firmes no seu desenvolvimento. E só nesse caso é cumprido o pacto de proximidade dos jornais regionais, servindo efetivamente as populações. Porque sabemos ainda que a proximidade pode levar a uma proximidade demasiado próxima, impeditiva da construção de narrativas jornalísticas libertas de constrangimentos. ■

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