Nos dias de hoje, falar de uma doença física é normal, mas falar do que sentimos é um tabu, podendo revelar-se um desafio, sendo muitas vezes interpretado como sinal de fraqueza. Uma doença física pode ser traumática ao ponto de desenvolver, por exemplo, elevados níveis de ansiedade, assim como uma doença psicológica pode ser também incapacitante, limitando o dia-a-dia de quem a sofre. No entanto, é sabido que, sendo seres humanos e sociais, as emoções são-nos inerentes e inevitáveis. Dado isto, porquê ‘’abafar’’ algo que está tão relacionado com o nosso ‘’eu’’? A problemática psicológica, maioritariamente gerida pelas emoções, é tanto ou mais séria que a doença física, não havendo assim qualquer razão para que esta seja subestimada.
‘’A doença mental é com frequência relacionada com o mendigo que deambula pelas ruas, e com o homicida “louco” que aparece nos filmes.’’, afirma a ADEB (Associação de Apoio aos Doentes Depressivos e Bipolares). De facto, os rótulos associados aos estados de instabilidade emocional são um estigma. Alguém com uma vida aparentemente estável e físico cuidado não está, aos olhos da sociedade, suscetível a sofrer de um transtorno emocional, sendo a ideia de ‘’problema mental’’ automaticamente associada a um estilo de vida com conotação negativa – não ter posses, aparência descuidada etc.
Eu própria ouvi comentários, quando pedi ajuda médica, sobre como não podia sofrer de uma doença mental por ter condições financeiras e uma aparência cuidada. De ‘’uma menina tão bonita como tu?’’ a ‘’Tu tens tudo o que precisas!’’. Simples palavras que, para mim, e para todos os que sofrem, refletem a dor da invalidação e falta de apoio.
Além disso, a desvalorização da saúde mental está também patente no SNS, o serviço de saúde mais utilizado pelos portugueses, e a única opção para grande parte da população, que não dispõe de meios para aceder a sistemas de saúde privados.
O acesso a uma consulta do foro mental não está disponível para marcação direta por parte dos pacientes. É necessário, numa primeira fase, ir a uma consulta de medicina geral e, caso o médico de família o determine, ser encaminhado para uma consulta de especialidade, o que significa entrar numa lista de espera, cujo tempo varia, em média, entre 6 a 18 meses. Logicamente a situação clínica dos pacientes em espera pode agravar, fruto do tempo sem acompanhamento médico adequado. Este é um de muitos exemplos de que a problemática psicológica não é priorizada, não só pela sociedade, bem como pelo sistema de saúde público.
No entanto, e apesar das divergências, a pandemia da Covid-19 trouxe notoriedade à saúde mental, tantas vezes ignorada. Desde o início da pandemia os pedidos de ajuda psicológica aumentaram – segundo a Rádio Renascença: ‘’Mais de 70 mil portugueses já pediram ajuda.’’ Os efeitos sentidos devido ao isolamento social vieram-nos mostrar o quão comum o sofrimento psicológico pode ser, e como pode tocar a qualquer um. ■