Sobre o Centro Interpretativo da Lagoa

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O Conselho da Cidade promoveu uma candidatura ao Orçamento Participativo Portugal 2017 para a criação de um Centro Interpretativo da Lagoa de Óbidos. Que este tenha sido um dos projectos escolhidos por votação a nível nacional, é merecedor do maior apreço e elogio, pela determinação e capacidade de mobilização demonstrada.
É, no entanto, estranho, (pelo menos para mim), que, depois, o Conselho da Cidade seja, de alguma forma, colocado à margem do desenvolvimento e concretização do projecto, confiado à Liga da Protecção da Natureza. Esta desenvolveu um plano, o qual, pelo que se constatou na apresentação realizada na Biblioteca Municipal de Caldas da Rainha, se diz aberto a sugestões e contribuições, mas que, em muitos aspectos, faz lembrar a piada do outro – «não importa a cor desde que seja cinzento!»
Tal plano, passa consideravelmente ao lado dos graves problemas que afectam a Lagoa, quase parecendo que se a situação fosse outra, amplamente favorável, as propostas seriam as mesmas. Acresce que quem deu o seu voto o fez pelo desejo e esperança que a candidatura pudesse também desempenhar um papel relevante na defesa e preservação da Lagoa. Como é óbvio, não são as verbas atribuídas para o surgimento de um Centro Interpretativo que deveriam ou poderiam resolver todo o preocupante quadro existente. Todavia, que se subestime a realidade considerando que a Lagoa de Óbidos «está em regressão» quando, se não se tomarem medidas urgentes, o estado será de agonia declarada, que não se aproveite a oportunidade para federar e congregar vontades, pelo protagonismo conferido sensibilizar e alertar mais amplamente para a necessidade de intervenção rápida e desbloqueamento de soluções, afogadas na burocracia dos gabinetes ministeriais (apesar de uma petição popular ter recebido aprovação unânime na Assembleia da República), então a dinâmica do Centro Interpretativo será a inutilidade de o ser numa Lagoa moribunda pelo assoreamento e poluição.
Encaremos as coisas de frente:
A 1ª fase de dragagens, iniciada com enorme atraso em 2014 foi mal executada, sendo que as areias incorrectamente depositadas nas margens, acabaram por ser devolvidas à água devido à força das marés.
A 2ª fase de desassoreamento, cujo arranque estava previsto logo de seguida, foi sendo sucessivamente prometida e adiada em 2014, 2015, 2016 e 2017, tendo sido por fim apontada uma data após o Verão de 2018, porventura o dia de São Nunca…
A insuficiente capacidade de compostagem da ETAR de Caldas da Rainha e o deficiente funcionamento da estação elevatória do Nadadouro levam a que haja descargas directas de efluentes de esgotos na Lagoa.
O Braço da Barosa, uma fonte extraordinária de biodiversidade, tem lodos poluídos, inclusive com metais pesados (crómio, p.ex.).
As Autarquias de Caldas e Óbidos, têm competência para a classificação da Lagoa como «paisagem protegida de âmbito regional» e, inexplicavelmente, não o fazem.
Os conhecimentos e as opiniões dos pescadores e mariscadores não são tidas em conta.
A APA – Agência Portuguesa do Ambiente, tapa o sol com a peneira e vai assobiando para o lado.
Um levantamento efectuado numa sessão da Assembleia Municipal na Foz do Arelho, em 2008, dava conta de cerca de 40 estudos realizados sobre o equilíbrio ambiental da Lagoa e nos quais já se tinham gasto 1 milhão e 300 mil €uros. Destes estudos nem um único ponto foi executado.
É incompreensível que a Liga da Protecção da Natureza queira ignorar estas questões e prescinda de ter um papel proactivo e uma voz de aviso, contribuindo também para uma desejável resolução de um assunto que se arrasta há décadas.
Quer-se a Lagoa como um factor de incremento do turismo e dos negócios que lhe estão associados? Muito bem. Convirá, porém, se pretendem vender os ovos de ouro, manter a galinha viva!

José Carlos Faria