O poema «Perguntando sempre» de Fernando Grade (n. 1943) na «Antologia da Memória Poética da Guerra Colonial» (Edições Afrontamento), organizada por Margarida Ribeiro e Roberto Vecchi, sendo um poema pequeno não é um pequeno poema: «- E os crimes, meu general? – Ah, isso foi há muito tempo… Já ninguém se lembra!». Ora os crimes (massacres) em África continuam na ordem do dia porque «Passaram quarenta anos. E ainda há sobreviventes. A Guerra Colonial não acabou para os portugueses».
O ponto de partida deste livro de 165 páginas é uma constatação: a guerra não acabou para os que «sofreram o avassalador esquecimento a que foram votados, o funesto desrespeito pelos seus direitos e a cruel ausência de apoio aos estropiados e às famílias dos mortos». Tal é um desafio à sociedade portuguesa que não conseguiu ou não quis julgar um único criminoso desta guerra. Porque como se escreve no livro «Há muito que devíamos ter encerrado o capítulo mais desastroso da História do Colonialismo. Julgando os seus crimes. Honrando os que lá tombaram. Reparando as chagas. Respeitando os povos que subjugámos pedindo-lhes desculpa. Antes que os mortos arrefeçam.»
Jorge Ribeiro (n.1949) ouviu o padre José Augusto Alves de Sousa: «O massacre de Inhaminga foi o maior de todos. No meio de toda aquela tragédia, a tropa cedo se demitiu das suas funções. Os comandantes andavam sempre a pedir-nos as listas dos padres. As listas dos padres! As listas dos padres!». Uma das listas possíveis neste caso era a dos padres católicos presos pela Ditadura e esquecidos pela Igreja, a saber: «Joaquim Alves Correia, César Teixeira da Fonte, Abel Varzim, Adriano Botelho, João Perestrelo de Vasconcelos, António Jorge Martins, José da Costa Pio, José Narino de Campos, José Maria da Cruz Dinis, Joaquim Pinto de Andrade, Franklin da Costa, Alexandre Nascimento, Manuel Joaquim das Neves, Mário de Oliveira, José da Felicidade Alves, Joaquim Teles Sampaio, Fernando Marques Mendes, Ismael Nabais Gonçalves, João, Adriano e Bartolomeu Decker, Bento Domingues, António Correia, Alberto Neto, Telmo Ferraz e os padres de Luanda – Vicente Rafael, Domingos, Alfredo Gaspar, Martinho Samba e Lino Guimarães.
Aqui fica a sugestão de leitura para que não se perca este testemunho único sobre um tempo português de massacre que é também o dos aldeamentos em Moçambique, sanzalas protegidas em Angola e tabancas defendidas na Guiné. Ora os aldeamentos são deslocações à força de milhares e milhares de famílias cortando as suas raízes, a terra, o clima, o ambiente, os laços étnicos e culturais, a vida – numa palavra. Mas como escreveu Eduardo Guerra Carneiro «isto anda tudo ligado» e os aldeamentos foram a antecâmara dos massacres. Só lendo se percebe, não é possível explicar de outra maneira, não há resumos, é tudo para ler. Viriamu é mais falado mas o massacre de Inhaminga não pode ser esquecido.
(Edições Afrontamento, Contracapa: Texto de Voltaire)