Graça Pires (n.1946) estreou-se em 1990 com «Poemas» (Prémio Revelação A.P.E. 1988) sendo este «Uma vara de medir o sol» o seu 13º título publicado. Os poemas deste volume situam-se entre a Natureza e a Cultura: «Envelhecemos com uma vara / de medir o sol na linha do olhar./ Não entendemos os sinais inscritos / nas margens do abismo.»
O ponto de partida é um regresso («Regressei com a lentidão de quem vem de longe / do mar com pedras na boca para cuspir nos lugares / onde o vento envolve a gruta das nascentes.») mas o regresso é o tempo da infância: «Os rituais da infância não nos deixam esquecer: / Era verde a sombra das árvores no pátio da escola. / Eram verdes os trigais pejados de papoilas.»
Esse era um tempo de harmonia, um paraíso entretanto perdido: «Antes do homem havia a terra: / geografia mágica, sagrada / que, na luz e na treva, explodiu / de espanto e guardou milenarmente / os mistérios da vida e da morte. / Depois da terra veio o homem. / E o homem tornou-se um morador incauto / e perdeu o paraíso onde agora os deuses / quando passam, desviam o olhar.»
No Mundo onde as aves procuram lugares para morrer, só o Amor pode responder à Morte: «Vem, meu amor. / Não tarda aí o fim do dia / e ainda não plantámos as avencas / junto do ribeiro para que o rosto / da terra resplandeça nos prados. / Repara: já há amoras no muro de pedra / onde prendemos as raízes da sede.»
(Editora: Intermeios, Capa: Rai Lopes Pereira, Foto: Ana Pires, Colecção: Margens)
José do Carmo Francisco